Tinha um dia até eu completar vinte e um anos, então eu poderia deixar o inferno que chamava de alcateia e viver como um lobo solitário. Aos dezoito anos, os lobos são considerados adultos, mas os lobos solitários são raros pois viver sem os laços de uma alcateia pode levar um lobo à loucura. Nossas leis proíbem lobos com menos de vinte e um anos de viverem vidas solitárias para manter a população de renegados sob controle.
“Amanhã, Natalia, você e eu vamos deixar esse inferno e encontrar um verdadeiro lar.” Eu acariciava o pelo do lobo preto vadio que se tornou meu amigo um ano atrás.
"O que você está fazendo aí à toa?" Uma voz aguda cortou no ar tranquilo atrás da casa da alcateia. "Nós mantemos você aqui para desperdiçar nosso ar?" Eu me levantei apressadamente quando Priscilla se aproximou de mim. “Você não vale nada!” Meu rosto virou para o lado e eu tropecei quando a palma da mão dela conectou com minha bochecha esquerda em um estalo ressoante.
“Estou no meu intervalo.” Indignação soou no meu tom enquanto eu acariciava minha bochecha. “Eu mereço descansar após trabalhar sem parar por doze horas –“ Outro tapa me interrompeu.
“Essa vadia imunda!” Ela gritou, vermelha de raiva. “Como se atreve a responder aos meus tratos?” Ela se aproximou, mas parou quando Natalia rosnou baixinho em sua garganta.
“Natalia, recue,” eu adverti minha amiga. Ela já tinha sofrido torturas cruéis suficientes por minha causa e, mesmo assim, toda vez que eu a forçava a partir, ela voltava pra mim.
Ao contrário de mim, Natalia era uma loba comum e não uma transmorfa. Eu não poderia dizer se ela me entendeu quando disse para deixar a alcateia, encontrar outro lugar ou se esconder. Ela sempre ficou do meu lado e isso sempre acabava com ela se machucando.
“Você e essa sua cadela estúpida,” Priscilla resmungou, observando Natalia que continuava rosnando, a intensidade do som aumentando a medida que o tempo passava. “Tanto faz,” ela revirou os olhos, fingindo que os sons vindos da garganta de Natalia não a assustavam. “Vou contar tudo ao meu pai.” Com isso, ela passou por mim, o ombro batendo em mim com força suficiente para me fazer tropeçar.
“Natalia, não -“ Sem olhar para trás, eu já sabia o que ia acontecer. Natalia partiu para cima de Priscilla, garras afundando no braço da outra garota que tentava transformar. “Solte-a. Você vai se meter em problemas!” Meus olhos escanearam o local. Eu não podia ouvir nada, mas com o cheiro de sangue subindo no ar, as pessoas logo chegariam.
“Natalia -“ Eu gritei com a voz carregada de emoção. “Por favor -“ Se ela podia me entender, não mostrou nenhum sinal. Ela lutou com Priscilla como um cão raivoso. A filha do Alfa transformou em uma loba marrom, mas lhe faltava a intenção assassina para combater Natalia que lutava como um animal louco pronto para matar.
“Priscilla!” Uma voz trovejou atrás de mim. Virando-me, eu encarei Jackson enquanto ele corria até as lobas que lutavam. Dois outros vieram com ele e separaram a briga em segundos.
"O que você fez?" A expressão no rosto de Jackson fez com que eu recuasse, temerosa. Ele me encarou com olhos vermelhos, dando um passo à frente, enquanto eu retrocedia novamente.
"Jackson," Priscilla chorou com um fungado triste enquanto um homem colocava o casaco sobre ela. "Ela soltou aquele lobo violento em mim." Ela apontou um dedo trêmulo em minha direção.
“Isso não foi o que aconteceu. Ela trombou em mim de propósito e Natalia defendeu -“ Eu comecei a argumentar em defesa da minha amiga.
“Basta.” Estremeci ante o veneno gélido naquelas palavras. “Por que você não pode se manter um dia sem causar problemas?” Ele rosnou em meu rosto. “O que você ganha machucando Priscilla?” Ele envolveu a irmã com o braço, abraçando-a ao seu lado.
Eu diria algo em minha defesa, mas ninguém nunca acreditou em mim. Minhas palavras não tinham peso contra as de Priscilla. Na verdade, se ele viesse ver ela me massacrando até o chão com apenas um arranhão em seu rosto, a culpa seria minha. Priscilla era a filha preciosa do Alfa e membro querido da alcateia, enquanto eu era a pobre filha Ômega do Beta, a criança maldita que matara a mãe. Esses tratamentos não eram novos para mim. Passei toda a minha vida tentando conquistar seu amor, mas agora desisti. Suas palavras dolorosas não me afetam mais. Após conviver com eles por vinte e um anos, um último dia não significava nada para mim.
“Eu peço desculpas” eu abaixei minha cabeça, segurando as lágrimas que ameaçavam transbordar dos meus olhos. O povo da Pink Venom já tinha visto chuvas suficientes dos meus olhos. Eles não mereciam ver meu choro pela última vez.
"Peça desculpas pelo lobo que acabou de matar.” Meu sangue gelou com essas palavras proferidas com hostilidade e olhos duros. "Decapite-o". Ele deu a ordem aos homens que ficavam atentos atrás dele.
"Não, não a Natalia! Foi meu erro - ",eu gritei, sem conseguir conter as lágrimas quando ouvi os gemidos de Natalia. Dois homens robustos arrastaram minha amiga enquanto ela lutava. "Foi meu erro",eu tentei correr atrás deles, proteger Natalia com minhas mãos inúteis, mas Jackson me impediu.
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