Lembranças das noites quentes de verão romance Capítulo 114

- Bem, se você acha que a sua vida foi difícil, por não ter um pai presente, imagine ter um que a pôs para fora da casa... Grávida.

Ele sentou-se na cama, surpreso:

- Como assim?

- Foi o que ele fez quando soube que eu estava grávida de Melody.

- Mas... Como teve coragem?

- Porque o pai da criança não era do agrado dele.

- Mas... Medy sempre fala do pai... E você não. Eu... Não entendo. E por que sua mãe estava aqui? Vocês não se veem? O que o Dr. Monaghan tem a ver com você?

- Muitas perguntas, garoto! – Suspirei.

- Não precisa responder se não quiser.

- Mas eu quero... Talvez seja hora de botar tudo para fora...

- Tente... Sou um bom ouvinte.

Eu sorri:

- Fui noiva de Colin Monaghan.

- Eu imaginei que tiveram algo no passado... Pela forma como ele a olhava.

- Ele me traiu, um dia antes do casamento.

- Canalha! Como pôde?

- Quer saber o pior? Foi com a minha irmã.

- Vadia!

Eu ri.

- O que foi? – Ele perguntou.

- Você é engraçado às vezes.

- Ela não foi uma vadia?

- Com todas as letras.

- E o que houve depois?

- Ela me confessou na porta da igreja. Eu entrei, como se nada tivesse acontecido e disse “não” para ele, no altar. Enfim, meu pai queria me matar, minha mãe achou que eu estivesse louca e minha irmã queria que eu passasse por cima de tudo e seguisse com o casamento, dizendo que “nos amávamos”.

- E você sofreu muito?

- Sim... Por uma meia hora. Até procurar outro homem.

- Outro homem? Um qualquer, aleatório?

- Não... Não era um qualquer. Eu o conheci na noite da despedida de solteiro. Mas não traí Colin, como ele fez comigo. No entanto, assim que soube que não casaria, corri para os braços do não tão desconhecido da noite anterior.

- O pai de Melody é Colin... Ou este que você encontrou depois?

- O que encontrei depois.

Ele me olhou, tentando compreender.

- Não tente entender... É complicado.

- Como você chegou ao ponto de criar Melody sozinha? Este também a traiu?

- Não... Eu me apaixonei perdidamente por ele. E acho que isso foi no exato momento que o vi. Mas sabe quando tudo dá errado e o destino passa a perna em você, de uma forma que é até difícil de acreditar? – falei, como que para mim mesma – Foi intenso, foi paixão, foi amor... Mas nos desencontramos, de todas as formas que você possa imaginar, embora nos procurássemos. Fiquei grávida dele. Meu pai não aceitou. Eu venho de uma família muito rica.

- Sei bem como é isso... Ter que fazer coisas que você não quer em nome da família... E da droga que o dinheiro representa para eles.

- Sim... Meu pai me mandou escolher: minha casa ou o bebê.

- Quis... Que você abortasse?

- Sim. E me disse com todas as letras: ou tira a criança ou vai embora. Claro que escolhi minha filha. E fui mandada embora imediatamente... Somente com a roupa do corpo. Não me deixou pegar sequer o celular. – Senti as lágrimas me traindo, parecendo reviver aquele momento.

- Isso foi cruel.

- Eu vim parar aqui por causa da governanta da mansão... Sempre gostei muito dela. Me criou, praticamente. Ela é mãe de Do-Yoon.

- Então o professor Do-Yoon a ajudou... Desde a gravidez de Medy.

- Sim. Ele e sua irmã, Yuna.

Guilherme limpou minhas lágrimas e deitou-se ao meu lado, puxando-me para perto dele, enquanto me abraçava.

Retribui o abraço. Acho que esperei a vida toda para contar o quanto aquilo me magoava e poder chorar por tudo que passei, no colo de alguém.

- Eu sinto muito. E saiba que sua filha é maravilhosa... Eu nunca conheci uma criança como ela. Medy é especial.

- Sim, ela é... E quem perdeu foram eles... Todo o crescimento dela e cada novidade que acontecia a cada dia... O primeiro dente, a primeira palavra, os primeiros passos, o primeiro tombo... – Pus a mão no rosto.

- Com certeza.

- Minha mãe estava aqui... Cinco anos depois... Pedindo que eu passe o Natal com eles.

- Com a sua família? Como se nada tivesse acontecido?

- Exatamente.

- E você vai?

- Medy ouviu parte da conversa... E claro que quer ir. Você sabe como ela é... E fiquei a pensar se era justo eu privar ela desta convivência. Já basta a ausência do pai, que a entristece.

- Você não soube mais nada sobre ele?

- Eu... Soube. Mas enfim, outro desencontro. E acho que estou cansada das trapaças do destino para nos afastar, entende? Tudo deu errado para nós dois, desde sempre. Eu já não acredito mais... Que um dia vá dar certo.

- Eu... Não sei se entendo.

- Ainda assim, eu amo o pai da minha filha, embora não acredite que vá ficar com ele.

Ele ficou em silêncio e senti sua respiração acelerar.

- Me desculpe... Eu... Não quis magoá-lo, Gui. Mas também não quero enganá-lo.

- Pode deixar de gostar dele, já que, como você mesma disse, o destino não os quer juntos.

- Gui, eu fico a imaginar voltar, cinco anos depois, com minha Medy nos braços. Compartilhar com meu pai toda bondade e ingenuidade da minha filha... Depois de tudo que ele fez. Não é muito justo.

- Realmente não. Ele merece uma lição.

Eu ri, enquanto brincava com o dedo no peito dele, nu. Como num dejavu, me vi sobre a cama numa casa de praia, anos atrás, fazendo exatamente aquilo, na mesma posição, com um homem maduro, que mexia com meu pensamento, abalava minhas estruturas e me tinha por completo. Porém o peito dele era um emaranhado de pelos macios.

Retirei minha mão, como se estivesse cometendo um pecado ao tocar outro homem, que não “el cantante”. O que aquele homem fez comigo, afinal?

- Eu já sei uma lição. – Guilherme pegou minha mão, pondo em seu peito novamente.

Senti as batidas do seu coração e respirei fundo:

- Qual lição?

- Me leve junto na festa de Natal... E nós vamos nos vingar do seu querido papai.

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