O Sheikh e Eu(Completo) romance Capítulo 10

Era domingo. Eu estava com minha agenda abarrotada de coisas que precisávamos comprar pela cidade próxima da Mansão. Shadique e Tomas estavam do meu lado, sem dizer uma palavra sequer e eu estava usando uma burca preta que me cobria todo o corpo, tudo. Sra. Zilena preferia não arriscar que eu fosse reconhecida como uma estrangeira, pelo menos não pelas vestimentas.

Ela nos acompanhou como pode. Também estava vestida com burca andando ao nosso lado. Por um momento, acabou saindo de perto da gente para ver outras abayas, mas Shadique falava bem melhor que eu, árabe, e conseguiu falar por mim tudo o que precisávamos para levar para a mansão. Encomendamos algumas coisas, que seriam deixadas no carro, já que eram pesadas demais e outras, nós mesmos carregamos.

Era um dia calmo e me fazia lembrar do fato de que já fazia uma semana que eu estava na mansão. A semana tinha se passado muito rapidamente, com acontecimentos fora do comum, mas que eu preferia não lembrar enquanto estava ali no mercado encarregada das coisas.

Zilena foi até a mesquita rezar e eu e os empregados voltamos para a mansão, primeiro de carro, depois de avião, pousando na ilha na qual a mansão do Senhor Rashid estava. Quando alcançamos a mansão, pouco tempo depois, eu estava cansada e morta. Contudo, como Zilena tinha me deixado tirar o resto do dia de folga, acabei fazendo o que mais precisava naquele momento: Dormindo.

Acordei um pouco assustada, sabe-se lá pelo que. Percebi que o sol já estava se pondo agora que eu acordava. Talvez fosse isso que tivesse me acordado. O sol se pondo, a escuridão chegando por fim. Ainda assim, estava com o coração palpitando e peguei o meu celular calmamente, tentando ligar para minha mãe mais uma vez. O celular deu apenas dois toques e ela rapidamente atendeu:

– Agnes, querida! Você está bem? – Perguntou minha mãe parecendo feliz pela ligação. Sorri, embora soubesse que ela não seria capaz de ver meu sorriso.

– Estou ótima, mãe! A semana foi bem trabalhosa, mas cá estou. Como a senhora está? – Perguntei e minha mãe começou a contar do seu trabalho, mas a barulheira atrás dela começou e logo eu ouvi a voz de Fernanda:

– Oiiiiiiie. Diga oi Sofia. – Ela disse e minha irmã riu enquanto dizia:

– Oi. – Ri do que as duas faziam e minha mãe parecia levemente irritada agora que Fernanda tinha pego o celular dela da mão. Adorava Fernanda e a forma como ela agia. Minha mãe já a via como filha e ela, por sua vez, já agia com intimidade suficiente para uma.

– Você liga para todos menos para mim, né? – Disse Fernanda e percebi que ela falava com a voz como se fizesse biquinho. Ri. Meu coração apertava-se por dentro de tamanha saudade que eu tinha delas.

– Estou com um pouquinho com falta de tempo, Fer. – Disse e Fernanda bufou enquanto dizia:

– Não importa. Vou passar o telefone para sua irmã e para sua mãe. Depois eu falo mais com você. – Revirei os olhos. Fernanda era bem maluquinha, eu gostava muito dela. Logo ouvi a voz de Sofia no telefone e meu coração se acendeu de um amor muito grande e quente.

– Oi Agnes. Como está aí? – Perguntou Sofia. Sorri.

– Eu vou bem. Alguns problemas com trabalho demais, mas está tudo certo. E você, como foi? – Sofia suspirou.

– Peguei mais um tubo de oxigênio essa semana. A Dra. Gabriela disse que o câncer não cresceu mais, continua do mesmo tamanho. Ainda assim, ela disse que preciso esperar mais um pouco para começar o tratamento. – Assenti.

– Ponha na viva voz, Sofia. – Pedi e ela logo o fez. – Mãe? – Chamei e minha mãe demorou para responder, do jeito avoada dela enquanto dizia:

– Oi. Eu. – Ela disse. Tentei não parecer que estava à beira do colapso.

