Caminhar Contra A Luz romance Capítulo 348

"Naquele momento, eu gritava feito um fantasma."

"Gritei tanto, mas nem meus pais biológicos apareceram para me ver, estavam mesmo decididos a me abandonar."

"Desde então, quando vejo uma cobra, sinto mais medo do que se encontrasse um bandido cruel, pronto para me matar com uma faca. Também desde aquela época, nunca mais voltei a ver meus pais biológicos."

"Para ser sincera, o destino das pessoas parece mesmo selado lá do alto. Será que em vidas passadas, ou na vida antes dessa, eu fui uma pessoa tão má, imperdoável? Acabei sendo rejeitada tanto pelos pais adotivos quanto pelos biológicos. Frequentemente sinto inveja, e até um pouco de ciúmes, da Rebeca. Apesar de ter vivido dezesseis anos naquela comunidade carente, bastou seus pais biológicos aparecerem, que os adotivos logo a deixaram ir embora, sem hesitar."

"No fundo, os pais adotivos dela — que também são meus pais biológicos — sempre cuidaram bem dela. Queriam que ela tivesse uma vida melhor, a ponto de abrir mão, sem nenhuma condição, da filha que criaram por tantos anos. Quando éramos mais novas, os pais adotivos dela — meus pais biológicos — ainda costumavam levar produtos do interior para a Rebeca."

"Me diz, como é que a Rebeca teve tanta sorte? Os pais biológicos a tratam como um tesouro, os adotivos a entregaram de volta só para que ela tivesse uma vida melhor, o maior empresário de Cidade Verde, Oliver, ama ela como ninguém, até investidores da Itália estão dispostos a doar fortunas de centenas de milhões para ela, sem pedir nada em troca. Fora isso, ela tem um irmão super protetor, um famoso cirurgião, Amadeus, como vizinho, e ainda tem Belmiro, Valentina Correia..."

"E eu..." Alma sorriu de si mesma, com ironia.

"Todo mundo fala da minha família: quatro pessoas, todos fracos, doentes, derrotados, sempre brigando entre si. Dizem que Julieta é impulsiva e apaixonada demais, que minha avó é uma senhora sem jeito, sem carisma, que passou a vida sendo humilhada e nunca conseguiu se reerguer. E Vicente? Dizem que ele é um garotinho surdo, rejeitado por todos."

"Mas quem é capaz de entender que só pessoas como nós conseguem não desprezar umas às outras, só nós conseguimos nos aquecer juntos? Quem, com uma vida boa e respeitável, olharia para nós? Nunca frequentei o ensino médio, não tenho amigos. Julieta, conheço desde criança; todos dizem que ela não é simpática, mas quando eu estava quase morrendo de frio e fome na porta da Família Sequeira, foi ela quem, trabalhando em um bar, conseguiu dinheiro para me salvar."

"E quando eu já tinha perdido toda esperança, foi minha avó, catadora de recicláveis, quem me levou para casa, trouxe comida até a beirada da minha cama e me alimentou colherada por colherada. Só assim senti um pouco de calor humano, percebi que mesmo sendo um cão abandonado, ainda tinha uma avó disposta a me querer."