Clara Rocha apertou os lábios, recordando-se, caso sua memória não a traísse, de que João Cavalcanti sabia muito bem da relação distante que mantinha com a família Rocha.
Lembrava-se de um aniversário de dona Patrícia, sua avó, quando seus pais vieram para a comemoração. Naquela ocasião, seu pai havia exagerado na bebida e pronunciado algumas palavras desagradáveis.
Ela jamais esquecera o semblante fechado dos membros da família Cavalcanti naquela noite.
Ao tentar acalmar o pai, Clara foi empurrada por ele.
Ao cair, quebrou um copo; os cacos de vidro cortaram-lhe a palma da mão.
Naquele momento, ela não guardou ressentimento do pai – afinal, ele estava apenas embriagado, talvez tenha sido sem querer.
O que realmente a magoara foi a indiferença de João Cavalcanti.
Ele não lhe dirigira sequer uma palavra de preocupação.
E agora…
Ele se importaria?
O olhar de Clara Rocha esfriou um pouco. — Ainda há necessidade de perguntar?
Ele soltou um leve riso de desprezo. — Que fraqueza.
Clara apertou os punhos, o rosto ficando pálido.
— Carrega o sobrenome Cavalcanti e mesmo assim permite ser agredida. Isso não é fraqueza?
João Cavalcanti virou de uma vez o resto da bebida no copo.
Suas palavras soavam como um conselho de marido à esposa.
Como se dissesse: ela é minha mulher, não deveria passar por esse tipo de humilhação.
Mas ele não fazia ideia.
Toda aquela dor vinha dele.
João Cavalcanti levantou-se sem pressa, parando diante dela. — Voltei. O que queria me dizer hoje?
Clara ficou um pouco atordoada.
Ele havia chegado cedo por causa daquela ligação?
Controlando a estranheza que ameaçava aflorar, permaneceu em silêncio por alguns segundos. — Hector Rocha está detido na delegacia. Gostaria que você o ajudasse a encontrar uma equipe de advogados.
Ela sabia que João Cavalcanti prezava pela reputação e não se envolveria facilmente em assuntos assim. Por isso, não lhe pediu para tirar Hector da prisão, mas apenas para indicar um time de advogados, buscando uma solução negociada.
Seu pedido não era exagerado.
João Cavalcanti a fitou, avaliando-a. — Está me pedindo ajuda?
— Sim. — Temendo que ele se recusasse, Clara acrescentou rapidamente: — Se me ajudar desta última vez, aceitarei qualquer condição, inclusive o divórcio.
…
Quando João Cavalcanti chegou, Samuel Teixeira já havia tomado o remédio e dormia tranquilo na cama, a mãozinha segurando a dele.
Chloe Teixeira entrou no quarto com uma caneca de canja. — João, desculpe o incômodo, especialmente tão tarde. Sabe, acho que o Samuel realmente gosta de você. Por que não fica esta noite?
Ele parecia gostar muito da criança, certamente ficaria por ele.
João Cavalcanti, certificando-se de que Samuel dormia profundamente, soltou devagar a mão do menino e se voltou para Chloe. — Vou providenciar uma babá para ajudá-los com os cuidados.
O semblante de Chloe mudou sutilmente. — João, não foi isso que eu quis dizer…
Ele se levantou, a voz calma. — Vocês estão sozinhos, e não é apropriado que eu, um homem, venha aqui com frequência. Agora que Samuel já não tem febre, descanse também.
João Cavalcanti praticamente saiu sem olhar para trás.
Chloe apertou com força a caneca nas mãos e lançou um olhar irritado para a criança na cama. — Menino inútil!
Saiu batendo a porta.
O pequeno, que não dormia de verdade, abriu devagar os olhos, as pálpebras úmidas, encolhendo-se sob o cobertor, magoado.
Ele tinha feito exatamente o que a mãe mandara: tomou banho frio para adoecer, só para que o tio João viesse cuidar dele.
Por que a mamãe ainda assim estava descontente…

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Os comentários dos leitores sobre o romance: Apenas Clara
Não tem o restante?...