Meu corpo estava leve como uma pluma. Abri os olhos e não tive certeza de onde estava. Acima de mim, havia um céu azul claro, sem nuvens. Apesar disso, não vi o sol.
Em vez de me ver pendurada com o sangue escorrendo em direção à tigela dourada logo abaixo de mim, uma graminha fazia cócegas na minha pele. Eu me sentei. Ao meu redor, eu podia ver colinas extensas, cobertas de grama verde e dourada, que balançava suavemente com a brisa. O cheiro era delicioso e fresco. Respirando fundo, eu me senti em paz por um momento.
Até que, então, olhei para baixo. Meu corpo estava coberto de cicatrizes. Embora eu não estivesse mais sangrando, havia um longo corte em meu braço esquerdo, por onde eu podia enxergar até o osso. Estremeci, de repente sentindo muito frio e consciente da minha nudez.
Eu não sabia onde estava ou por que não estava usando roupas.
Lembrei-me da minha morte, da minha irmã gêmea, da traição e da crueldade de Ferrara. A loba dentro de mim se agitou e fiquei furiosa. Pensei nela, a pior pessoa que havia conhecido na vida, tomando meu lugar ao lado do meu companheiro. Eu vi a escuridão, vi o vermelho do meu sangue sendo tirado de mim diariamente. Eu vi a vida sendo drenada de mim para uma tigela de ouro e me lembrei das palavras de Ferrara: "Meu Alfa fará um banquete no dia do nosso casamento".
Eu gritei: "Eu sou a Sherrie!" Minha voz ecoou pelo ambiente, alta e poderosa, como se eu tivesse toda a força da vida. Natasha, há muito subjugada pelo pó de acônito, era forte. Lembrei-me das minhas presas rasgando a pele da minha irmã e cobicei a chance de acabar com ela. Minha vingança foi roubada.
Levantei-me, olhando ao redor deste lugar estranho e surreal. Era vasto e aberto, como se as pastagens se estendessem para sempre até encontrar o céu. A grama sussurrava enquanto o vento as acariciava. Um movimento chamou minha atenção.
Numa outra colina, havia uma mulher alta de rosto branco e cabelos preto-azulados, brilhando como uma noite estrelada – um brilho que descia pelo seu corpo e cobria-lhe os seios. Eu sabia instintivamente que se tratava da Deusa da Lua. Ela abriu os braços para me receber.
A loba dentro de mim cambaleou e eu me transformei em Natasha, correndo livremente pelas planícies. Pela primeira vez em anos, não havia uma corda em volta do meu pescoço nem guardas para definir meu ritmo, e eu podia correr a passos largos pela grama. Minhas patas se estendiam graciosamente, como se mal tocassem o chão.
Quando me aproximei dela, voltei para a minha forma humana, cheia de cicatrizes. Olhei para as marcas que cobriam minha pele flácida e machucada. Meu corpo estava desesperadamente ressecado, e minha pele não carregava nada do brilho juvenil e da suavidade que notei em Ferrara. Lembrei-me das palavras dela, e a vergonha da minha própria imagem ainda ecoava em minha mente. "Imagine só ele acasalando com você, quando ele pode ficar comigo."
Caí nos braços da Deusa da Lua, chorando. Ela me abraçou como uma mãe abraça seu filho. Ela se sentia quente e macia, como a luz da lua cheia. Eu tinha esquecido como era ser amado.
Minha irmã deveria ter me amado. Collin deveria ter me amado. Todos eles me traíram. Num choro furioso, eu me livrei do abraço da Deusa da Lua. "Por que eu?" Senti muita raiva. "Por que você me deixou viver essa vida?", eu gritei com ela, aos soluços.
O espaço entre mim e a Deusa da Lua ficou distante e frio. Ela pareceu chocada com a minha indignação. Ao contrário de Ferrara, a expressão do seu rosto mudou, demonstrando piedade e compaixão. "Posso sentir toda a sua dor, minha filha. Essa dor não foi só sua."
"Mentira! Eu estava sozinha! Sua bênção me matou, você não vê? A culpa é toda sua. Que se f*da esse sangue puro, que se f*da o Clã Kasper, especialmente Ferrara! F*da-se o Collin também!" Minha respiração estava curta, eu não tinha nem certeza se ela estava conseguindo entender minhas palavras, com todas as lágrimas que surgiram com elas.
Pensei na alegação de Ferrara de que Collin sabia de tudo desde o começo. Era difícil acreditar em qualquer coisa que ela dissesse, mas só a possibilidade de ser verdade me causava profunda dor.
Ela me abraçou novamente. Eu deixei, precisando de calor. Ver alguém se importando só me fez chorar mais.
Então a Deusa da Lua disse: "Criança, há uma razão para você ter sido a escolhida. Seu sofrimento a teria tornado mais forte."
“Nunca pedi para ser a escolhida! Não quero essa bênção, tire-a de mim!” Eu a empurrei e me encolhi, sentindo-me traída. Parecia que todos na minha vida – e, agora, na minha morte – estavam contra mim.
Caí no chão chorando incontrolavelmente, de uma forma que não tinha me permitido chorar nos últimos anos, desde que me forcei a ficar insensibilizada quando vi que ninguém responderia às minhas súplicas. Todas as emoções me atingiram de uma vez, como um maremoto.
Caída no chão, senti a mão dela tocar meu ombro e acariciar minhas costas. Ela me deixou chorar por muito tempo. Eu senti que poderia ter chorado por meses. Eu não me importava que a Deusa da Lua me visse daquele jeito, eu não me importava com nada; eu havia represado muita dor. Ela se sentou ao meu lado, mas não me interrompeu.
Finalmente, parei de chorar. Eu me recompus e olhei para a Deusa da Lua, que esperava pacientemente que meu choro acabasse. Seu rosto redondo era suave e gentil, e seus olhos brilhantes estavam cheios de lágrimas. Foi então que percebi que ela estava chorando comigo.
Comentários
Os comentários dos leitores sobre o romance: Felicidade de Ter Meu Segundo Alfa
São só 5 capítulos?...