O Padrasto 1 romance Capítulo 27

Até aqui viajamos juntos.

Passaram vilas e cidades, cachoeiras e rios, bosques e florestas...

Não faltaram os grandes obstáculos.

Frequentes foram as cercas, ajudando a transpor abismos...

As subidas e descidas foram realidade sempre presente.

Juntos, percorremos retas, nos apoiamos nas curvas, descobrimos cidades...

Chegou o momento de cada um seguir viagem sozinho...

Que as experiências compartilhadas no percurso até aqui sejam a alavanca

Para alcançarmos a alegria de chegar ao destino projetado.

A nossa saudade e a nossa esperança de um reencontro aos que, por vários

motivos, nos deixaram, seguindo outros caminhos.

O nosso agradecimento àqueles que, mesmo de fora, mas sempre presentes, nos

quiseram bem e nos apoiaram nos bons e nos maus momentos.

Dividam conosco os méritos desta conquista,

porque ela também pertence a vocês.

Uma despedida é necessária antes de podermos nos encontrar outra vez.

Que nossas despedidas sejam um eterno reencontro.

Autor desconhecido

Christopher veio para Vegas e tivemos uma conversa definitiva há um mês. Os dias que se seguiram foram difíceis, com muitas lágrimas. Tenho certeza que a ideia de sugerir essa viagem para Nova Iorque é coisa de Ane e Bruno. Pietro não deixou isso claro, mas sei o que estou falando. Para falar a verdade, nem sei se é uma boa ideia, mas agora não tenho mais como desistir.

Estou terminando de me vestir, meus pensamentos voltados para Ane e Bruno, que me pegaram de surpresa ao anunciarem que vão morar juntos. Ela sempre me disse que só se casaria depois de morar com o companheiro por uns dez anos, pois se sobrevivesse a convivência por esse tempo, aí sim teria certeza de que tudo daria certo. Eu nunca entendi direito esse pensamento, mas sempre respeitei, até porque não imaginei que ela levasse isso a sério. Eu conheço a minha amiga e sei o quanto é romântica.

— Entre — falo assim que ouço alguém batendo à porta.

— Está pronta? O Pietro chegou — Carol diz enquanto me encara com um sorriso amarelo no canto da boca.

— Estou. Que carinha é essa? — pergunto quando percebo um leve pesar em seus olhos.

— Essa casa vai ficar tão vazia sem você e Lucca — diz, desviando os olhos tristes.

Deixo a minha mala sobre a cama e caminho em sua direção, envolvendo-a em meus braços.

— E só um fim de semana. Logo Lucca volta da casa dos pais, e eu da casa da Ane. Prometo ligar todos os dias — digo, na tentativa de fazer com que ela pare com esse chororô.

Nesses três anos que estou aqui, não só eu, como Lucca também, nos aproximamos muito dela. Ela é uma garota muito inteligente e dedicada ao trabalho, conseguimos fazer com que ela voltasse a estudar e sempre a ajudamos com as matérias que tem dificuldade. Passamos muitas noites juntos indo ao cinema, cassinos, danceterias, mas Carol acabou se apaixonando por Hernando, um amigo de Lucca, e como vive um amor platônico, ela preferiu se afastar da nossa turma e começou a sair com as garotas da escola em que estuda.

Na sala de estar, eu me despeço da minha avó, que ainda não está muito contente com essa minha viagem. Ela chegou a me dizer que não gostaria que eu colocasse mais os pés em Nova Iorque, na hora até achei engraçado e pensei que ela estivesse brincando, mas não, ela estava muito séria ao fazer tal afirmação. Só depois que eu me dei conta que ela ainda teme que eu volte a morar com a minha mãe, mas isso está fora de cogitação. Fui muito firme ao dizer que isso nunca irá acontecer, mas convencer a dona Iolanda não é tão fácil assim.

Pietro está muito animado com essa viagem, nem mesmo no avião para de tagarelar. Nós queríamos alugar um carro para podermos rodar pela “Big Apple”, mas Ane e Bruno não aceitaram de forma alguma isso e ficaram de nos buscar no aeroporto, chegaram a dizer que seria uma grande “desfeita” se fizéssemos isso. Só mesmo os meus amigos para dizerem tal coisa.

