Eu observo ele sair do meu quarto, caminhando com dificuldade, se segurando nas paredes.
Eu me sento na minha cama. Como um filme revivo tudo que passei, desde que cheguei à mansão. E chego a conclusão que só quem vivesse na pele o que eu vivi aqui, entenderia que eu não tive condições nenhuma de confessar nada.
Ele foi um juiz implacável e eu uma ré sem defesa. Mas, mesmo assim, a dor que vi nos olhos de Said, surte efeito e me sinto culpada. Além de aumentar minhas dúvidas com relação aos sentimentos dele.
Ele apenas me enxergava como uma empregada. Por que ele estaria então, tão magoado por eu não ter lhe confessado tudo?
Ele está realmente gostando de mim?
Ou seu ego está ferido?
Talvez sim, pois afinal, ele fora enganado por uma mulher.
Mas por que, quando ele descobriu tudo, não me acusou?
Então ele me ama?
Mas se me ama, por que me libertou?
Allah! Tudo é tão confuso!
Enxugo minhas lágrimas.
Não! Não vou chorar! Não mostrarei a ele, o quanto eu estou afetada.
Deito-me na minha cama. Só agora me dei conta que eles arrumaram outra cama para o quarto de Said, e não a minha. Ainda bem, assim eu terei um pouco de privacidade disponível quando eu quiser.
Suspiro com a imagem de Said caminhando com dificuldade.
Não posso ficar aqui deitada! Preciso ver se ele está bem. Se ele chegou bem no quarto.
Vou até o quarto dele. Conforme vou andando pelos corredores, agradeço a Allah por não o ter encontrado caído em algum lugar da casa. Quando finalmente alcanço seu quarto, o avisto deitado na grande cama.
Ele respira com grande dificuldade.
—Said, você se esforçou. Deve estar com dor.
Uma fina camada de suor sobre sua testa.
— Allah! Muita!
— Eu vou te dar mais um comprimido, mas não se acostume, só agora, porque abusou.
Ele não me diz nada. Seus olhos estão apertados e ele respira com dificuldade. Eu encho um copo de água da jarra, pego a caixa no criado-mudo e retiro um comprimido.
Me sento na cama.
— Tome!
Ele abre os olhos e com as mãos trêmulas pega o comprimido da minha mão e o coloca na boca. Eu o ajudo a tomar a água, segurando sua cabeça.
Coloco o copo no criado-mudo. Quando eu estou para me levantar, ele abre os olhos.
—Fique comigo.
Eu passo os olhos por seus volumosos cabelos negros, sua barba estilizada, seus lábios cheios e seus olhos negros pousados em mim. Lindo. Selvagem e ferido.
Ele pega uma de minhas mãos e a leva aos lábios. Beija a palma dela. Estremeço com o contato, me sentindo viva e quente por dentro. Ele não à solta e fica massageando minha mão com seus dedos longos de forma firme e segura.
— Eu não sou um tirano sem coração, como pensa.
Dou a ele um meio-sorriso. Said me observa por mais um tempo, então fecha os olhos.
Ele ainda respira com dificuldade, é normal devido ao seu estado dele. Por causa da minha profissão, eu estou acostumada em ver esses sintomas. Mas é Said ali, o homem que eu amo. É ele que está ali sofrendo. Isso me deixava angustiada.
Eu o admiro em silêncio. Seu nariz reto, a boca bem-feita, o queixo firme e o maxilar anguloso. Passo os olhos por seu corpo grande. Alto. Ele tem o corpo alongado e elegante, ombros largos e músculos definidos.
Suas mãos são grandes, os dedos longos. Deve ser um homem ardente e dominador na cama.
Aos poucos ele vai fechando os olhos e finalmente dorme, dopado tadinho, mas fazer o quê? Sua respiração está mais tranquila. Eu puxo devagar a minha mão da dele e depois de dar uma última olhada na sua figura tão frágil, saio do quarto e me dirijo a cozinha.
Salma, quando me vê entrar, pergunta:
—Said está melhor?
—Sim, está dormindo agora.
—Você não comeu nada. O almoço está pronto. Quer comer agora?
Eu aceno um sim. Preciso comer, mesmo que eu não esteja com vontade. Faço um prato com um ensopado de carne que Salma fez.
Allah! Maravilhoso.
De tão bom, acabo repetindo e acrescentando um pouco de arroz.
— Estava uma delícia.
A velha senhora sorri para mim.
—Essa receita é da minha mãe.
—Quando Said acordar, vou levar para ele.
—Ele adora esse ensopado, fiz por causa dele.
Eu sorrio de leve para ela e saio da cozinha. Vou até meu quarto e entro no banheiro. De frente ao espelho observo meu rosto. Estou abatida.
Suspirando, penteio meus cabelos e faço um rabo de cavalo. Escovo os dentes e me deito na cama. O relógio no criado-mudo marca uma hora. Fecho meus olhos, cansada.
Acordo assustada. Duas e meia da tarde. Me espreguiço, me sentindo ainda cansada, como se tivesse enfrentado uma árdua batalha, o corpo todo doído.
Preciso ver Said, ver se ele está bem e lhe oferecer o almoço.
Depois de acertar meus cabelos em frente ao espelho, encaro meu rosto. Sinto uma falta de me maquiar, das minhas roupas. Hoje pareço que estou sempre com a mesma cara. Sempre a mesma coisa.
Caminho sem pressa até o quarto de Said, na verdade, eu estou uma pilha de nervos. Bem, ao menos agora, Said sabe quem sou, talvez seja mais fácil lidar com ele agora do que antes.
Eu entro no quarto e não o encontro na cama. Ouço o barulho de descarga. Ele sai do banheiro bem descabelado. Nossos olhos se encontram e eu lhe dou um sorriso.
— Não consigo erguer os braços, então não consegui pentear os cabelos.
Eu abro meu sorriso cheio de humor.
— Por que quer pentear os cabelos? Vai à algum lugar?
Ele sorri.
—Não, não vou. Mas mesmo em casa não sou assim, desleixado.
— Deita que eu penteio para você.
Comentários
Os comentários dos leitores sobre o romance: Em seu lugar
Linda a história!!!!...