Perdição de Vizinho romance Capítulo 35

Se sentindo como uma gota no oceano

Mas ninguém percebe

Talvez tudo esteja apenas na sua cabeça

Se sentindo preso em sua própria pele

E agora seu corpo está congelado

Quebrado, você não tem mais nada

Ok Not To Be Ok - Marshmello

(...)

Justin

Está acontecendo de novo, tudo está desmoronando ao meu redor e, ainda que eu mova uma palha, não conseguirei reverter a situação. Porque as coisas não podem simplesmente serem mais fáceis? Dizem por aí que há um propósito para tudo o que acontece, mas então eu me pergunto: qual o propósito para toda a merda que está acontecendo em minha vida ultimamente? Porque, para mim, não tem lógica.

Suspiro pesadamente, segurando um envelope endereçado pelo hospital municipal de Boston, Massachusetts, em mãos. Há algum tempo, recebi uma proposta da parte do diretor do hospital em que trabalhava em Brasília, eu seria promovido e precisaria mudar toda a minha vida. Isso aconteceu pouco tempo depois da morte da Maria Julia, mas naquela época eu precisava me reconstruir, me reerguer, não havia condição alguma para que eu pensasse em trabalho, tanto que fiquei alguns meses sem exercer minha profissão. Somente voltei quando me senti pronto, foi muito difícil aceitar a ausência dela.

Agora, então, recebi novamente a proposta, é uma excelente oportunidade, mas eu só consigo pensar que terei que ficar longe da Ella, da mulher que me fez renascer, que me fez sentir outra vez o amor. Sei que por uma decisão minha estamos afastados e que estou me sentindo um nada, porém, só o fato de poder vê-la pela janela, de saber que estamos perto, me faz cogitar a ideia de rejeitar ir para Boston. Ao mesmo tempo, lembro-me da última noite em que nos vimos na boate e penso que estarmos perto só esteja causando sofrimento a ambos.

— Então, tem certeza que vai aceitar? — Nando me tira dos meus devaneios.

Sentados nas cadeiras do bar que costumamos frequentar, não consigo parar de pensar.

— Não sei, cara. Estou me sentindo dividido, eu a amo. — olho para ele.

— Se você a ama, porque está sendo tão teimoso? Porque não diz a ela e pede para voltar? Se humilha se necessário, mas você precisa daquela mulher, ela é sua chance de ser feliz. Não precisa escolher entre as duas coisas, pode ter as duas.

Rio nasalmente, sem graça, com a cabeça abaixada e balançando-a para os lados.

— Você tinha que ver a cara dela, Nando. Naquele dia na boate, ela estava arrasada, tentei evitar machucá-la e acabei fazendo exatamente isso. Doeu em mim vê-la daquela maneira, tinha dor nos olhos dela. 

— O que falta pra você ir atrás dessa mulher? Me diz. Não percebe? Você se tornou outro homem ao lado dela, até voltou a sorrir de verdade, voltou a ser aquele bobão apaixonado que vivia suspirando pelos cantos da faculdade pela Maria Julia. — pela primeira vez, consigo ouvir o nome dela sem sentir dor ou qualquer sentimento ruim. 

Pelo contrário, sinto paz.

— Sabe o que é mais engraçado nisso tudo? O que eu sinto por ela é diferente, parece ser ainda mais forte do que o que senti pela Maria Julia, não que eu não a tenha amado de verdade, acho que são sentimentos diferentes, não sei explicar. — percebo que estou sorrindo.

— Aí está a resposta que tanto está procurando, bobão. Olha como sorri quando pensa nela, nem sabia que cê tinha tantos dentes. — ele aponta para mim, me fazendo rir.

— Otário. Acha mesmo que eu deveria investir nessa relação? E se eu não for bom o suficiente para ela? — são dúvidas que ainda me perseguem.

— Olha, irmão — ele inclina o corpo e põe a mão em meu ombro — Infelizmente, nem mesmo eu tenho essas respostas para te dar, o que posso dizer é que não será da noite para o dia que as coisas mudarão, você ainda terá que bater de frente muitas vezes com seus fantasmas, porque a vida costuma nos provar diversas vezes, mas aquela mulher te ama, sei que está disposta a enfrentar o que for preciso ao seu lado, você só precisa se permitir, deixá-la entrar. Deixe que ela mesma decida o que é melhor para si.

Comprimo os lábios, emocionado com suas palavras.

— Não vai chorar aí, que eu choro também, cagão. — seu comentário me faz rir.

Limpo uma lágrima que escapa do meu olho direito.

— Talvez você tenha razão. 

— Talvez não, sei que tenho. Agora vai lá, vai atrás da mulher da sua vida. Não pensa, só age, vai ser feliz, meu amigo. — ele dá dois tapinhas em meu ombro.

Sorrio com seu gesto, em querer me ver bem. Sempre foi assim. Nando e eu somos amigos de infância, estudamos na mesma escola, nos graduamos na mesma faculdade e quando ele viu o meu sofrimento em relação a Maria Julia, sofreu junto comigo, como se ele também tivesse perdido alguém importante. Para falar a verdade, ele perdeu, porque os dois eram muito amigos também, então ele sentiu a ausência dela.

— Obrigado por abrir meus olhos, irmão. Vou agora mesmo até ela, faço até uma serenata se necessário. — falo a última parte em tom de brincadeira.

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