Ainda continuo achando uma loucura fazer um viagem tão longa só para passar um fim de semana, mas Pietro ficou tão empolgado com a ideia, que não tive coragem de recusar o seu pedido. Estamos esperando as nossas malas quando avisto, através do vidro, Ane e Bruno em frente ao portão de desembarque. Eu aceno para ela com animação, e a emoção de reencontrar os meus amigos é tamanha que acabo esquecendo o cansaço da viagem.

— Amiga, que saudade. — Ane me envolve em um forte abraço.

— Também senti sua falta — digo, emocionada.

Eu me aproximo de Bruno, que já está tagarelando com Pietro, e o cumprimento, então nos dirigimos para o estacionamento.

— E muito bom ter vocês por aqui — ele diz com sinceridade.

— E eu estou louco pra derrotar você no game — Pietro o provoca.

— Treinei muito para evitar uma possível derrota, meu caro — meu amigo rebate.

E seguimos assim, Bruno e Pietro discutindo como dois adolescentes, enquanto Ane e eu aproveitamos a linda paisagem do final de tarde. O apartamento dos meus amigos é grande e bem aconchegante, tudo muito simples, mas lindamente decorado. Pietro e eu seguimos para o quarto em que ficaremos hospedados, tomamos banho e seguimos para a sala. Enquanto os meninos se divertem no videogame, Ane e eu preparamos a mesa para o jantar e aguardamos a chegada da pizza que ela havia pedido.

— Gata — Ane diz e faz um sinal com a mão, pedido para que eu espere, então vai até a porta da cozinha e discretamente vê se Bruno ou Pietro estão vindo se juntar a nós. — Que história é essa do Christopher ter ido atrás de você? — pergunta.

Mais uma vez tenho a sensação de que nunca estarei livre dele. Christopher, Christopher, sempre ele. Resumo a história para Ane, que fica emocionada ao me ouvir narrando a declaração que ele fez e o quanto dói amar alguém que nunca poderei ter. Para a minha sorte, a pizza não demora a chegar e os meninos se juntam a nós, interrompendo a nossa conversa. Depois de arrumarmos a cozinha, nós vamos para a sala com os rapazes e acabamos fazendo um pequeno torneio de videogame de meninos contra meninas. Ganhamos algumas partidas, deixando frustrados os garotos que acham que mulher não sabe jogar videogame. Horas depois nos despedimos dos nossos amigos e vamos dormir, teremos um dia cheio pela frente.

Quando acordo, na manhã seguinte, Pietro já não está mais na cama. Olho a hora no celular e vejo que já são mais de nove da manhã. Dormi muito mais do que deveria. Depois de tomar um delicioso banho para espantar o calor do verão que esse ano me parece pior que os anteriores, visto um vestido de alcinhas florido. Saio do quarto à procura dos meus amigos e Pietro quando escuto algo caindo na cozinha. Passo pela sala e um sorriso aparece em meus lábios ao me lembrar da disputa que tivemos na noite passada, o quanto eles se tornam crianças em uma partida de videogame. Assim que coloco meus pés na cozinha, quase desmaio.

— CHRISTOPHER! — digo, surpresa ao vê-lo de costas usando somente uma cueca boxer e um avental.

— Bom dia, amor — ele se vira e me encara com o sorriso mais cínico que já vi em seus lábios.

— O que, que... você está fazendo aqui? — pergunto, assustada.

— Como assim? Julha, você anda muito estranha — diz, ignorando totalmente a minha pergunta.

— Onde está a Ane?

Ele me encara com as sobrancelhas franzidas antes de colocar o prato com algumas panquecas na mesa.

— Deve estar na casa dela. — Ele vem em minha direção e passa o braço em volta da minha cintura, aproximando o meu corpo do dele.

— Christopher, alguém pode entrar.

— Amor, ninguém vai entrar aqui sem ser convidado. Esta é a nossa casa. Agora vamos tomar café. — Ele segura a minha mão e me guia até a mesa.

Acabo me sentando ao lado de Christopher, que se aproxima, afasta o meu cabelo para o lado e faz uma trilha de beijos em meu pescoço, deixando-me arrepiada.

— Isso é muito louco — digo, tentando entender o que está acontecendo.

— O que é muito louco, princesa?

Eu me viro para ficar de frente para ele e olho dentro dos seus lindos e fascinantes olhos azuis, fazendo com que uma corrente elétrica percorra o meu corpo.

— Nós aqui. Por um momento, eu pensei que estivesse na casa da Ane e que iria me casar com...

