Em seu lugar romance Capítulo 46

Said

Uma semana depois de Maysa ter ido embora, eu ainda estou envolto na minha dor. Perturbado, desligado de tudo e todos. Sem paz, eu revivo todos os acontecimentos. Cada vez que eu faço isso, meu coração se aperta mais e mais.

Estou tentando seguir minha vida, mas está sendo difícil. Sinto um buraco negro no meu peito, formando um vácuo que suga tudo. Nada preenche esse vazio.

Cada vez que eu vejo a imagem de Adara na minha frente, mais eu me sinto doente. Por isso comecei a evitá-la e passei a fazer todas as refeições no meu hotel.

A certeza dentro de mim que amo Maysa é cada vez mais forte. Sinto uma vontade louca de ir atrás dela, e pedir uma chance de recomeçar. Lutar com todas as minhas forças para trazê-la de volta para mim. Por outro lado, sinto-me de mãos atadas. Ela não fugiu de mim, ela fugiu da minha cultura, dos costumes do meu país.

Agora, fim de tarde, num Sábado, eu estou dentro da biblioteca, com a porta fechada, as cortinas fechadas. Uma leve penumbra envolve o ambiente. Logo irá escurecer. Fecho meus olhos me sentindo em luto.

O pior luto que podemos cultuar é da pessoa que está viva. Ela morreu só para você e, o pior, não por sua vontade. Esse tipo de luto não passa. A dor não se ameniza pois sei que ela está viva e longe de mim. Talvez vivendo feliz sua vida.

Eu me tornei uma pessoa insuportável, eu mesmo não me aguento mais. Até meus empregados passaram a ter medo de mim. Eu perco a paciência facilmente. Nada tem brilho, tudo é cinza, nada está bom. O mundo virou um inferno.

Ouço leves batidas e a porta se abre, Zafira relutante entra. Eu a encaro consciente da minha aparência, cabelos desalinhados, a barba que sempre fiz questão de deixar bem aparada está enorme e meus olhos soltam chispas.

— A Senhora Sihan está aí.

Pelas barbas do profeta, minha mãe é a última pessoa que eu quero ver.

— Inventa qualquer coisa, mas diga que eu não estou aqui. — Eu falo grosseiramente.

Zafira fica pálida e passa as mãos no avental toda hora.

— Ela já está na sala, foi entrando. O senhor conhece como ela é.

A porta se abre mais para a entrada de Samira. Zafira se inclina e deixou a biblioteca. Samira agora me encara como se não acreditasse em seus olhos.

— Allah! O que está acontecendo aqui? Tem alguma coisa errada! Me disseram que voltou a trabalhar, mas parece pior agora do que quando eu te vi no hospital.

Eu passo os dedos por entre os fios dos cabelos, tentando acertá-los.

— Eu estou bem.

Samira toda de preto se aproximou da minha mesa.

— Por Allah! Você já se olhou no espelho?

Suspiro olhando fixamente para ela.

— Eu estou em minha casa, não vou sair. Minha rotina essa semana foi pesada e é um Sábado. Então, não tenho o porquê, me arrumar.

Ela revira os olhos.

— E essas olheiras? — Samira diz irritada e vai até as cortinas e as abre com violência, me fazendo pôr as mãos nos olhos. A luz incomoda minhas vistas.

— Não tenho dormido muito bem.

— É essa moça, não é? —Ela me olha com deboche.

Se ela souber de tudo irá me dizer: Você é um idiota sabia? Ela foi embora e você virou um homem patético chorando por uma mulher?

Allah! Pense!

Minha mãe ainda não sabe que Maysa tem uma irmã gêmea.

— Eu e Maysa estamos bem.

Ela gargalha, jogando a cabeça para trás. Bate o punho na mesa. Seus olhos fixos em mim.

— Eu duvido! Isso aí está me cheirando coração partido.

Dando um soco na mesa, eu me levanto nervoso.

— Vou chamá-la. E a senhora verá que estamos muito bem.

Zafira entra com o café, aproveito-me desse momento.

—Pronto! Zafira fique com Samira que eu vou chamar Maysa. — Eu digo com os olhos pregados nela, para que ela entenda a situação e não dê um pio com a minha momentânea loucura.

