Em seu lugar 47-Maysa

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Maysa

Estou no meu apartamento, da janela da minha sala vejo a ampla vista do parque. Nesse fim de tarde, pessoas ainda correm, se exercitando. O tempo está nublado, um pouco frio.

A decisão que tomei em deixar Said, foi bem de acordo com meus padrões modernos de independência, mas a verdade é que eu não consigo seguir em frente. Não consigo deixar de olhar para trás e reviver os momentos em que estive nos braços dele. E cada vez que faço isso, eu sinto um aperto no meu coração.

Está sendo tão difícil, a imagem dele me persegue.

—Maysa.

Eu me viro para a minha amiga Jéssica que tinha subido um pouco no meu apartamento, depois de um dia inteiro de trabalho.

— Se continuar com essa carinha triste, vou achar que está arrependida da escolha que fez.

Eu me afasto da janela e limpo uma lágrima que desce em meu rosto. Eu lhe dou um meio sorriso.

— Tenho que dar tempo ao tempo. É muito recente, creio que uma hora vai passar.

Jéssica diz sonhadora:

— Um amor se cura com outro amor.

Eu meneio um não com a cabeça.

—Não um amor. Entendo que o tempo cura, te prepara para um novo amor. Se eu seguir esse conselho, procurar outra pessoa antes desse tempo, só me enganaria. E seria pior. Só reforçaria mais meu amor por Said.

Jéssica ergue as palmas das mãos numa atitude defensiva.

— Está bem! Não está mais aqui quem falou. Como pode ainda sofrer por esse bárbaro? Você mesmo me contou tudo que ele te fez. Um homem como aquele se pudesse te colocaria dentro de uma burca.

—Eu sei.... —Digo, infeliz.

—Está tudo certo para a festa?

pensando sobre isso, mal escuto o que ela me pergunta. E agora o meu cérebro se esforça para encontrar uma resposta. Por fim digo:

— Claro! A minha parte eu já fiz. Já falei com o síndico. E quanto a sua parte? Está tudo organizado?

—Sim, não se preocupe. O buffet que eu contratei é muito bom. Já consegui até arrecadar todo o dinheiro. Será uma despedida bonita.

—Smith merece.

Encaro minha amiga loura, alta, magra, branquinha, típica mulher europeia. Isso é uma característica também dos homens daqui. Um grande contraste em relação a beleza rústica de Said. Moreno de olhos negros, o rosto marcado com os traços do nosso povo. Aquela barba linda, estilizada.

Ele, mesmo calmo, consegue passar força.

Enfim, lindo.

Allah! Balanço a cabeça. Ele não sai dos meus pensamentos. Só então percebo que Jéssica me falou algo e eu não ouvi.

— Maysa, você não está bem. Acho melhor eu

Por favor, fique. O que acha de pedirmos uma pizza? Eu não quero ficar

o cabelo para trás da orelha

Uma ótima ideia. E para de pensar nesse

alma grita para que eu não destrua a imagem de nós dois, mas isso ainda é a minha única esperança de sobrevivência: apagar Said do meu coração é

é um gentleman quando quer. Se não fosse os costumes ele seria uma ótima pessoa. Os homens árabes quando amam, se entregam. Muito mais do que os daqui. Eu nunca duvidei do amor de Said. Apesar de

ele te amasse, mandava os costumes para o espaço, e teria optado

Eu meneio a cabeça.

Não. Ele não consegue porque não é ele. É o país que ele vive, a nossa gente, a sociedade machista. Quando pisei com meus pés aqui e voltei a trabalhar, fiquei reparando nos homens. Cheguei à conclusão que o que eu pedia para Said era demais. Eu experimentei uma liberdade que ele não pode me dar e ao mesmo tempo eu recebi asas que ele queria cortar. Mas ele não percebe que é da minha natureza voar. Não posso ser uma ave exótica na gaiola dourada, que recebe tudo de seu dono, mas sonha em voar, sentindo falta da liberdade. Ele merece uma pessoa que o