Lembranças das noites quentes de verão romance Capítulo 151

- Se você foi um bom garoto, creio que sim.

- Você é ridículo.

- Guilherme, não! – Falei seriamente.

Ele me olhou e percebi que estava nervoso. Achei que bater de frente e enfrentá-lo poderia ser pior. E eu não queria que ele dissesse aos demais sobre a paternidade de Charles com relação à Melody, pois não sabia se J.R e Calissa estavam a par da verdade.

- É Natal! – Tentei fazê-lo ao menos ter um pingo de sentimento.

- O nosso primeiro Natal em família... – encarou novamente o pai – Posso apostar que vai querer levar sua linda mulher à nossa casa nas demais datas festivas, afinal, vão querer ver Melody, não é mesmo? – Olhou na direção de Mariane.

- “Nossa casa” quer dizer de você e Sabrina? – Charles pôs as mãos no bolso da jaqueta preta, fingindo desinteresse pela conversa.

- Óbvio que sim. – Respondeu Guilherme.

- Chegou tarde, garoto! Eu e Sabrina já temos “nossa casa”. Mas quero que saiba que sempre haverá lugar para você lá... Independente das coisas que falar para me ferir...

- Você é patético.

Retirei o braço de Guilherme do meu ombro e subi as escadas, deixando os dois para trás.

Quase corri em direção ao quarto e assim que abri a porta, retirei o presente do bolso. Ri sozinha quando deparei-me com um teste de gravidez.

Fui até o banheiro e levantei com dificuldade o vestido com excesso de tecido. Bastava urinar sobre o objeto e saberia se estava grávida ou não. Embora eu sentisse no meu corpo que tudo estava mudando, não tinha certeza absoluta.

Dois minutos depois e vi os dois traços, confirmando que tinha mesmo um bebê dentro de mim... Fruto de uma noite num show de um cantor que compôs uma música para mim.

Balancei a cabeça, rindo de mim mesma... Fui até aquele show para contar a Charles que ele tinha uma filha, gerada naquelas noites de verão na “nossa casa” de praia. No entanto saí de lá carregando outro bebê dele no ventre. E quando ele soube de Melody, junto recebeu a notícia da possível nova gravidez.

Pus o teste no bolso da jaqueta e desci, sem conseguir conter o sorriso no meu rosto.

Charles estava com Melody sentado no sofá, com Mariane tentando encontrar um espaço junto deles. Guilherme conversava com meu pai e não consegui decifrar se era algo bom ou ruim. Minha mãe olhava pela janela, parecendo longe. Yuna estava ao telefone.

Fui até Calissa e tentei acompanhar seu olhar, tentando ver algo dentro da escuridão da noite, fora do vidro da janela.

- Onde está seu pensamento? – Perguntei, de forma delicada.

- Infelizmente aqui... Tentando entrar na mente de todos e desvendar o que está acontecendo.

- Mamãe, acho que você é a única que não sabe... Mas vai saber em breve. Só não tenho certeza se isso é bom ou ruim.

- Por vezes me acho uma sortuda por não saber de algumas coisas.

- Com certeza. – A abracei por trás, sentindo o cheiro do seu perfume caro e de bom gosto.

Calissa Rockfeller não era uma pessoa que eu admirava. Mas a amava. Não via maldade nela, por mais que tentasse. Havia grandes chances de ela não saber nada sobre a prisão de Charles, mesmo apostando que ele poderia ser o pai de Melody.

Um dos garçons me ofereceu uma taça de Champagne, que peguei. A Vueve Cliqcuot sempre foi minha bebida favorita.

- Acho que não deve beber isso... – Vi Charles ao meu lado, retirando a taça da minha mão.

Olhei-o confusa. Minha mãe nos observou e sorriu, balançando a cabeça:

- Afinal, Charlie B., qual das minhas filhas lhe interessa de verdade?

- Uma... – ele me olhou, confessando – Sempre foi uma só, Calissa.

- Eu sabia. – Ela me olhou, saindo, puxando Mariane, que tentava aproximar-se novamente.

Pus, sem ele perceber, o exame de volta no bolso dele e falei, enquanto olhava para os demais, fingindo estarmos conversando sobre algo sem importância:

- Tenho um presente para você, “el cantante”. Está no bolso da sua jaqueta.

- Como pensou em beber, devo imaginar que seja “negativo”?