Ele coloca o dedo indicador sobre os meus lábios, impedindo que eu continue.

— Eu amo você como nunca amei ninguém na vida — ele diz antes de segurar a minha nuca e me puxar para ele, colando os nossos lábios. Com sua língua habilidosa ele pede passagem, que eu claramente concedo. Suas mãos deslizam pelo meu corpo, alcançando meus seios, então um gemido rouco chamando por seu nome sai dos meus lábios.

Rapidamente ele se levanta e me toma em seus braços ao mesmo tempo em que entrelaço minhas pernas em volta da sua cintura. Ele me segura colada ao seu corpo com uma mão, enquanto a outra afasta a louça e o nosso café da manhã que está sobre a mesa, deitando o meu corpo sobre a madeira fria logo em seguida. Seus lábios sobem beijando minhas pernas, passando pelas coxas e fazendo com que eu solte gemidos baixinhos. Como uma virgem em seu primeiro contato com um homem, o meu corpo estremece e uma explosão de desejo se instala dentro de mim. Arqueio o meu corpo para sentir os seus lábios cada vez mais perto, enquanto sua língua passeia pela minha barriga e sobe até os meus seios, dando uma leve mordida nos meus mamilos enrijecidos depois de afastar o meu sutiã.

— Ah, Julha, que saudades de sentir o seu sabor — Christopher geme e suga os meus mamilos com intensidade, deixando-os vermelhos. A marca que sempre gostou de deixar em meu corpo.

Nesse momento, meu corpo parece queimar, como se uma bola de fogo ardesse dentro de mim, não me deixando pensar com clareza. Christopher se coloca entre as minhas pernas, esfregando o seu sexo endurecido e pulsante contra o meu. Sem conseguir controlar o desejo de senti-lo dentro de mim, eu praticamente imploro, minha voz soando como um gemido.

— Quero você, Christopher. Quero você dentro de mim.

— Não, ainda não. Primeiro preciso sentir o seu gosto em meus lábios. Quero sentir que você ainda é minha. — Ele me dá um beijo lascivo, fazendo o meu sexo umedecer, e, em seguida, desliza o dedo indicador pelo meu corpo até a minha calcinha, puxando-a para o lado para tocar o meu clitóris. Então não consigo mais me segurar e acabo remexendo o quadril na tentativa de fazê-lo me possuir. — Não seja apressada, pimentinha, quero desfrutar de você lentamente, sentir cada parte do seu corpo — sussurra com os lábios próximos ao meu sexo enrijecido.

Sem pudor algum, sua língua percorre meu corpo e invade o meu sexo enquanto seu dedo faz movimentos circulares e para cima e para baixo. Gemidos mais altos do que eu gostaria saem dos meus lábios.

— Você é doce — diz, sugando o meu sexo com intensidade.

Penetrando-me com a sua língua com movimentos de vai e vem, Christopher desperta em mim o mais puro prazer, fazendo com que eu chegue ao ápice.

— Preciso de você, só de você — geme rouco.

Enquanto tira a boxer, desperta mais uma vez o meu desejo por ele. Seu sexo rígido e convidativo faz o meu mais uma vez dar sinal de vida. Christopher deita seu corpo sobre o meu e suga meus lábios com violência.

— Não consigo ficar longe de você e sei que você também não consegue ficar longe de mim. — Christopher puxa meu quadril para mais perto, suas mãos firmes apertam a minha bunda e me levantam da mesa. Como se o meu corpo já soubesse o que ele quer, deslizo o seu sexo enrijecido para dentro de mim, provocando seus sussurros inspiradores. — Gostosa. — Com as mãos em minha cintura, ele comanda o ritmo da minha subida e descida em seu sexo duro, arrancando gemidos do fundo da sua garganta. — Eu te amo, Julha, te amo. — Ele envolve meu cabelo em suas mãos e o puxa para trás, provocando uma dor gostosa.

— Quero você, Christopher — digo pausadamente, pronta para mais um orgasmo.

Com o corpo em chamas, ele me tira do seu colo e me coloca inclinada sobre a mesa, invadindo o meu sexo, penetrando cada vez mais rápido.

— Julha, ah, Julha — diz, seu corpo trêmulo.

Eu viro um pouco a cabeça para olhar por cima do ombro e vejo Christopher com os lábios entreabertos chegando ao orgasmo, logo em seguida o mesmo acontece comigo.

