Senti o medo na súbita quietude da sala, o silêncio e a tensão que faziam os pelos do meus braços se eriçarem. O medo era tão espesso que dava para cortá-lo, fazendo meu coração saltar para a minha garganta, asfixiando-me. Apesar do medo silenciador, eu não pude conter o meu gemido diante da dor aguda e ardente que acompanhou a panela de água fervente despejada sobre a minha cabeça.
"Estamos em território alheio", ouvi uma voz tensa perto de mim. "Acalme-se". Três pares de pés estavam perto de mim enquanto eu lutava para me sentar através da dor de um rosto e ombros escaldados.
Se existisse algo como o inferno, eu imaginava que não poderia ser pior do que isso. A pele do lado esquerdo do meu rosto e da minha testa começou a descascar devido ao tratamento com água quente. Engoli um gemido, aterrorizada com o homem que estava a poucos metros de mim. Nada me faria mover um centímetro sequer por medo de irritar o homem cuja raiva fazia todo o quarto congelar.
"Dê espaço". Uma voz fria. Calma e letal. Carregada com a força de um Alfa, aquele que estava acostumado a tomar o que queria.
"Somos visitantes. Se você machucá-la –" O outro homem começou a dizer. Seu tom era carregado de ansiedade. Eu podia sentir as ondas de nervosismo emanando de todos no quarto, especialmente do outro homem.
"Chris, dê espaço". A voz vibrante de poder soava convicente, mas tinha uma margem perigosa que se solidificou quando ele rosnou. "Agora". Vi o movimento dos pés, ouvi um guincho, mas já não conseguia mais conter a minha dor.
Gritei de dor e a tensão no ar estalou com o meu grito alto. O homem que sugava o ar do quarto se virou e então se ajoelhou ao meu lado. Minha respiração ficou presa na minha garganta quando ele me pegou do chão.
"Nossa companheira é bondosa!" Selena comemorava, mas eu não conseguia respirar, sua aura me sufocava.
"Alfa, você não precisa carregá-la!" Beta Gabriela soava escandalizada quando meu companheiro me levantou no estilo nupcial. "Ela pode caminhar até o médico sozinha. A cerimônia já está pela metade, Alfa Caleb, e prejudicará sua imagem se você perder".
"Eu cuidarei da minha reputação. Preocupe-se em manter a sua cabeça". Seu peito vibrava apesar das palavras frias que ele falava. "Você vai me levar a um médico ou terei que te fazer?" A ameaça fez Beta Gabriela se mover rapidamente.
"Alfa –" Seu Beta o seguia nervosamente um passo atrás dele. "Seu comportamento fará as pessoas falarem."
"Chris, descubra quem é essa garota e todos os relacionados a ela", disse meu companheiro e o Beta desapareceu para cumprir sua ordem.
Chris. Alfa Caleb. Esses nomes eram estranhamente familiares - meu sangue gelou quando tudo se encaixou na minha cabeça. Alfa Caleb Hallmark, o Alfa impiedoso, o homem que virou a sociedade dos lobisomens de cabeça para baixo há sete anos. Por dois anos, ele e alguns outros homens travaram uma guerra contra o Alfa mais grande, mais renomado e reverenciado do mundo e eles venceram. Eles venceram pela pura loucura assassina do Caleb.
Há sete anos atrás, a dinâmica do mundo mudou por causa desse homem. Alfas de grandes alcateias que sempre se sentiram seguros por causa de seus números e guerreiros viram o que um homem com cem lobos não treinados poderia fazer a um homem com um exército composto por milhares de homens altamente qualificados. O pânico que tomou conta do mundo por dois anos enquanto as pessoas se perguntavam se ele iria parar. Se ele pudesse superar a alcateia Alfa Black, que se manteve invicta em batalha desde a sua criação há quinhentos anos atrás, então não havia como prever o que ele faria a seguir.
Depois de dois anos de massacre calculado, ele se tornou o líder da alcateia mais poderosa do mundo, e então ele desapareceu da existência. Ninguém viu seu rosto, ninguém ouviu sua voz e ninguém sabia seus movimentos. As pessoas começaram a espalhar todos os tipos de rumores sobre ele – que o a guerra o desfigurou a ponto de ele não poder mostrar-se sem vergonha, enquanto poucos cantavam de sua beleza etérea que cegava os outros, mas nenhum podia jurar por suas vidas que suas palavras eram verdadeiras.
Alfa Caleb.
O homem que me segurava inclinava-se mais para a beleza etérea do que para a desfiguração. Pelo que pude ver, ele tinha olhos escuros impressionantes que pareciam orbes encantadores, um nariz esguio e lábios vermelhos e cheios, completos com um maxilar forte e definido.
“A – Alfa C– Caleb!” Eu ouvi uma voz familiar. Meu pai. “Lamento que minha filha tenha causado tal escândalo.” Caleb parou de se mover.
A dor no meu rosto e em algumas partes dos meus ombros começou a desaparecer na breve viagem até o hospital antes que meu pai bloqueasse nosso caminho.
“Quem é você?” A voz fria transparecia desprezo e impaciência.
“Eu sou o Beta Kate, pai dela.” Meu pai nunca escondeu sua vergonha por ter gerado uma inútil ómega como eu. Mas apesar de me ver nos braços de um homem tão aterrorizante, apesar de notar meu rosto escaldado, ele não se deu ao trabalho de mostrar sequer um pingo de preocupação com meu bem-estar. Só desapontamento e vergonha ecoavam no seu tom de voz quando ele falou com meu companheiro.

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