Sorri e saí, olhando para trás, fazendo mistério:

- Talvez...

POV CHARLES

Claro que eu não conseguiria esperar um minuto sequer para ver o resultado do exame. Imediatamente me afastei, virando-me para a entrada da sala de jantar, retirando o “presente” do bolso. Tinha duas listras. Sabrina estava grávida.

Senti meu coração bater tão forte que podia ver o movimento dele do lado de fora do meu peito. Um calor invadiu meu corpo, inexplicável.

Virei-me e a olhei. Ela estava me observando, enquanto sorria. Não tenho certeza da minha reação... Ou sequer se sorria de volta para ela.

Quando eu soube que Kelly estava grávida, fiquei sem chão. E se dissesse que fiquei feliz, estaria mentindo. Eu tinha dezesseis anos. Foi um choque, tanto para mim, quanto para ela. Nunca nos passou pela cabeça não ficar com a criança, por mais jovens que fôssemos. Mas também não achei que Kelly me abandonaria ao longo do caminho, na nossa tarefa de “pais” adolescentes. Ela priorizou a vida dela. Eu a do menino, que era sangue do meu sangue, minha responsabilidade, afinal, não pediu para vir ao mundo. O meu filho, que apesar de tudo, eu tinha orgulho quando o mencionava.

Saber que Sabrina me daria outro filho era simplesmente inexplicável. Uma criança que eu acompanharia, com certeza, desde o desenvolvimento na barriga dela até o resto da vida. Eu sentia tanto amor dentro de mim que não tinha como descrever.

Nunca fui o tipo de homem que acreditou no amor. Assumi minha responsabilidade frente à gravidez inesperada de Kelly na adolescência e depois eu só pensei em não ter mais filhos. Demorei um tempo a me envolver com outras mulheres, devido a estar constantemente com Guilherme, que exigia minha total atenção. Depois que ele foi morar comigo, era impossível, pois eu não tinha tempo para nada. Dava umas rapidinhas somente com o objetivo de me satisfazer.

Claro que o tempo passou e depois que perdi a guarda de Guilherme, minha vida passou a ser exclusivamente em bares e boates cantando. Eu poderia ter qualquer mulher que quisesse e escolhia minhas preferidas. Mas nunca consegui me envolver emocionalmente com nenhuma. Simplesmente porque não acreditava em sentimentos que fossem além do sexo.

Passei grande parte da minha vida sendo recriminado por engravidar uma adolescente. Nunca ninguém olhou para o meu lado de garoto de dezesseis anos. Eu não sabia porra nenhuma da vida. Era tão pirralho quanto Kelly.

Mas quando vi aquela garota com véu na cabeça, tropeçando na minha frente, um sorriso tímido, os olhos fixos nos meus, pele macia, cabelos negros que brilhavam tanto que ofuscavam minha visão, cheiro de perfume caro, delicada, envolvente, com um mundo todo pela frente e tentando acabar-se num casamento no dia seguinte... Eu soube que era ela.

Sempre fui bom na arte de ter mulheres a meus pés. Mas estar realmente interessado numa era complicado... E me deixou muito inseguro. Talvez por este motivo eu não consegui esconder meus sentimentos por ela em momento algum. Porque parecia que o amor que eu tinha por ela estava escrito nos meus olhos.

Ela tinha me dado a filha mais linda do mundo, a menina inteligente, com voz doce, sorriso cativante, tão cheia de carinho, que eu nem sabia se merecia tudo aquilo, já que não estive presente na vida delas por tantos anos.

Sabrina poderia ter seguido sua vida sem mim. Eu sumi por longos anos. Ela não sabia nada sobre meu paradeiro. Ainda assim nunca desistiu de me encontrar.

Melody sempre soube que eu era o seu pai, mesmo nunca tendo me visto. E a mãe alertou-a desde sempre que um dia nos reencontraríamos e ela seria apresentada a mim, que a amaria intensamente.

E tudo que ela planejou e prometeu para nossa filha aconteceu. Eu não imaginava um melhor encontro do que o que eu tive com Melody naquela manhã na praia. E minha conexão com a menininha de olhos verdes grandes e brilhantes foi tão intensa quanto a que eu tive com a mãe dela, muitos anos antes.

Não sei se elas sabiam, mas eu era capaz de matar e morrer pelas duas. Agora pelas três... Ou talvez fosse um menino.

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