— Julha, amor, acorde.

Dou um salto da cama e olho em volta, Pietro me encara com as sobrancelhas franzidas. Minha respiração está ofegante, meu corpo suando e minha pulsação acelerada como se tivesse acabado de correr uma maratona.

— Você? O que está fazendo aqui?

— Amor, vem cá. — Pietro dá de ombros e solta uma gargalhada antes de se levantar e caminhar em minha direção. Ao se aproximar, ele me puxa para os seus braços e me leva de volta para a cama. — Você teve um pesadelo.

Dou uma leve mordida em meu lábio inferior ao me lembrar de que não havia sido um pesadelo, e sim um sonho maravilhoso com Christopher Cloney. Será que eu disse o nome do Christopher e Pietro ouviu? Céus! O que está acontecendo comigo?

— Tudo bem, amor, estou melhor. Vamos voltar a dormir.

Pietro me envolve em seus braços e me puxa para mais perto, colando os nossos corpos. Fico buscando em minha mente o que teria acontecido para me trazer de volta sonhos que há muito tempo não aconteciam mais. Só volto a pegar no sono quando o sol já está nascendo.

Acordo por volta das nove da manhã e não encontro mais Pietro ao meu lado na cama, então me preparo para o dia e sigo para a sala, encontrando-o com o Bruno em mais uma discussão sobre pênaltis batidos. Dou um sorriso contido e saio discretamente, sem que notem a minha presença, e vou para a cozinha me juntar a Ane, que denuncia a sua presença ao deixar algumas panelas caírem.

— Acho tão linda essa sintonia entre você e a cozinha — digo em um tom irônico.

— Muito engraçado, Julha. Bom dia para você também — cumprimenta e sopra um beijinho para mim. — Como passou a noite? — pergunta, deixando claro que já sabe o que aconteceu.

Eu olho para ela e baixo o olhar, voltando para o café que estou preparando.

— Como você soube? — pergunto, curiosa.

— Ouvi Pietro contando para Bruno que você havia tido um pesadelo, então me dei conta do que tinha acontecido.

— Isso não vai acabar nunca? — pergunto, chorosa.

— Sinto muito, amiga — diz com sinceridade. — O tempo é o melhor conselheiro, então fique tranquila, um dia isso será só uma lembrança e não a machucará mais. — Depois de um tempo em silêncio, ela volta a falar: — Vamos ao shopping depois do almoço? — pergunta na tentativa de me animar.

— Tudo bem. — Estou precisando me distrair e ficar em casa trancada não irá me ajudar a esquecer.

Após ajudar Ane com o almoço, nós limpamos a cozinha e nos arrumamos para ir ao shopping.

— Uau! Que linda está a minha princesa — diz Pietro enquanto vem ao meu encontro ao me ver entrando na sala. Ele envolve os braços em minha cintura e me puxa mais para perto antes de me dar um beijo de tirar o fôlego, sem se importar com os nossos amigos na sala. — Seu eu te fizer uma proposta, você desiste de ir para o shopping? — sussurra com seus lábios próximos ao lóbulo da minha orelha, fazendo o meu corpo ficar arrepiado.

— Vai valer apena? — digo, fingindo indiferença.

— Você não vai se arrepender — provoca e dá aquele sorriso sedutor de canto de boca.

— Pode ir parando. Nem vem, Pietro, você não vai conseguir seduzir a minha amiga — Ane diz ao se aproximar de nós.

— Nossa! Vocês estão muito gatas para saírem sozinhas — protesta Bruno.

Ane o encara com as mãos na cintura e olhos semicerrados.

— Nem pense nisso. Hoje o dia é meu e da Julha. — Ela olha para mim e dá uma piscadela em sinal de cumplicidade.

Eu compreendi muito bem aquele olhar dela, tenho certeza que terei que reviver o doloroso dia que havia passado com Christopher.

— Então as nossas meninas não querem a nossa companhia? — Pietro diz, suas sobrancelhas franzidas fingindo estar surpreso.

— Sem drama, love — digo, pressionando os lábios, fazendo-o soltar uma gargalhada.

— Nós vamos ao shopping e à noite deixaremos que desfrutem da nossa companhia nos levando para jantar. — Dou uma piscadela e um sorriso irônico.