– Mãe, no fim desse mês vou te depositar o que estou ganhando. Aqui ganho em dólar, então acho que consigo dinheiro o suficiente para começar o novo tratamento da Sofia. Esse tratamento não é pago pelo SUS, mas acredito que dará certo. Qualquer coisa, qualquer mesmo, que tu precises para a Sofia, você me diga, viu? Não quero que nada dê errado com ela. Agora tenho dinheiro o suficiente para ajudar, dinheiro suficiente para ela começar. – Minha mãe demorou para responder. Pensei por um momento que ela tinha desligado o telefone, ou posto mudo, mas, quando ela voltou a falar, percebi que ela estava tentando não chorar, não na minha frente. Apertei um lábio sobre o outro.

– Agnes, você é uma filha tão boa. A Dra. Disse que ainda precisa analisar por esses dias se Sofia está dentro para começar o novo tratamento. Se o câncer continuar em sua margem de erro, como ela espera que ele faça, Sofia está dentro. E acredito que vai dar tudo certo. – Concordei balançando a cabeça. Não queria chorar também. Céus, meus olhos já estavam molhados.

– Vai dar, com certeza, mãe. E você, Sofia, é bom se cuidar, se não quando eu voltar para o Brasil vou te encher de cócegas. – Sofia riu com o que eu disse, mas logo o telefone fora pego por Fernanda novamente, impedindo que minha mãe e minha irmã dissessem outra coisa novamente, embora eu imaginasse que o celular ainda estivesse no viva-voz.

– Ok. Ok. Parem com toda essa tristeza. Pensamento positivo que eu sei que vai dar certo. Agora, Agnes, é com você. Conte me tudo sobre esse bonitão aí. – Disse Fernanda como se eu estivesse prestes a contar uma fofoca. Não pude deixar de rir da forma como ela falava.

– Ele é filho do meu chefe, Fernanda. O nome dele é Seth. E está noivo. Então, infelizmente, não vou poder te apresentar a ele. – Fernanda bufou do outro lado.

– Eu não sou ciumenta. Sei dividir. – E ele também, pensei com meus botões, tentando não rir.

– Não, não, não Fernanda. Você precisa de um relacionamento sério, sem essa de ficar com os outros. – Acredito que Fernanda revirou os olhos do outro lado do telefone, como era bem típico dela.

– Não quero compromisso com uma pessoa que vai me galinhar depois. Além do mais, já disse Agnes, só vou namorar quando achar alguém que realmente possa valer a pena, alguém que realmente venha a me amar. – Dessa vez eu não pude deixar de revirar os olhos. Fernanda e seu discurso de sempre.

– Você não dá chance para os homens para saber se é realmente esse que vai vir a te amar. – Comentei e Fernanda riu.

– Talvez eu desse uma chance para esse tal de Seth aí. – Disse Fernanda com uma voz maliciosa. Ri.

– Acho melhor não. – Comentei. Fernanda gargalhou.

– Quer ele só para você não é mesmo? – Disse com uma voz terrivelmente afetada. – Safadiiinha. – Disse e eu não pude deixar de corar. Minha mãe e minha irmã realmente estavam ouvindo aquilo tudo? Senhor!

– Não! – Disse já afetada também, minha voz saindo tão aguda que nem eu reconheci. – Não quero ninguém Fernanda. Tu sabes disso. – Fernanda revirou os olhos. Ela sabia que eu não queria ninguém.

– Você fala de mim, mas você também não dá chance para ninguém. – Ela acusou. O que não era verdade.

– Você sabe que não é assim. – Disse tentando me defender. Fernanda não podia dizer isso, ela sabia que era diferente. – Você sabe que eu prefiro não me envolver com ninguém, pelo menos não por enquanto. – Fernanda parou de falar por um instante novamente. Ela estava pensativa. Eu preferi não interromper sua linha de pensamento.

– Matheus ainda não te mandou mensagem? – Perguntou ela e a voz não transmitia nada, parecia simplesmente que ela tinha se tornado um robô.

