CALIENTE (morro) romance Capítulo 36

- AFRODITE -

Toda felicidade que eu senti quando vi ele entrando pela porta se tornou nula em comparação com a que eu sinto nesse momento .

Os batimentos cardíacos acelerados do grãozinho de arroz sendo mostrado na tela ao lado da maca me faz esquecer tudo de ruim que eu já vivi até agora e uma felicidade que não pode ser descrita de tão intensa me consome como fogo.

Eu estou grávida.

Quando a doutora Julieta entrou na sala e me falou eu não quis acreditar .

" isso é impossível " - pensei.

Bom , parece que o impossível se tornou possível pra mim .

Sorrio , sentindo o toque antes quente da mão dele se tornar tão frio quanto a minha e olhando pra ele pego seu olhar assustado pra tela .

Nunca vi esse olhar nele .

O homem está pálido, perdeu toda a coloração avermelhada do seu rosto e isso me preocupa.

Será que ele não gostou ?

Meu coração dói só de pensar na hipótese , não sei o que faria se ele rejeitasse esse bebê. Seria demais pra mim suportar .

-- Bóris - chamo , minha garganta dói a níveis absurdos sempre que falo mas mesmo assim eu faço , preciso falar , dizer o que eu quero ou não.

Fiquei silenciada por muito tempo .

Julieta - Parabéns , mamãe - ela chama minha atenção, lentamente volto meu olhar pra ela .

Me movimentar e falar é uma tortura. Qualquer mínimo movimento me faz querer chorar mas eu sou forte - ou pelo menos tento - e ignoro a dor .

Brenda - Como minha afilhada está ? - ela pergunta toda felizinha indo pra perto da tela olhando os dados que eu acho que só quem é médico entende.

Jão - Como tú sabe que é menina ? - Brenda faz cara de deboche olhando pro Russo e meu pai sorrir - Entendi , carma de homem safado e ter filha mulher pra sentir na pele o que fez o outro pai sofrer - ele fala rindo , parecendo gostar da idéia.

Ai pai, senti tanta falta disso em você.

Julieta - Então... - ela coça a sobrancelha assim que nossos olhares se encontram - Essa ultrassom só foi feita porque eu precisava ter certeza que o feto tinha batimento devido ao fato de você ter ficado alguns segundos sem pulso - sinto minha mão ser levemente apertada por ele - Você de veras nasceu de novo e aqui dentro outras duas vidas se mantém tão firme quanto ...

Duas vidas ?

Meu mundo se movimenta em câmera lenta e eu não ouço mais nada do que ela diz.

Meu pai pula batendo palmas , abraçando a Brenda que tem a atitude de pular no colo dele e beijar a sua boca de tão feliz que fica , na porta eu vejo meu amigo que eu ainda preciso conversar sorrir , é um sorriso tão puro que só ele sabe dar quando está feliz e ao meu lado ?

Bom , o homem de quase dois metros com olheiras fundas e barba cheirosa mantém uma expressão indecifrável no seu rosto , ele olha fixamente pra tela e eu sinto sua mão trêmula sobre a minha .

Ele está com medo ? Ou será que ele não quer ser pai ?

Eu engulo a saliva com dificuldade , meus olhos e nariz ardendo com o choro que eu nem tento segurar .

Jão - Ei , ei - ele vem rápido pra perto de mim - O que foi minha princesa ? Você não está feliz com a notícia ?

Eu tento falar mas nada sai , de repente é como se eu voltasse pra escuridão em que eu fiquei.

A alegria do momento passa e eu só consigo olhar pra ele , esperando por uma atitude sua que faça ela voltar e então ele solta minha mão levando até seu rosto , esfregando como as pessoas costumam fazer quando estão a ponto de surtar .

Prendo minha respiração quando ele se afasta.

"Não faz isso comigo , Bóris. Por favor não faz" - tento falar , mas minha voz é abafada pelo choro que não tem fim.

Russo dar a volta na maca e se aproxima da tela apontando pras duas manchas em destaque que a médica selecionou pra passar pro papel.

Russo - São dois ? - pergunta , seu semblante sem emoção nenhuma me fazendo sentir uma dor sem igual no peito .

Julieta - Sim , e não é só isso - ela limpa minha barriga cobrindo com o lençol em seguida - Pelo que eu vi , os fetos tem idades gestacionais diferentes . Sendo assim , temos aqui um caso de superfecundação. Muito raro .

Jão - O que é isso ? - meu pai pergunta enquanto tenta inutilmente limpar meu rosto.

Julieta - Simplificando, é quando uma mulher engravida já estando grávida.

Pronto . Todo mundo da sala me olha , a dúvida presente no olhar de todos eles .

Russo - Como tú sabe disso ? - ele pergunta olhando fixamente pra ela , seu tom é tão frio que me faz tremer .

Julieta - Eu acabei de ver - ela aponta pra tela - O feto do lado direito tem em torno de cinco a seis semanas enquanto o outro tem menos , três a quatro.

Abaixo meu olhar fazendo as contas rápidas do tempo e quando tenho a resposta ergo meu olhar encontrando os seus em mim .

Russo - Sai todo mundo daqui. Eu preciso ter um papo com a minha mulher - ele não pede , manda .

Ninguém fala nada , só obedece .

Logo estamos sozinhos dentro da sala que de um momento pro outro se tornou fria , com o ar difícil de ser respirado.

Russo - Um é do fodido do Gam , não é ? - pergunta olhando nos meus olhos , a intensidade acinzentada sem brilho nenhum.

Isso dói tanto .

-- Sim - umedeço meus lábios secos , Russo acompanha meu movimento mas logo desvia respirando fundo e então ergue a mão fechada em punho acertando a pequena tela que raxa com o impacto .

Russo - Desgraçado ! - ele grita me assustando e eu choro ainda mais , levando minhas mãos até minha barriga como se buscasse força ali pra parar .

Russo respira pesadamente olhando pras minhas mãos , vejo seu pomo de Adão movimentar quando ele engole a saliva e se aproxima lentamente de mim com seu olhar que nesse momento eu não reconheço mais.

-- Por favor , não faz nada comigo e nem com meus bebês - peço em meio ao soluço usando toda a força que reuni e ele para .

Cerca de um passo antes de chegar em mim .

Russo - Tú acha que eu seria capaz de  fazer algo contigo ? Ainda mais sabendo que tú tá carregando um filho meu ?

Comentários

Os comentários dos leitores sobre o romance: CALIENTE (morro)