Maysa
No mesmo instante em que a porta se fecha, eu sinto o peso da minha atitude de continuar com a mentira.
Preciso me abrir com ele. Afinal, ele já me deu a minha liberdade.
Mas e se o fato de eu tê-lo enganado o deixe nervoso?
O homem árabe é diferente do homem de outras culturas. Eles são orgulhosos, dominadores, machistas...
Ser enganado por uma mulher?
Allah!
Eu estou tão confusa!
Na cozinha encontro os remédios com a receita, tudo em cima da mesa. Estava observando os horários quando Zafira entra. Ela quando me vê, fala desanimada:
— Said estava pálido de dor quando chegou. Ele aceitou sua ajuda?
—Sim. Você pode chamar Muhafa e pedir para ele colocar minha cama no quarto de Said?
— Vocês dormirão no mesmo quarto?
—Sim, qual é o problema?
—Allah! É contra os princípios!
—Eu não irei dormir na mesma cama que ele. Apenas no mesmo quarto.
Ela me olha em silêncio por um tempo erguendo as sobrancelhas, diz:
—Vou chamar Muhafa.
Eu fui até Salma que estava fazendo o café.
—Salma, arruma uma bandeja com o café de Said. Com sucos, frutas, Kafta, leite. E eu levarei com o remédio.
Ela me encara séria.
—Nunca vi Said tão pálido. Ele sempre foi forte como um touro.
—Ele vai se recuperar, tenho certeza.
Muhafa aparece na cozinha.
—Muhafa, por favor, leve minha cama até o quarto de Said.
Muhafa reage como Zafira, fica sem ação por um tempo, mas sem discutir acena um sim com a cabeça e sai.
Zafira que observava tudo da porta, me fala:
—Você entrou nessa casa, por causa da ira de Said. Começou então a trabalhar na faxina, depois foi para a cozinha, agora age como se fosse à dona da casa.
Essa é fiel ao dono como um cão.
— Zafira. Você mesmo viu a expressão de dor de Said. Ele precisará de cuidados. Entendeu?
—Ah tudo bem! Não está mais aqui quem falou. Mas se a notícia correr que estão dormindo no mesmo quarto, ficará muito mal para você.
Eu não soube o que responder. Eu ficarei no quarto dele, não porque eu quero, mas sim por necessidade.
Quando Salma arruma a bandeja eu a pego e me dirijo ao quarto de Said. Quando entro, o avisto deitado com os olhos fechados, na mesma posição que eu o deixei. A cama que eu pedi está no outro extremo do quarto perto da janela.
Said pressente a minha presença e abre os olhos. Ele me encara sério.
—Quero que chame Zafira e peça para ela reunir todos os empregados aqui no meu quarto.
Eu deixo a bandeja ao lado dele, nos pés da cama e pergunto curiosa:
—Por que quer que todos estejam aqui?
—Você verá.
Vejo os olhos de Said, decididos, penetrantes e firmes.
—Melhor tomar seu café primeiro.
Ele fecha os olhos dizendo:
—Depois eu tomo. Chame todos, agora! —Diz mandão.
—Tudo bem!
Eu saio da presença de Said tentando entender sua atitude. Dez minutos depois todos estão reunidos ao redor da cama de Said. Ele começa a dizer com dificuldade:
— Eu pedi a presença de todos, pois não quero nenhum mal-entendido e nem boatos maldosos. A senhorita... Mahir dormirá aqui, em meu quarto para me assistir, caso eu precise. Por isso, se eu souber que alguém ousou espalhar esse fato por aí, sofrerá consequências. Estamos entendidos? —Said olha todos com um olhar tão duro, parece o diabo no próprio inferno.
Todos assentiram constrangidos.
— Só isso, podem ir.
Eu fico emocionada com a atitude dele. Depois que todos saem eu me aproximo da cama.
—Você ainda se preocupa com a minha imagem.
Said me encara duro. Enigmático. Ele é inconstante. Não parece o mesmo de horas atrás. Eu não consigo ainda transpor essa barreira que ele às vezes cria.
— Você deveria ficar feliz com isso.
—Fico. Mas se fosse na Inglaterra, dormir no mesmo quarto, para cuidar de alguém, não seria um escândalo.
Comentários
Os comentários dos leitores sobre o romance: Em seu lugar
Linda a história!!!!...