– Não. – Disse severamente afetada olhando para a costura da minha cama. Havia um pedaço de linha que estava levantado e eu sentia uma necessidade imensa de puxar aquela linha e estragar o lençol todo. Tentei olhar para outro ponto do quarto enquanto pensava em Matheus.

Matheus tinha sido meu namorado por algum tempo. A primeira pessoa que eu tinha pensado em ter um relacionamento sério, a primeira pessoa que eu tinha amado de verdade. Fernanda me odiava imensamente por isso, mas eu ainda tinha chances de voltar com ele. Mesmo que tenha sido eu que tenha terminado com ele. Sabia que nosso relacionamento não daria a distância. Seria muito para ele. Além do mais, uma semana depois de terminarmos ele já estava com outra. Fernanda sempre disse que ele me traia enquanto namorávamos, mas como ela não tinha certeza, só ouvia boatos, eu preferia não acreditar.

Agora, que tínhamos terminado, era-me doloroso pensar nisso. Na forma como tínhamos opiniões diferentes quanto ao relacionamento que tivemos. Para Matheus, pareceu ser só um caso qualquer, tal qual os variados relacionamentos que ele tivera pela vida. Para mim, um relacionamento tinha vida, tinha história. Não podia ser tratado da mesma maneira que ele tratava.

Ainda assim, ainda que ele estivesse pulando de um relacionamento para o outro, eu, tonta do jeito que era, ainda tinha uma pontada de esperança de que Matheus me mandaria uma mensagem em algum momento, pediria para voltarmos. Eu ainda achava, tonta como era, que ele voltaria, me pediria para voltar e que, dessa vez, arrependida por não ter tentado nosso relacionamento à distância, eu aceitaria.

– Aloooooo, terra para Agnes. – Disse Fernanda percebendo que eu tinha me desligado por alguns segundos.

– Desculpe, mas não. Melhor assim, não é mesmo? – Fernanda pareceu um pouco silenciosa. Ela estava escondendo algo de mim. Eu podia sentir. – Desembucha logo o que você tem para falar, mulher. – Disse e Fernanda suspirou. Acredito que ela não queria me contar algo.

– Acho que ele terminou de novo o relacionamento. Ele veio me perguntar esses dias se você continuava com o mesmo número. Uma boa amiga como eu sou, é óbvio que eu disse que não. – Disse Fernanda.

– Você fez o que? – Perguntei surpresa. Juro que mataria Fernanda quando eu voltasse. Ela sabia o quanto eu gostava do Matheus. Sabia o quanto tinha sido doloroso para mim terminar nosso relacionamento e, agora, quando ele podia vir falar comigo novamente, para que eu aceitasse retornar com ele, ela simplesmente fazia isso? Acabava com nossas chances?

– Amiga, você parece estar tão bem aí. Eu não quero ver você sofrendo. E ele te fazia sofrer. Por favor, não volte a falar com ele. Não faça isso consigo mesma. Ai, por que eu fui contar isso justamente para você? – Fernanda disse arrependida.

– Eu estou sofrendo aqui, se você quer saber Fer! – Gritei para ela. Por que era o que, no fundo eu sentia e não queria que ela soubesse. Eu sofria por ter terminado o relacionamento, sofria porque estava longe de Sofia, dela, da minha mãe. Eu sofria, de uma maneira horripilante, fazendo isso para ajudar no tratamento de minha irmã. Fernanda ficou quieta por um instante.

– Agnes, eu não sou você. E não posso mandar em você. Mas se você quer um conselho, não faça isso consigo mesma. – Eu não respondi Fernanda. Estava com uma pequena pontada de raiva por ela ter feito isso. Ela devia ser meu cupido! Não meu estraga prazeres! Ela pareceu perceber isso. – Então tá. Quando você quiser, só ligar novamente, sua chata. – Ela disse e eu ri.

– Ta bom, sua chata. – Disse e nós duas rimos. Percebi que ainda assim Fernanda estava receosa do que se sabe lá que eu ia fazer. Mesmo assim ela desligou o telefone me deixando no vazio novamente que estava o meu quarto.

