Lembranças das noites quentes de verão romance Capítulo 132

- Charles, nós precisamos ir. – Falei, levantando.

- Não dá para ficarmos só mais um pouquinho? – Ele me olhou, ainda no chão com nossa filha.

- Não queremos levantar suspeitas, não é mesmo?

- Não? Eu já nem sei... Só de pensar que tenho que fingir que vocês duas não são tudo para mim, já fico puto.

- Charles, por Deus! – Quase gritei.

Ele pôs imediatamente a mão na boca e olhou para Melody:

- Puto quer dizer... Alérgico a água do mar?

Ela começou a rir, balançando a cabeça divertidamente:

- Não quer dizer isso não...

- Caramba, minha filha, o que quer dizer então?

- Eu acho que você deve pesquisar no Google.

- Ei, vocês dois? – ambos me olharam – Não é hora de discutir isso.

- Mas ela mandou eu pesquisar no Google – ele argumentou – Isso não é normal... Ela só tem cinco anos... Eu disse “cinco”. Acho que vou exigir ver a certidão de nascimento.

- Acho que deve exigir mesmo. Porque ela precisa de um certo sobrenome depois do Rockfeller. – Falei.

- Que faço questão, meu amor... Toda questão do mundo que ela seja uma Bailey. – Ele levantou e a pegou no colo.

- Eu vou mudar meu nome? – Ela perguntou.

- Não... Só o sobrenome. Vamos adicionar o do papai?

- Vamos! – ela levantou os braços, feliz – Papai, você está vendo os meus corações saindo? – fingiu pegá-los.

Ele pegou minha mão e fomos caminhando entre as árvores. A chuva havia acalmado, caindo somente alguns poucos pingos. Melody seguia no colo dele, conversando sem parar.

- Qual sua fruta preferida? – Ele perguntou a ela.

- Cacau... Porque dele se faz chocolate.

- Você já comeu cacau? – ele arqueou a sobrancelha – Cacau é uma fruta?

- Papai, você não sabe de nada. Eu vou ter que lhe explicar muitas coisas. Quando vamos morar juntos... Nós três?

Ele apertou minha mão e disse firmemente:

- Logo, meu amor – deu um beijo nela – E eu vou surpreender a sua mamãe.

- Mamãe chora quando é surpreendida com alguma coisa.

- Jura?

- Sim. E a fruta preferida dela é nenhuma. Porque mamãe não come frutas, só chocolate. Mas ela me obriga a comer frutas.

- Isso não é justo.

- Você vai mudar isso, papai?

- Não mesmo. Não vou mudar nada da sua rotina, que mamãe organizou por cinco anos sozinha. Eu vou me inserir na vida de vocês... E prometo tentar não mudar nada.

- Como vamos fazer com a questão dos shows? – perguntei – Melody não pode faltar a escola. Terá que priorizar os finais de semana para as viagens.

- Isso que dizer que vou ter minha família comigo nos shows? – Ele perguntou, virando o rosto na minha direção.

- Bem... Se você não se importar...

Ele parou e me abraçou com força. Melody estava entre nós:

- Sabrina, eu sempre vou querer vocês comigo... E saiba que jamais transpus a barreira imaginária com as fãs... Lembra disso? – Sorriu, os olhos parecendo brilhar ainda mais.

- Lembro... – Toquei seu rosto, tentando entender como conseguiria ficar longe dele, ao mesmo tempo que estava tão próximo de mim.

- Eu...

Ouvimos vozes e puxei Melody do colo dele:

- Vamos fazer como combinamos, ok?

- Combinado. – Melody sorriu, feliz com o fato de estarmos mentindo coletivamente, sendo que o pai fazia parte da situação toda.

- Eu vou indo com ela... Você vai depois. Nunca nos encontramos aqui, “el cantante”. E você não é o amor da minha vida...

- Nem você o meu! De toda a vida...

Dei um passo e ele foi atrás de mim, dando-me um beijo no ombro. Depois encheu Melody de beijos enquanto ela ria sem parar, fechando os olhos.

- Preciso ir... – Falei baixo.

- Amo vocês. – Ele fez questão de dizer.

Enquanto andávamos, Melody deitou a cabeça no meu ombro e eu sentia o bracinho dela se movendo, certa de que acenava para ele.

Não tenho certeza se era justo fazer aquilo com ela... Separá-la do pai mesmo ele estando tão perto. Mas ao mesmo tempo, se assumíssemos nossos sentimentos e abríssemos o jogo sobre tudo que vivemos, jamais saberíamos o que de fato aconteceu naquele dia que Charles foi preso.

Eu tinha perguntas que me incomodavam muito. Mariane ou J.R? Quem armou? Se fosse Mariane, por que teria levado exatamente quatro anos e meio para tirá-lo da prisão? Não teria sentido. Ao mesmo tempo que, se foi meu pai, ele não aceitaria Charles em sua casa, ou mesmo namorando com minha irmã.

E o que minha mãe sabia sobre aquilo tudo? E Gui? Ele sairia muito magoado e isso me entristecia, porque eu gostava dele. Agora de um jeito diferente. Me imaginei dizendo: “Gui, nós não vamos mais ser namorados. A partir de hoje, serei sua madrasta. Perdoe seu pai, mande sua mãe se foder e venha morar com a gente... A cama é grande, cabe nós três.”

Céus, aquilo chegou a me dar calafrios. Se eu tivesse transado com Guilherme não conseguiria olhar na cara de Charles. Ou conseguiria?

- Sabrina? Medy? – Vi meus pais surpresos, enquanto ainda saía da mata.

- Estávamos nos abrigando da chuva. – Tentei explicar.

- Nossa... Vocês estão bem? – J.R aproximou-se, pegando Melody do meu colo.

Melody agarrou-se a ele, que perguntou:

- Por que você fugiu, querida?

Pelo tom de voz e a forma como a olhava, meu pai parecia realmente estar preocupado.

- Eu... – ela me olhou – Queria tomar banho de chuva.

- Mas por que não avisou? Ficamos todos preocupados. Sua mamãe saiu correndo, desesperada – Calissa disse – Não pode mais fazer isso, meu amor. Promete?

Melody assentiu com a cabeça, enquanto Calissa também a abraçava. Os três ficaram juntos e eu de fora. Para mim era claro que estávamos todos naquele lugar por Medy. Eu não significava nada para J.R. Aliás, alguém significava algo para aquele homem? Ele não respeitava nem mesmo a esposa.

Falido! Mas sem perder a pose e a pompa. Aquele era J.R Rockfeller. E eu queria vê-lo implorando perdão... A mim, a Charles, por tê-lo julgado sem ao menos conhecer... E a Medy, por ter sido o responsável por deixá-la grande parte da infância sem pai... Anos que ela e Charles jamais recuperariam.

Comecei a andar sozinha, sob a areia molhada. Deixei a água do mar tocar meus pés. Estava gelada e assim que a senti, meus cortes começaram a arder. Fechei os olhos e aguentei. Tentei pensar numa canção para que meus ouvidos ignorassem o que eles diziam atrás de mim.

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