Perigoso (Letal - Vol.2) romance Capítulo 2

“Pa' este baile no hay salida, que corra el tiempo

Pégate y zumba conmigo con movimiento

Pa' este baile no hay salida, que corra el tiempo

Pégate y zumba conmigo con movimiento, con movimiento

Dom Omar”

A Música na rua estava alta, o sol estava de rachar a testa me fazendo suar, e a fome estava de colar o estômago nas costas. Dom estava sendo legal, arrumou marmitas para o primeiro dia e falava espanhol muito bem. Já eu, olhava com cara de bolacha torta toda vez que alguém sorria e enrolava a língua.

Eu vou me acostumar, era o que eu dizia pra mim mesma.

Abri a janela de madeira pesada no apartamento velho, olhei as pinturas coloridas do lado de fora, o varal improvisado e a turma da “correria”. Eu estava em outro país, esperando a poeira baixar e tentando me convencer de que isso ia realmente acontecer, mesmo que eu ainda suspire lembrando do seu rosto cicatrizado a cada segundo de minha vida.

Iron. Era pra gente estar juntos, aqui, recomeçando. Fingindo que estava tudo bem…

— Está tudo bem? — perguntou Dom ao me ver parada, com o olhar distante na janela.

— É uma vista até que bonita. — tentei disfarçar.

— Tem uma grande porcentagem de refugiados por aqui, estão ou podem estar na mesma situação que a nossa.

— Refugiados… — murmurei pensativa — Você já esteve aqui?

— Iron tem, tinha, assuntos preparados para sempre ter um plano B. — ele engoliu em seco esperando minha reação. — Negócios.

Eu não respondi. Não tinha o que responder. O Filho da puta só não tinha um plano “B” pro irmão. Ele não saiu daquele prédio, ele foi anunciado como morto e sua morte “original” virou noticiário na TV. Me lembro com calafrios no peito os carros de Ronn chegando quando tiraram a gente daquele carro. O Mafioso e cafetão de Sore, enquanto John ainda agonizava sobre os cacos do carro, nos salvava daquele dia infernal. Tínhamos que correr, tínhamos que fugir e o deixamos para trás.

Eu fui me abaixando aos poucos na parede, encostei a bunda do chão enquanto Dom fez o mesmo, abrimos o alumínio das marmitas, o cheiro de frango invadiu minhas narinas e eu tentei me concentrar em alguma outra coisa que não fosse Iron. Era impossível, eu sei, eu só não queria bancar a maria chorona pra Dom.

— Eu vou pegar a grana. — contou entre algumas garfadas silenciosas — O processo é complicado, não é tão simple pegar dinheiro sujo assim, mas tem jeito.

— Você vai roubar um banco? — perguntei curiosa e meio desconfiada.

— Não vai ser necessário. — respondeu sorrindo de lado e enchendo a boca, falando na maior falta educação, tranquilamente — Você lembra, não lembra, daquele dia na van? O dia em…

— O dia em que não me mataram no prédio? — interrompi meio grossa — Lembro sim. Lembro do banco e o carregamento com uma pilha de dinheiro. E veja se engole antes de falar.

Ele guardou o sorriso, voltou a se concentrar na comida, esperou que o silêncio ficasse mais calmo e voltou a falar, de boca menos cheia.

— Aquele dinheiro circula em alguns países estratégicos. Eu cuidava dessa parte. Iron pegava os serviços mais pesados, por tanto, os mais caros. Precisamos de grana pra sobreviver, adaptar e vamos bolar um plano “B”.

Eu não falei nada. Não tinha o que falar. Se Iron ao menos estivesse vivo, eu poderia soltar alguns cachorros sobre minha falsa moralidade, já que quando tive oportunidade de ir embora, eu resolvi cantar que estava “apaixonada pelo criminoso”. No caso, Dom, só estava tentando ser legal.

— E como vai ser? — perguntei por fim, deixando o homem mais calmo — Seu ombro ainda dói.

— É um trampo tranquilo, só vou arrumar um pessoal e fazer o procedimento com calma. — contou numa boa.

— Arrumar um pessoal, do tipo fazer um grupo novo de mercenários?

— Com certeza não. — ele voltou a sorrir — Só… Espere. E para de fingir que está tudo bem, eu não sou ottário.

Eu não discuti.

[...]

Quando fiquei sozinha, a primeira coisa que fiz no apartamento pequeno foi deitar no colchão improvisado e olhar para o teto. Eu voltei a chorar. Nem precisava mais mencionar o inchaço dos beiços grandes me fazendo parecer uma boqueteira sem juízo, e os olhos vermelhos cheios de água. Era a visão do inferno, mas era tudo o que eu conseguia ser. Me encolhi, me abracei e coloquei a mão na barriga.

Eu ainda não estava preparada pra fazer um teste, de jeito nenhum. Mal conseguia parar de chorar por causa de um idiota medito a atirador, imagina se eu confirmar que tem uma parte dele dentro de mim. Não, eu não ia fazer isso agora, de jeito nenhum. Ainda estou no começo do meu luto, vou chorar primeiro e descobrir o que vou fazer depois.

Uma hora eu vou fazer isso, vou ter que fazer. Até lá, vou deixar meu rosto inchado de choro, porque nesse momento era tudo o que eu precisava fazer. Chorar.

[...]

Era uma gritaria infernal. A feira era um misto de gritos, línguas que eu não entendia e minha cabeça estava totalmente zonza e perdida. Eu tentava de algum modo me adaptar, já que eu teria de forçar a minha cabeça a aprender o idioma ou estaria ferrada.

— Eu vou levar essas beterrabas aqui. — falei pro homem que me olhou com cara torta — Beterraba. — repeti no meio do barulho.

— Remolacha. — respondeu ele, confuso.

Comentários

Os comentários dos leitores sobre o romance: Perigoso (Letal - Vol.2)