Lembranças das noites quentes de verão Hóspede

- Confesso que estou curiosíssimo, senhora Rockfeller. – A fumaça do cigarro saía da boca dele como uma chaminé, querendo me contaminar de qualquer jeito.
Eu não sei se tinha como dar a notícia de forma lenta e verdadeira ou seria melhor inventar toda uma história bonita por trás. Não éramos nada íntimos para eu passar mais tempo ali e ele não era o tipo de pessoa que parecia ter sentimentos a ponto de eu precisar ter dó do que ele ouviria.
- Eu vim lhe contar algo sobre seu passado com Mariane.
Hardlles riu, sem retirar a porra do cigarro da boca, como se aquilo tivesse nascido com ele:
- Jura? Veio me contar algo sobre “meu” passado que eu não saiba? Deixe-me ver... Talvez eu não tenha sabido que sua irmã era uma vadia covarde... Ou quem sabe tenha ficado dúvidas sobre seu pai ser a porra de um filho da puta desgraçado?
- Pelo visto você conhece muito bem a minha família, Hardlles. Então vamos direto ao ponto que você não sabe: você e Mariane tiveram um filho.
Ele me encarou... Os olhos sombrios, o cigarro sem mexer-se no canto dos lábios, os dedos permanecendo exatamente como estavam na corda da guitarra. Depois de um tempo, virou-se novamente para o instrumento, tocando-o acoplado à uma caixa acústica, o som estrondando nos meus ouvidos.
- Mentirosa! – Foi o que saiu da boca dele, sem sequer olhar na minha direção.
Que cara filho da puta! Como Mariane teve a capacidade de se envolver com um homem daquele tipo? Parecia pouco se importar para o mundo que girava à sua volta, como se ele fosse a única coisa que realmente valesse a pena.
Eu detestava admitir, mas talvez meu pai tivesse razão em separá-los. Eu detestava julgar as pessoas, mas naquele caso parecia tão claro e cristalino quanto água.
Virei as costas e estava me dirigindo para a porta quando ele parou de tocar os acordes desarmonizados e disse:
- Me diga que está mentindo...
Virei na direção dele e repeti:
- Vocês tiveram um filho. Eu não estou mentindo.
Ele pegou finalmente o cigarro que pareceu nascer com ele e amassou no cinzeiro, que repousava sobre o braço do sofá. A guitarra foi para o chão e levantou, vindo na minha direção:
- Por que está me dizendo isso agora?
- Porque eu soube agora... Para ser exata, ontem. Eu estou com sérios problemas com minha família. Mas não estamos aqui para discutir isso, não é mesmo? Achei justo que você soubesse. Porque se depender de Mariane, você morrerá sem saber que é pai de um menino, que ela deu para adoção, anos atrás.
Ele seguiu me encarando, a boca semicerrada, sem sair uma palavra.
- Meu pai também tentou me separar de Charles, que você deve conhecer como Charlie B. A diferença é que eu não aceitei a opção que ele me deu, que era o aborto. Hoje tenho minha filha, ou melhor, filhas... – pus a mão sobre a barriga, crescida o suficiente para ele ver que havia um bebê dentro dela – Minha irmã não teve a mesma coragem... Ou talvez tenha sempre sido uma pessoa fria e sem coração. Eu não sei se você conseguirá conhecer seu filho... Sequer tenho certeza se esta notícia fará diferença na sua vida – observei a zona naquele cômodo – Mas fiz meu papel: dizer a verdade. O que você vai fazer com isso já não é problema meu.
Pus a mão na maçaneta e abri a porta. Saí para o corredor e ouvi o som fraco da voz dele:
- Obrigado.
Não olhei para trás. Simplesmente fechei a porta e saí. Porque eu não tinha certeza se tive raiva ou dó do que restou daquele homem.
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Cheguei em casa e fechei a porta, encontrando minha mãe sentada no sofá. Gelei por dentro, procurando J.R em qualquer canto. Mas não o encontrei.
- O que você está fazendo aqui? – Perguntei.
- Eu... Posso ficar por um tempo? – Ela levantou, o semblante triste.
para o lado e vi uma mala, próximo dela.
- Charlie B. precisou resolver umas coisas. Me deixou ficar. – Ela disse, sem jeito.
- Por que da mala?
- Deixei a mansão... E seu pai.
Balancei a cabeça, aturdida, confusa:
assim? Eu não creio que você faria isso. Certamente há algo por trás, algum outro plano sórdido dele
aproximou e me abraçou, fazendo as palavras morrerem na minha boca. Percebi o choro contido e retribui o abraço, sentindo o coração
Me perdoe por ser tão omissa. Mas... Eu sempre
com força entre meus braços. Acho que no fundo, eu sempre esperei que um dia ela acordasse para a vida, fugindo do pesadelo de viver ao lado de Jordan Rockfeller. Não tenho certeza de quanto tempo ela ficou ali, chorando baixinho, parecendo com medo de ser ouvida por si própria.
afastou e encarou-me, com seus olhos avermelhados e ainda tomados de
deveria ter feito isso quando você foi posta para fora de casa... Ou mesmo quando ele não aceitou o filho da sua irmã... – sim, certamente ela havia falado com Min-ji e estava ciente que eu sabia – Mas me faltou coragem. E também tive medo. Mas agora nada mais importa... Não há ameaças que me farão ficar ao lado dele... Porque eu sei que você é forte o suficiente para me
Sou? – Senti as lágrimas invadindo meus olhos, deixando a visão embaçada e
A única pessoa que o enfrentou até hoje... Em nome do amor. O sentimento gigantesco que sentiu pela sua filha... E o pai
Jamais me passou pela cabeça não lutar pela minha