Bem-vindo ao shopping, era o que estava escrito na placa prateada no alto da entrada. O lugar onde eu podia me passar por rica sem que ninguém duvidasse — ou me chamasse de louca —, estava lotado de famílias e pessoas desocupadas como eu e minha mãe. Confesso que meu sonho era um dia entrar na Gallerist e gastar alguns reais sem me preocupar que o mundo ia cair na minha cabeça depois. Mas como todos os shoppings de luxo, também tinha lojas populares como C&A e Riachuelo que reuniam diversos estilos a preço acessível.
Era exatamente nelas que faria compras.
Ainda receosa em acabar com o limite do cartão de crédito da mamãe, escolhi poucas peças, digamos que fui estratégica, peguei roupas que combinassem com o que já tinha no guarda-roupa. Porém, dona Ana me surpreendeu quando encheu meus braços com as peças escolhidas por ela, não fiz cerimônia e aceitei o presente.
Passeamos pelo andar sem pressa, observando vitrines, só curtindo uma à outra — como há muito tempo não fazíamos. A mulher ao meu lado era uma batalhadora das mais fortes, construiu seu nome como cabeleireira quando eu ainda era criança. Naquela época, morávamos num sobradinho de quatro cômodos na zona norte, tempos em que fugir de um canto para o outro, era nossa rotina. Mesmo sem condições, ela improvisou seu salão num dos cômodos e começou a atender suas primeiras clientes — com a cara e a coragem. Aos poucos conquistou uma boa bagagem e, com isso, uma carteira farta de mulheres vaidosas.
Foi então que Marcos apareceu, trazendo àquele pequeno espaço, esperança. Os dois juntos locaram um lugar na zona sul, uma vez que fugir voltou a ser nossa sina e o sobradinho não mais um lar. Naquele momento, um empréstimo arriscado, mas preciso, levou a Cherry Fashion ao seu novo endereço, o Shopping Iguatemi.
Lá estávamos.
— Agora, cabelo e unhas? — ela sugeriu enquanto pisamos juntas no degrau da escada rolante, em direção ao andar de baixo. — O que acha?
Excelente proposta.
— Simmmmm! Aproveito e mato a saudade do Marcos.
Ela assentiu e caminhamos em direção ao salão na outra extremidade do andar.
— Ai, meu Deus, lindaaaaaaaa! — gritou o cabeleireiro, frenético, assim que me viu chegar. — Meu amor, saudades…
— Oi, Marquito, belezinha?
— Super, garota. — Apertou-me contra seu corpo, beijou minha testa e virou para minha mãe. — Olá, chefa!
Ela piscou para ele, antes de explorar o salão moderno e elegante.
— Marcos, vem cá.
— Sim, chefa.
— Você pode, por gentileza, dar uma ajeitada naquela bagunça ali? — ironizou apontando para euzinha, mesmo tendo no seu campo de visão uma cliente que carecia de trato.
— A bagunça sou eu? — Apontei para o centro do peito, avaliando meus cachos num espelho de corpo inteiro que ocupava a parede de entrada. — Tô feia, Marcos? — choraminguei para ele.
— Até parece. — Ele já estava ao meu lado. — Talvez esses fios precisem de um corte, um botox para amenizar o volume… O que acha?
Sinceramente, cortar o cabelo não estava nos meus planos. Adoro meus longos cabelos castanhos um pouco acima da cintura, apesar de não me obedecerem muito, sempre com fios ariscos tirando horas do meu tempo na frente do espelho.
De fato, uma mudança radical podia ser legal.
— Marcos, eu topo, pode cortar.
— Que honra, vou dar um trato na universitária.
O cabeleireiro não pensou duas vezes, primeiro sua ajudante lavou meus cabelos para a aplicação de uma química fraca que trabalhou nos fios por um tempo e depois foi enxaguada. Liberada pela moça, Marcos me levou pelo braço ao seu canto de trabalho, jogou a capa lilás sobre o meu corpo como proteção dos fios que seriam desperdiçados e me fitou com cara de quem ia aprontar, pegou a tesoura e se transformou em Edward.
Não escondi meu desespero ao testemunhar os primeiros fios caírem no chão, senti meu coração acelerar, até pensei em desistir, rezei arrependida, sofri em antecipação. Marcos só ria, se divertindo com o meu sofrimento. Não tão confiante assim, fechei os olhos e entreguei nas mãos de Deus.
Minutos eternos depois…
— Abre os olhos, Aurora — o sem coração pediu, mas não tive coragem. — Abre, garota, e olhe minha obra-prima.
Minhas pálpebras se desprenderam devagarzinho.
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