— Que pena, ela chegou ao hospital tarde demais. A cirurgia da mãe foi um sucesso, mas não conseguiram salvar a criança.
— E os familiares da gestante?
— Ninguém da família estava presente. Foi a própria paciente quem assinou a autorização para a cirurgia.
Ainda meio tonta pela anestesia do procedimento, Estrela Rocha ouviu as vozes do médico e da enfermeira ao lado, enquanto o medo de ter escapado da morte ainda pulsava em seu corpo.
Instintivamente, levou os dedos ao ventre.
Como o médico dissera, o bebê já não estava ali.
A barriga, antes levemente arredondada, agora estava lisa.
Nunca mais sentiria o pequeno coração batendo dentro dela.
Sabia que, naquele momento, deveria desabar em lágrimas, mas, por algum motivo, não conseguia chorar.
Talvez já tivesse chorado demais.
Ao perceber que ela despertara, o médico se aproximou, perguntou como estava se sentindo e, antes de sair, tentou confortá-la, dizendo que deveria cuidar da saúde e que, cedo ou tarde, teria outra oportunidade de ser mãe.
Estrela apenas assentiu com a cabeça.
Não explicou que não haveria outra chance. Aquela criança era fruto de um roubo, assim como aquele casamento também fora “roubado”.
No passado, ela realizara o sonho de se casar com Henrique Freitas, o filho prodígio da família mais tradicional de Cidade R. Porém, Henrique sempre acreditara que fora manipulado, e por isso a desprezava. Chegou ao ponto de, na noite de núpcias, sair publicamente para um clube, apenas para humilhá-la.
Estrela tornara-se o motivo de piada em toda Cidade R.
Cinco anos de casamento se passaram. A hostilidade dele já não era tão intensa quanto antes e, em algumas ocasiões em que ela era ridicularizada, Henrique até demonstrava uma pontinha de compaixão, ajudando-a a salvar as aparências.
Diz o ditado que “com o tempo, até estranhos criam laços”. Talvez, vivendo sob o mesmo teto como um casal de fachada, acabassem desenvolvendo algum tipo de vínculo.
Mas ele sempre fora claro.
— Entre nós, só pode haver desejo, nunca sentimento. E não admito que você tenha um filho meu.
Por isso, usavam sempre proteção. Mesmo nas raras vezes em que não havia preparo, ele fazia questão de que ela tomasse o contraceptivo depois.


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