Nós nos despedimos de Pietro e Bruno e seguimos para o shopping, animadas com a tarde que teremos. Falamos sobre a relação de Ane e Bruno, que está cada dia mais consolidada. Ane me conta que ficou sabendo que Felipe foi para a Inglaterra fazer intercâmbio e agora eles mantêm pouco contato com ele. Eu ainda me sinto culpada por tudo o que havia feito Felipe passar, e dói mais ainda saber que ele carrega uma grande mágoa de mim depois de tanto tempo.

— O que foi? — pergunta ao notar o meu olhar triste.

— Feridas que ainda estão abertas — digo, colocando os meus óculos de sol na tentativa de esconder os olhos marejados.

— Isso só o tempo para cicatrizar. — Ela coloca a mão em meu joelho e dá um leve aperto para me reconfortar.

Para a nossa sorte, o trânsito está ótimo e nos permite fazer o trajeto em menos tempo do que o esperado. Caminhamos pelo shopping olhando para as vitrines, compramos alguns acessórios e vamos assistir a um filme. Depois decidimos comer e entre uma mordida e outra em meu lanche, eu conto para Ane tudo o que havia acontecido entre mim e Christopher quando ele decidiu me procurar.

— Que loucura, amiga. Eu achei que ele tivesse desencanado — diz, depois de dar um generoso gole em seu suco.

Com olhar perdido em meu dedo indicador que contorna a borda do copo, eu digo: — Eu também achei que não sentia mais nada... Passou tanto tempo, mas...

— Sabe, amiga, alguns amores são para serem vividos e depois guardados em nossa memória e coração. Acho que você e Christopher se encaixam nesses amores — reflete com a voz pesarosa.

— Você tem razão — concordo rapidamente para mudarmos logo de assunto.

Decidimos ir embora quando já passa das seis da tarde. Estamos rindo de uma piada que Ane acaba de contar, quando ouvimos uma voz suave chamar atrás de nós.

— Titia. Titia Ane.

Eu me viro para ver quem é o dono daquela voz tão gostosa e suave, então meus olhos encontraram aquela pequena criança correndo em nossa direção e envolvendo Ane em um abraço. Estremeço ao me dar conta de que aquela criança é o Júnior, meu irmão. Meu corpo é acometido por um tremor diferente do que já havia sentido antes. Um nó toma conta da minha garganta e neste momento um sentimento de arrependimento me domina. Ele é tão lindo... tão parecido com Christopher.

— Júnior, está sozinho no shopping? — divertida, Ane pergunta, afastando-o dos seus braços.

— Não, eu estou com a mamãe, ela e...

Seus olhinhos encontraram os meus, e por um momento tenho medo do que o meu irmão pode pensar de mim por não tê-lo visto dar os primeiros passos, ouvir as suas primeiras palavras, não ter participado em nada da sua vida. Ele fica parado me olhando com seus lindos olhinhos azuis brilhando, então as minhas lágrimas se fazem presentes enquanto nos encaramos por alguns minutos.

— Julha — diz e corre em minha direção.

Ao se aproximar, eu o envolvo em meus braços e não consigo controlar os soluços que saem involuntariamente dos meus lábios.

— Meu pequeno! — digo, apertando-o contra o meu corpo.

Mesmo distante, sei que estou ligada de alguma forma ao pequeno Júnior. Não tenho dúvida do meu amor por ele, mas senti-lo tão perto me faz ver o quanto perdi sendo orgulhosa. Eu poderia ter agido diferente, mas o meu orgulho me impediu de vivenciar momentos únicos que jamais voltarão. Embora seja tão pequeno, ele me ensinou que o verdadeiro amor supera tudo.

— Você nunca veio me ver. — Seus olhinhos tristes me fitam.

— Você sabe quem eu sou, Júnior? — pergunto, secando as lágrimas que não param de cair.

— Minha irmã Julha — diz, acenando com a cabeça, um largo sorriso presente em seu rosto, parecendo sentir orgulho de ter uma irmã mais velha.

— Isso mesmo. Eu sou sua irmã mais velha, rapazinho. — Passo as mãos em seu rosto angelical.

— Júnior! Meu Deus! Você ainda me mata, moleque — ouço minha mãe se aproximar, pegando o pequeno Christopher em seus braços assim que o alcança.

Ela nota a minha presença só depois de conseguir respirar aliviada pelo desespero de ter perdido seu filho.

— Julha?! — diz, surpresa ao me ver.