Zafira assente com uma leve reverência e eu me levanto.

— Você sabe onde Maysa está?

— Na cozinha.

Não gosto de dar satisfações da minha vida. Mas minha mãe é a pessoa mais inconveniente que eu já conheci na vida. Ela irá me infernizar com perguntas, que eu no momento, não quero responder. Ela irá jogar na minha cara que me avisou e as coisas ainda não se acomodaram dentro de mim. Eu ainda não vejo minha condição como um caso encerrado. Dentro de mim eu alimento um fio de esperança que tudo possa se resolver.

Como? Eu ainda não sei.

Quem sabe Maysa volte para mim?

Eu saio da biblioteca rumo a cozinha. Desde que Maysa foi embora, eu não vejo Adara, mas situações extremas, pedem medidas extremas. Quando entro na cozinha, Adara se levanta.

— Preciso de você. Quero que vista a roupa que Maysa deixou no guarda-roupa e vá até a biblioteca. Solte os cabelos também. Quero que se passe pela sua irmã. Minha mãe está aí, e não quero dar a ela explicações. Ela conheceu Maysa, e acha que não estamos bem. Você mostrará a ela que estamos bem. Entendeu?

Meu pedido a silenciara. Ela pisca duas vezes, e pela veia do seu lindo pescoço que pulsa, percebo sua agitação.

—Allah! Vamos! O que está esperando?

—Eu não vou conseguir.

Eu posso sentir nela a tensão de seus medos.

— Você não fará nada demais. É só vestir a droga da roupa e soltar os cabelos. Eu irei te abraçar e você colocará um lindo sorriso nesse rosto. Depois cumprimentará minha mãe com educação e dará uma desculpa qualquer para sair. Como algo que esqueceu no forno.

Ela passa as mãos no corpo, nervosamente.

—Ah, tudo bem.

Eu a olho tristemente. Vendo a imagem da mulher que eu amo em outra pessoa. Meus olhos se enchem de lágrimas e saio de lá antes que ela veja. Quando entro na biblioteca, Zafira faz uma leve mesura e saí.

— Estava tentando tirar algo dessa sua empregada. Mas não consegui. Você está de parabéns, seus empregados são fiéis como um cão ao seu dono.

Eu solto o ar irritado com o comentário dela. Vou até minha mesa e faço menção de pegar um cigarro.

— Não. Por favor.

Ela então começa a me falar mansamente, tentando fazer eu mudar de ideia em me casar com uma mulher diferente da nossa cultura. Fico ali, sentado no sofá, em frente a uma grande estante de livros, ao lado dela já me sentindo impaciente.

Nada tem sido fácil.

Nada!

A porta então se abre e Adara entra. Allah! Meu coração dá um salto quando vejo a imagem de Maysa nela.

— Boa tarde senhora Sihan.

Samira encara Adara, com um caftan branco com desenhos geométricos. Bem colorido e à cinturado, marcando seu lindo corpo. Ela caminha como um robô para perto de nós.

É nítido que ela está se sentindo desconfortável.

—Allah! Said! Como pode permitir que ela ande com roupas como essas?

Eu fico a olhar para a minha mãe. E uma luta começa a se formar em meu peito. Meus olhos procuram Adara com as roupas e vão para minha mãe toda coberta. Algo explode dentro de mim, algo que ainda eu não entendo e isso me faz encarar minha mãe com determinação.

— Ela se vestirá assim quando ela quiser. Eu a amo por ser diferente. Eu resolvi que irei me mudar desse país. Irei para o Egito. Lá as mulheres são mais modernas. E Maysa viveu muito tempo na Inglaterra. Ela não consegue mais lidar com nossos costumes. Eu estou pensando em vender meu hotel aqui e partir.

Digo aquelas palavras como se fosse algo mais natural do mundo para mim, cada palavra. Sento-me tão bem em dizê-las. É algo tão libertador.

Desvio os olhos de minha mãe e encaro Adara que me olha como se também não acreditasse nelas.

Allah! Como gostaria que fosse Maysa agora me ouvindo falar assim!

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