Lembranças das noites quentes de verão romance Capítulo 70

A semana que se passou foi difícil. Lavar louça era bom, desde que não fosse todos os dias. Fiquei enjoada de esfregar pratos e ao final a brincadeira de serem pessoas na fila do banho já nem deu tão certo, porque elas já não queriam mais tomar banho; pelo contrário, fugiam. Tentei cozinhar, mas definitivamente não tinha habilidade. Optei por não estender a minha cama, pois não fazia sentido, visto que deitaria logo em seguida. Por que se dar ao trabalho de arrumar se logo desarrumaria?

Aprendi a usar a máquina de lavar e precisava liga-la diariamente, já que não tinha muitas opções de roupas. A praça com playground no centro de Noriah virou um dos meus lugares favoritos. Passei a ler debaixo das árvores durante as tardes. Yuna tinha muitos livros que falavam sobre crianças, gestação e fases de desenvolvimento a partir do nascimento.

Numa noite, enquanto eu recolhia os pratos, Yuna disse, antes de sair:

- Já dá para notar sua barriga.

- Obrigada.

- Não é um elogio. – Ela enrugou a testa.

Fiquei em silêncio, não entendendo a ofensa gratuita.

Assim que abri a torneira, ela perguntou:

- Já decidiu se quer parto normal ou cesariana?

- Li que o parto normal é melhor para o bebê.

- Se for uma gravidez sem riscos, sim.

- Melody tem sido tranquila até agora. – Sorri.

- Por que você insiste em chamá-la de Melody, se não sabe o sexo ao certo?

- Sinto que é “ela”... Na verdade, tenho certeza.

- E se for um menino?

- Vou ter que me conformar. Mas Charles... – olhei para ela, lembrando que poderia dizer o nome, sem arriscar a vida dele – Charles é o pai dela. Bem, ele já tem um menino. Então eu creio que seja a menina agora... Para que ele tenha um casal.

- Acha que vai reencontrá-lo um dia?

- Eu sinto que sim... Do fundo do meu coração.

- Não acha que poderia ter tentado mais?

- Às vezes sinto que sim... Mas sabe quanto tudo dá errado? Foi assim. Infelizmente eu tive que fazer uma escolha... E escolhi nossa filha. E acabei aqui... Muito, muito longe dele.

- Mas se o filho dele mora em Noriah Sul, talvez vocês se cruzem por aí, se for o destino.

- A questão é que ele não vê o filho. Então é praticamente impossível.

- Por que o nome Melody?

- Melody vem de Melodia. Charles é músico... Compõe, canta... E ele dizia que o som que eu emitia... – não dei maiores detalhes do que eram os sons - Era a melodia preferida dele. Melody é a nossa melodia.

- Boa noite, Sabrina. Você é estranha. – Ela disse, saindo.

- Você também é estranha... Muito estranha. – Falei em voz alta.

Uma mulher bonita, que trabalhava o dia inteiro e quando chegava em casa se enfiava nos livros, para dormir e fazer exatamente a mesma coisa no dia seguinte. Havia vida fora daquele cubículo para ela?

Do-Yoon também trabalhava bastante. E sempre levava tarefas para casa. Eu ajudei a corrigir alguns trabalhos dos alunos dele numa noite. Ele era agradável e gentil.

Despertei com o som dos movimentos de Yuna no quarto. Abri os olhos e a observei enquanto pegava a bolsa. Ela me olhou:

- Bom dia, senhora lavadora de louças e que não arruma a própria cama.

- Bom dia, senhora que acorda implicando comigo. – Virei para o outro lado.

- Eu deixei sobre a cama o endereço de uma clínica. Fica no centro de Noriah Sul. Quero que consulte com um médico e inicie o pré-natal. Tem também um laboratório no mesmo espaço. Eles fazem exame de sexagem fetal. Tanto a consulta quanto o exame estão pagos.

Sentei, escorando-me na cabeceira:

- Não tenho documentos.

- Tem sim. Minha mãe deixou tudo na sua gaveta, ao lado da cama, na última vez que veio. Mas você não se deu ao trabalho de limpar, então não viu.

- Por que fez isso?

- Porque sou médica e quero que tenha uma gravidez tranquila e a criança nasça com saúde. E não quero me acostumar a chamá-la de Melody caso ela seja um menino.

- Obrigada.

- E só para constar: vou ser a Pediatra dela.

- Dela? Achei que você não concordava muito com o fato de eu achar que é menina.

- Para ver como estou confusa com sua loucura. Faça logo este exame antes que eu me contagie por completo. E caso não tenha deixado claro, não gosto de ser contagiada.

Naquele dia peguei o resultado do exame de sexagem fetal e depois fui para a praça, esperar o sol se pôr, enquanto lia um livro sobre o desenvolvimento infantil até um ano de idade.

Quando cheguei em casa, Yuna estava olhando televisão enquanto Do-Yoon cozinhava.

Fechei a porta e disse:

- Você assiste televisão? Pensei que isso aí nem funcionava. – Ironizei.

- Falta do que fazer. – Ela disse.

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