Ela entrega Júnior para a babá que está ao seu lado e vem em minha direção, envolvendo meu corpo em um abraço afetuoso. A sensação de abraçar a minha mãe depois de tanto tempo é uma mistura de saudade e mágoa. Saudade de sentir o seu delicioso cheiro suave de pêssego, e mágoa por ela não ter sequer me ligado em meu aniversário.

— Querida, você está ainda mais linda. — Ela acaricia o meu rosto ao se afastar. — Olá, Ane — cumprimenta a minha amiga com dois beijinhos no rosto ao notar a presença dela.

— Oi... mãe — digo, minha voz falha ao entrar em pânico imaginando que Christopher pode aparecer a qualquer momento. Ainda não estou preparada para vê-lo novamente. Bem, acho que nunca estarei.

— Querida, temos tanto o que conversar. — Ela passa a mão pela minha cintura, envolvendo-me em seu abraço.

Fico um tanto sem graça, não consigo me comportar da mesma forma que ela, como se nada tivesse acontecido.

— Eu sei — digo ríspida.

— Já está indo embora? — pergunta me encarando, e depois desvia o olhar para Ane.

— Não, Julha, não vai embora de novo — diz o pequeno príncipe, jogando-se em meus braços.

— A Julha vai te ver, prometo — afirmo, secando suas pequeninas lágrimas.

— Júnior, o que a mamãe já disse para você centenas de vezes? — minha mãe pergunta, suas mãos na cintura, como fazia comigo quando eu era criança.

— Homens não choram — o pequenino diz, tentando segurar o choro.

Então percebo que a mamãe não mudou, ela continua a mesma. Eu a encaro com seriedade e faço sinal de negação com a cabeça.

— Vamos comer alguma coisa juntos. Ah, Ada e Christopher vão ficar tão felizes em saber que eu a encontrei — diz com um largo sorriso nos lábios.

— Verdade, papai gosta de você — Júnior diz, ainda acariciando o meu rosto. Ele parece não se cansar de fazer isso.

— Eu agradeço o convite, mas já comemos, mãe, e estávamos indo embora.

— Que pena — diz, decepcionada.

Dou de ombros e não digo mais nada. O que mais quero é sair correndo daqui, mas ter meu pequeno Júnior tão perto é algo que deixa o meu coração em paz.

— Você vai lá pra nossa casa, Julha? — pergunta, manhoso.

— Lá não é mais a minha casa, pequeno — digo, acariciando seu rosto antes de dar um beijo em sua bochecha.

— Papai disse que lá é sua casa também, nós somos sua família.

— Papai falou a verdade, meu querido. A Ju é nossa família e lá é o lar dela.

Ele assente com a cabeça, como se entendesse tudo o que estamos dizendo.

Ah, meu querido, as coisas não são tão simples, penso.

— O que acha de ir jantar em casa amanhã à noite? Eu, você, Bruno e Ane? Faremos uma surpresa para a Ada e para o Christopher.

O que ela está querendo com isso?

— Mãe, eu...

— Ótimo. — Antes que eu tenha chance de recusar o convite, Ane me interrompe. — Estaremos lá por volta das oito da noite.

Eu encaro Ane e a fuzilo com o olhar, mas só recebo uma piscadela em sinal de cumplicidade em resposta.

— Seu noivo está na cidade com você? — pergunta, seus olhos em minha grande e grossa aliança no meu dedo anelar.

— Sim, está — afirmo.

Realmente não sei o que ela está querendo com esse convite, mas pelo visto não terei para onde correr.

— Ah, que ótimo. Assim conhecerei pessoalmente o meu futuro genro — diz, dando palminhas na altura do queixo como se essa notícia a deixasse muito feliz.

— Agora temos que ir — digo e dou um abraço apertado em Júnior antes de o colocar no chão e me despedir da minha mãe com um beijo no rosto.

— Espero vocês amanhã. Certo? — ela pergunta diretamente para mim, mas logo em seguida olha para Ane.

Nós assentimos e nos afastamos, seguindo rapidamente para o estacionamento do shopping em total silêncio.

— Isso é loucura. Não devíamos ter aceitado a droga do convite — digo irritada enquanto olho para Ane que está afivelando o cinto de segurança.

— Loucura? — Ela se vira para me encarar com as sobrancelhas franzidas. — Por que loucura? — pergunta um tanto ríspida.

Capítulo Vinte e Três 1

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