Alguns meses se passaram, o amor que sentia pelos filhos possibilitou que Nicole enfrentasse cada dia com a cabeça erguida. Procurou ocupar a mente no trabalho e tentou ser forte todas as vezes que pensou em desistir.
Nicole arrumava os documentos sobre a mesa e encerrava mais uma reunião exaustiva. Embora estivesse habituada e agisse com naturalidade na empresa, que outrora era administrada pela família Bittencourt, a jovem de boa aparência não se deixava intimidar.
Aprendeu muita coisa durante o pouco tempo em que administrou a empresa ao lado de Alexander e de seu pai. Nicole deu algumas instruções à gerente administrativa e liberou a verba necessária para compra dos novos respiradores e equipamentos para o projeto social "Médicos do Bem".
― Isso é tudo? ― Nicole fechou a pasta após assinar alguns documentos e entregou para Jenny. ― Estou atrasada!
― Sim, coelha branca! Isso é tudo! ― Jenny enfatizou a ironia na voz e levantou da cadeira. ― Cuidado com o horário de verão!
― Você não perde essa mania.
Nicole guardou os papéis na gaveta e ergueu os olhos.
― Ei, eu preciso manter a minha imagem!
Jenny arrumou os fios lisos e curtos. Antes de sair da sala, virou-se e olhou na direção da mesa.
― Não exija muito de si mesma. ― Encarou os olhos amendoados. ― Você está com a cara fechada igual a do Alexander.
― Jenny, faz um favor para mim? ― Sorriu de boca fechada. ― Vá ver se estou lá na esquina.
― O.k., chefe!
O senso de humor de Jenny trazia um breve sorriso ao rosto da amiga que, nos últimos dias, só tinha tempo para o trabalho e para os filhos. Nicole assentiu com a cabeça e se despediu da médica, após confirmar o almoço de fim de semana para conhecer o filho que Jenny e Lana adotaram.
Ela esperou até que a obstetra a deixasse sozinha, clicou na imagem com o mouse e olhou com ternura para tela do computador, não existiam palavras para descrever o que sentia. Desejou dias tão bons quanto os daquela foto, passou a ponta do dedo angulado na imagem de Alexander ao lado dela e dos filhos na foto do último cartão de Natal de 2016.
O ruído das batidas interrompeu a doce lembrança, ela clicou no mouse às pressas e fechou a imagem na tela do computador.
― Entre Annie, está aberta!
― Com licença, eu vi a doutora Kim sair e aproveitei para trazer um pouco de café e alguns cookies. ― Annie exibiu um sorriso gentil. ― A senhora não comeu nada hoje, precisa se alimentar.
― Obrigada! ― A voz parecia serena. Nicole mordeu um pedaço do biscoito com gotas de chocolate. ― Eu estava com fome.
― A propósito, ele já ligou sete vezes. ― Annie tinha rugas nos olhos quando sorriu. ― E quer falar com a senhora.
― Annie, por favor, remarque a próxima reunião. ― Nicole levou a mão à testa e abaixou a cabeça. ― Eu preciso resolver algumas coisas. ― Manteve a sobrancelha oblíqua. ― Já falou com doutor Ricardo?
― Sim, ele está trazendo as crianças.
― Obrigada, Annie!
Nicole arrumou o casaquinho de tweed que a deixava com cara de matrona e ajeitou a calça de corte reto que alongava a silhueta. Captou a imagem no espelho redondo e ajeitou o cabelo com corte na altura dos ombros.
― Não esqueça de buscar a Jullie.
― Tenha um bom fim de semana, Annie! ― Lançou um sorriso insosso.
Pegou a bolsa Prada com linhas limpas e simples, saiu da sala da diretoria e seguiu em direção ao elevador. Esperou que a porta abrisse no quinto andar e caminhou em seu salto scarpin preto pelo piso branco nos corredores da ala pediátrica. O sorriso aumentou ao ver a pequena menina que segurava a mão do médico de calças largas e um jaleco branco que sobrepunha a blusa estampada com desenho de ursos.
― Oi, fofinha!
Nicole se aproximou de David, pegou a menina no colo e a beijou.
― Mamãe! ― Os olhos amendoados da criança brilharam.
A menina tinha mechas onduladas que escorriam pelos ombros. Abraçou o pescoço de Nicole e a beijou no rosto. Jullie gostava de passear com David pela ala pediátrica, era a pequena ajudante do doutor amigão e adorava passar as tardes brincando com crianças que precisavam de ânimo e um pouco de alegria para enfrentar os encalços da vida.
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