Fernanda sempre agiu como uma irmã para mim, tentando me cuidar dos perigos. No entanto, em algum momento da vida, eu passei a agir como irmã mais velha, não somente da Sofia, mas dela também. Sempre eu dando conselhos para ela, cuidando dela, achando desnecessário falar de mim. Eu sabia me cuidar, pensava comigo mesma, não precisava dividir meus anseios e medos. Apenas cuidar da Fernanda.

Por um momento ela pareceu não perceber isso, ou, quem sabe não se importar. E eu, miseravelmente, comecei a falhar nisso. Passei a contar meus medos para Matheus que me ouvia com total atenção, uma atenção maravilhosa, algo que eu não esperava dele. Por conseguinte, também, Matheus começou a crescer em cima de mim. Começou a pedir para eu fazer coisas que, até então, eu não tinha percebido o quão estranhas eram. Eu não me importava, gostava tanto dele, que não me importava.

Fernanda tentou me alertar quanto a isso, mas eu achava que era coisa da sua cabeça, afinal, para mim, tudo estava indo em perfeitas ordens. Comecei a dividir as coisas com Fernanda e os papeis pareceram se trocar novamente. Fernanda começou a agir como minha irmã mais velha, preocupada com o que eu estava fazendo, tentando me ajudar como podia, mesmo que só no apoio.

Matheus me pedia para lavar a roupa dele, eu fazia. Me pedia para cozinhar as comidas para ele, eu fazia. Me pedia para eu calar a boca, eu calava. Às vezes, quando ele me beijava, me pedia para ficar calada enquanto me apertava o pulso até eu quase chorar de dor, mas eu não ligava. Algumas vezes ele me fazia agrados. Não era de todo mal, me trazia chocolates, ou coisas assim. Mas quando eu terminava de comer, ele comentava sobre os quilos que eu ganharia com aquilo e começava a me forçar, de uma maneira mental, a pensar com ódio, sobre o meu corpo.

Mesmo assim, eu o amava. De alguma maneira doentia. Talvez por confiar nele. Ele ainda era carinhoso, pensava eu, e não me traia, visto que para mim eram só boatos. Ele ainda ajudava a minha família, dava sempre algum dinheiro para ajudar nas despesas de casa. Eu achava que se o perdesse, poderia comprometer o dinheiro que ele dava, que ajudava no combustível quando minha irmã ia fazer seu tratamento, que nos ajudava, como podia. De qualquer forma, eu ainda o amava. Talvez por ser o primeiro homem que se interessou por mim, por me olhar de maneira diferente. Talvez tudo isso tenha contribuído. Talvez por que estávamos namorando há mais de 3 anos e ele nunca tenha me forçado a fazer nada. Fernanda dizia que ele não tinha interesse em mim nua, visto que ele já via muitas assim. Mas eu não ligava. Sentia que era porque ele me respeitava.

Olhei o meu Whattsaap. Olhei o contato dele. Continuava com o mesmo número e a mesma foto dele olhando para uma lagoa ao pôr do sol. Estava lindo com os cabelos loiros caindo em cascata próximo aos olhos, o nariz grande, os olhos escuros. Matheus era bonito, isso era fato. Ele tinha vindo do Sul estudar na mesma faculdade que eu.

A última visualização dele fazia apenas cinco minutos e eu estava tentada a mandar uma mensagem para ele, mesmo sabendo que isso poderia ser muito errado da minha parte. A gente tinha acabado. Eu não podia simplesmente mandar uma mensagem para ele como se nada tivesse acontecido. Ainda assim, ele tinha me procurado... Fernanda tinha dito que ele tinha me procurado.... Eu não podia deixar isso de lado...

Olhei mais uma vez para aquele contato. Eu não tinha tido coragem de apagar. Ele estava ali, ao alcance dos meus olhos e eu estava indecisa sobre o que fazer. Olhei minha janela. O sol já tinha sumido e as luzes da mansão começavam a se acender gradativamente. Era um espetáculo belíssimo de se ver. Tão belo que tinha me dado coragem para mandar mensagem para Matheus.

Oi, como anda a vida aí?

Perguntei.

Era ali que tinha começado a minha burrice, mas eu não poderia imaginar.

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