Ponto de Vista da Kaia
As coisas estavam... Boas.
Eu passava parte dos meus dias no escritório do Hector, conferindo meus e-mails e depois ajudando com a administração da matilha.
Ele estava começando a me confiar informações da matilha...
Bom, não eram informações ultra-secretas, só documentos sobre nascimentos e mortes recentes, mas ainda assim... Ele estava confiando em mim, e aquilo me deixava incrivelmente feliz.
Gostava de pensar que estávamos nos tornando amigos.
Ele me convidou para participar do treino matinal. Eu aceitei, escondendo a animação, mas me arrependi assim que uma batida na minha porta me acordou às 5h da manhã. E ainda mais quando o ar gelado da manhã me congelou até os ossos.
— Com que frequência eles treinam? — Perguntei, sem tirar os olhos dos homens e mulheres à minha frente.
A Matilha Deserto de Âmbar também tinha guerreiras, mas, em comparação, o número era bem menor que o da Matilha Fantasma das Trevas.
E, para ser sincera, eu estava começando a gostar ainda mais daquela matilha por outro motivo.
Os homens tratavam as mulheres de forma diferente. Eu estava sendo tratada de forma diferente.
— Aumentei para duas vezes por dia desde que os nossos "visitantes" começaram a aparecer com mais frequência na minha fronteira. — Disse Hector, enquanto olhava ao redor, atento a tudo.
Ele e o seu Beta Ezra se mantinham sempre em alerta, revezando os períodos de descanso por algumas horas.
— Isso é bom, principalmente paras mulheres...
— É mesmo? — Ele olhou para mim lá de cima, com um sorrisinho leve se formando no canto da boca.
— Sim, olha ali... Aquela mulher não está com a postura certa. Vai aguentar cinco segundos no máximo. Ela é novata?
— É, sim.
— Então... Talvez valha a pena ter uma mulher treinando as mulheres. E deixar um treinador homem com os homens.
— E por que eu faria isso?
— Mulheres não são homens em miniatura, Alfa Hector. Só uma mulher entende de verdade como treinar outra mulher. Só a gente entende como o nosso corpo funciona. A gente precisa ser mais ágil numa luta, mais rápida, mais leve nos movimentos. Poucas conseguem vencer um homem na força bruta, então temos que usar outras armas que temos. — Falei, dei leves batidinhas na cabeça, indicando o cérebro.
— Vou levar isso em consideração.
Ele deu um passo em direção ao treino, e por um instante, temi ter passado dos limites, falado fora de hora. Normalmente, eu não era do tipo que falava tudo o que pensava, sempre fiquei submissa por muito tempo, mas algo em Hector me fazia desejar liberdade e poder.
Uma coisa que ele não fez foi me repreender por ter opinado. Pelo contrário, ele acolheu o que eu disse.
Minha ansiedade diminuiu, mas os devaneios aumentaram quando ele começou a tirar o moletom folgado, ficando só de shorts esportivos. Meus olhos seguiram o contorno do corpo dele, os músculos das costas se contraindo conforme ele tirava a blusa. Tentei disfarçar, tentei parecer desinteressada, mas quem eu estava enganando?
Então ele virou de costas, assumindo uma postura de combate, pronto para treinar. Meu coração acelerou mas não deixou de pensar: "O que é que tem nesses corpos de alfa? Ele não era exceção."
Esculpido, cada centímetro dele era músculo puro, e não consegui evitar de imaginar minha língua deslizando por aquele corpo definido.
Até o tanquinho parecia natural, como se nem precisasse se esforçar para manter.
Mas será que era errado pensar daquele jeito de outro homem, sendo que eu era casada... e grávida? Porque era exatamente aquilo que eu estava fazendo naquele momento. E, sinceramente, nunca desejei tanto um vínculo de companheirismo como naquele momento. Não conseguia parar de imaginar ele vindo até mim, me pegando no colo e me levando direto para casa dele.
Até mesmo a forma como ele lutava era sexy, enfrentando outros 5 caras, e mesmo assim, ele nem suava.
Achava que eu também precisava de um bom banho para dar uma refrescada. Da próxima vez, eu devia lembrar de trazer meus óculos de sol... Provavelmente eu parecia uma idiota com óculos de sol às cinco da manhã, mas pelo menos ninguém conseguia ver para onde exatamente eu estava olhando.
Foi aí que, no canto do olho, vi uma mulher sozinha descendo uma ladeira, claramente abalada, abraçando o próprio corpo.
Ela puxou o ar com força, tentando controlar o próprio choro. Era uma jovem forte, dava para ver.
— Eu... Eu fui até a fronteira ver se o papai tava lá... — Disse ela, mantinha a cabeça baixa, evitando a todo custo olhar para o irmão.
Eu tive quase certeza de que ela não devia ter saído do território central da matilha .
— Ele deixou o relógio... — Ela continuou, olhando apenas para Hector. As mãos tremiam enquanto ela pegava o relógio do bolso rasgado do cardigã. Senti um enjoo subir quando reparei nos cortes e nos hematomas nos nós dos dedos dela. Meus olhos passaram por sua aparência, o cardigã estava rasgado visivelmente, e a barra do vestido também.
Ela continuava encolhida, se abraçando, enquanto os hematomas começavam a escurecer ainda mais no pescoço e nas pernas. Eu não conseguia ver as coxas dela, mas tinha quase certeza de que também estavam machucadas.
Os homens ainda não tinham reparado, mas um alarme começou a soar dentro da minha mente.
— Ele sempre dizia que era má sorte sair de casa sem o relógio. Eu não achei o papai... Aí eu senti os olhos dele em mim. A ordem dele.
— Hector... — Tentei chamar a atenção dele, querendo puxar ele por lado. Não dava para forçar mais a garota. Ela tinha passado por um inferno e precisava de um médico antes de qualquer coisa.
— De quem? — Perguntou Hector em voz baixa. Riley andava de um lado por outro, e os amigos tentavam acalmar ele enquanto ele se curvava, parecendo que ia vomitar.
Rosa cometeu o erro de olhar para o próprio irmão, que estava pálido e começando a fazer sons de ânsia. Achava que ele também já tinha entendido tudo.
— Rosa... Rosa, olha para mim. Isso mesmo. Muito bem. Agora me diga: de quem era a ordem que você sentiu?
— Hector... — Falei, em tom baixo mas firme, obrigando ele a me encarar. Ele finalmente virou e me encarou. Os olhos dele passaram por mim e foram direto para Riley.
Depois ele olhou de volta para Rosa, o olhar percorrendo as roupas rasgadas da garota, subindo lentamente.
A aura dele começou a preencher o ambiente. Dava para sentir.
— Foi o meu companheiro.

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