Charles segurou-me pelos ombros e disse:
- Sabrina, por favor, vamos viver este momento. Esqueça estas coisas, ao menos por enquanto... Algumas horas apenas, pode ser?
Respirei fundo, tentando acalmar a raiva que existia dentro de mim:
- Vou tentar.
- Não esqueça que está grávida. Precisa ter uma gestação tranquila.
- Tem razão... Já foi tudo muito conturbado com Melody.
Charles me abraçou:
- Venha, vamos alcançá-las e ver os quartos que elas escolheram.
Enquanto subíamos as escadas, percebi que tudo estava do mesmo jeito que deixamos, anos atrás.
Quando abri a porta do quarto onde ficamos, que me trazia tantas lembranças, vi Melody parada, olhando o mar pela sacada. Meu coração quase explodiu de tanta emoção. Passou um filme na minha cabeça, de tudo que aconteceu naquele lugar. Eu era uma adolescente, de 18 anos, e já sabia exatamente o que queria: o cantor do bar.
Charles apertou minha mão e fomos até ela, surpreendendo-a enquanto observava tudo à sua frente, silenciosamente.
- Mamãe... Papai? – ela nos encontrou, sorrindo – O mar está tão pertinho... Será que dá para ouvir o som dele à noite, do meu quarto?
A peguei no colo, Charles retirando-a de mim logo em seguida:
- Sabrina, ela é muito pesada... Deve pegá-la só quando estiver sentada.
- Antes de ter certeza que estava grávida, eu a pegava no colo todos os dias... – Reclamei.
Ela riu e tentou piscar para nós, fazendo-nos gargalhar.
- Quer saber? Sim, dá para ouvir o som do mar em qualquer quarto que você escolher. E ele é como uma canção de ninar. – Expliquei.
- Eu gostei daqui. – Ela abriu os braços, sentindo o vento enquanto abria a boca para apará-lo.
- Vamos morar aqui? – Perguntei.
- Se aceitar dividir a casa comigo, sim.
- É claro que eu aceito, Charles. Vamos ficar aqui, juntos, como uma família... Como sempre deveria ter sido, se não fosse... – minha voz embargou de emoção – Eu não sei o que acontece com as pessoas... Não consigo entender.
- Não tente, meu amor. – Ele me abraçou, junto da nossa filha.
Olhei pelo ombro dele e observei Yuna na porta, parada, confusa, parecendo deslocada. Abri o braço e ela veio até nós, aceitando o abraço coletivo, fingindo não se importar ou emocionar-se com o gesto.
- Yuna, quero que fique morando conosco. – Charles convidou.
- Não... Eu não posso. E não quero atrapalhar. Vocês já ficaram tempo suficiente separados. Esta casa é de vocês quatro. Eu sequer pertenço a este país...
- Também não pertence à Noriah Sul, não é mesmo? E ainda assim vive lá, como se fosse o seu lar.
- Não quero atrapalhar. Não estou acostumada com isso. Gosto do meu espaço, das minhas coisas...
- Terá o seu espaço, Yuna. Há quatro quartos na casa. Poderá escolher o seu. – Charles insistiu.
- Não, Charles, obrigada. Fico feliz que pense em mim, assim como Sabrina. Mas no momento o que desejo fazer é voltar para casa e abrir meu consultório, conforme planejamos... Seguirei o plano, agora sem a minha amiga. Mas sei que ela está em boas mãos.
- Não quero que você vá... – Falei.
- Sabe que preciso, Sabrina.
- Não... Você não precisa. Você “quer” ir e isso é diferente de “precisar ir”. Yuna, você não sobra aqui. Faz parte desta família.
Melody deu os braços para ela, que a pegou no colo, sorrindo:
- Às vezes eu acho que você ganha mais colo que muitos bebês por aí.
- É que eu sou muito fofa, tia Yuna.
- E pouco convencida, não é mesmo? – Yuna deu um beijo no nariz dela, que gargalhou.
- Você é minha família também, tia Yuna... E Do-Yoon, e Lianna... E solitário II, e Tuga e Solitário I e Hamster... E Gui – ela olhou para mim, confusa – A mãe de Gui também é minha família?
- Não! – falei imediatamente – Não é nada nossa.
- Nossa família está aumentando, não é mesmo, mamãe?
- Sim... – Sorri, confirmando.
- Podemos tirar tia Mariane da lista da nossa família? Eu não gosto dela com meu papai.
- Podemos sim... Já até risquei ela da lista. E já faz um bom tempo. – Confessei.
Yuna riu:
- Melody, eu amo tanto você, pequena. Vou sentir falta... Mas da sua mamãe, não muito. – Me olhou, com o semblante emocionado.
- Eu... Vou organizar algumas coisas... E pagar o táxi – Charles disse – Assim vocês podem conversar melhor.
Ele saiu e Melody balançou as perninhas, descendo do colo de Yuna e correndo atrás do pai.
Fechei a porta e peguei o celular, ligando.
- Para quem está ligando? – Yuna perguntou.
- Colin.
- O quê? – Ela ficou apavorada.
Não demorou muito para eu ouvir a voz dele do outro lado da linha:
- Alô.
- Olá, Colin... Sou eu...
- Sabrina? – Ele pareceu surpreso.
- Sim.
- O que... Você quer comigo?
- Eu gostaria de falar com você, pessoalmente. Será que é possível?
- Claro, sim... Claro. Onde e quando você quiser. Quem sabe vem na minha casa? Meus pais sempre falam em você e...
- Amanhã, às 17 horas, na praia que você me encontrou naquela noite... Tem um posto de gasolina mais à frente, acho que o único na cidade. Estarei esperando você lá.
- Estarei lá... Ansioso.
- Colin, eu não quero reatar. – Deixei claro, arqueando a sobrancelha, temendo que ele pensasse que era um possível convite para voltarmos a nos relacionar.
- Sim, eu sei. – Falou, não me convencendo.
- Até amanhã.
- Até amanhã, Sabrina.
Desliguei o telefone e Yuna perguntou:
- Você está louca?
- Preciso falar com ele. Colin é um ótimo advogado. Sempre foi, mas agora ele é conhecido e requisitado. Aposto que conhece todos os juízes. Ele sempre foi muito focado e dedicado.
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