Olhei em volta e só então percebi que a rua estava mais quieta do que o normal. A loja do lado da nossa cafeteria também estava com uma placa de 'fechado' pendurada na porta. Muitos outros edifícios pareciam estar desertos. Levou apenas um dia para o lugar todo piorar.
“Vamos achar empregos melhores, Caro”, disse Nadia, me puxando para o estacionamento, onde seu carro estava estacionado. Era o velho Toyota do pai dela que ele a deu quando ela se mudou para Nova York.
"Acho que não. Demorou muito pra convencer meu papai a me deixar trabalhar aqui. Ele vai me dizer pra trabalhar na empresa dele ou não trabalhar”, eu disse a ela, já temendo a conversa que eu teria de ter com ele. “Você, por outro lado, vai arrasar na entrevista e conseguir o emprego dos seus sonhos.”
Há apenas um mês, Nadia se candidatou a um emprego na Johnson Technologies. Sempre me surpreendi com suas habilidades excepcionais com o computador e fiquei feliz quando ela me contou que finalmente faria bom uso delas. Ela recebeu a chamada para fazer uma entrevista apenas alguns dias atrás.
“Posso tentar convencer seu pai”, Nadia se voluntariou com tanto entusiasmo que me fez rir. Por mais que ela os odiasse, ela adorava interagir com eles. A interação geralmente envolvia ela brigando com eles por causa do comportamento deles, eles retrucando com ameaças e ela tendo a última palavra, inevitavelmente, desconsiderando todas as ameaças como se ela nunca as tivesse ouvido em primeiro lugar. No entanto, meu pai era um homem engenhoso e poderoso, que poderia causar muitos danos à vida e à carreira dela. Como ela não se preocupava com a própria segurança, sempre cabia a mim mantê-la longe deles.
“Não precisa fazer isso, Nadia”, eu disse, entrando no carro.
“Além disso, trabalhar pra Johnson Tech não é o emprego dos meus sonhos.”
Não é? Sempre achei que ela queria criar softwares em uma empresa boa: “Então, qual é?”
“Eu vou te contar quando finalmente o alcançar”, ela disse, mostrando-me um sorriso radiante, “por que você não trouxe seu carro?”
Essa pergunta me enviou a uma viagem muito embaraçosa e lamentável pela estrada da memória. Mesmo com tanta coisa acontecendo ao meu redor desde aquele incidente, as memórias do dia anterior ainda estavam frescas na minha cabeça. Se eu pudesse voltar no tempo, eu daria um soco em mim mesma por ser uma idiota.
“Te conto no caminho”, suspirei. Nadia provavelmente ficaria com raiva de mim pelo que fiz, mas eu precisava compartilhar com ela. “A propósito, pra onde estamos indo?”
“Vamos tomar café e reclamar das nossas vidas”, disse ela com um sorriso.
"Parece um ótimo plano."
Nas horas seguintes, Nadia e eu ficamos andando pela cidade, sem fazer nada em particular, apenas comemorando nosso primeiro dia como desempregadas. Estávamos sentadas em uma lanchonete pequena — que frequento desde criança — quando contei a ela sobre o meu acidente de carro no dia anterior.
No começo, ela não acreditou, alegando que minhas ações do dia anterior não combinavam comigo, aquilo era algo que eu nunca faria. Eu tive que confirmar duas vezes para acreditar que eu realmente tinha batido no carro de um estranho e, em vez de me desculpar, joguei dinheiro na cara dele.
Nadia suspirou bem alto com isso. Eu já esperava esse tipo de reação e estava esperando que ela me repreendesse por minhas ações, mas, em vez disso, ela parou de mastigar suas batatas fritas e recostou-se na cadeira completamente decepcionada.
Segundos depois, descobri que ela não estava decepcionada comigo, e sim com ela mesma, por ter perdido esse acontecimento 'histórico' por causa uma festa de aniversário idiota. Eu tive que lembrá-la que a 'festa de aniversário idiota' era dela, mas o olhar desanimado em seu rosto não mudou.
Depois do almoço, fomos pegar as joias da Lahaina. Nadia estava particularmente animada por poder me acompanhar, pois queria ver a cena do crime por si mesma. Nunca nesses três anos de amizade a vi mais animada do que agora.
Chegando em casa, fui direto até a Lahaina para entregar as joias preciosas. "Você chegou cedo", ela comentou, pegando as caixas e abrindo-as para verificar se as joias ainda estavam lá, ilesas.
"Seu Aaron comprou toda a área", eu disse. 'Comprou toda a área', repeti a frase na minha cabeça e dei uma risadinha. Parecia ridículo quando falado em voz alta e ainda mais absurdo quando repetido na minha cabeça.
Qual é a sensação de acordar de manhã um dia e decidir aleatoriamente e simplesmente comprar uma área inteira? Isso era muito poder e autoridade. Algo que eu não tenho a intenção de experimentar nunca e também não quero me associar a alguém que tenha esse tipo de influência. Pela atenção repentina ao que eu disse e o brilho nos olhos da minha meia-irmã, ficou evidente que a Lahaina estava ansiosa por isso.
“Ele estava lá? Você o viu?", ela perguntou, desconsiderando as joias como se elas nunca tivessem importado para ela desde o começo.
"Não. Ele não estava lá”, eu disse e, instantaneamente, ela perdeu o interesse em mim. Com o trabalho feito e nada mais para falar, eu estava prestes a sair dali quando a Lahaina falou novamente, olhando-me pelo espelho:
“Vista-se bem!”, ela disse, mas parecia mais uma ordem, “não queremos que as pessoas de lá pensem que levamos nossa empregada, não concorda?”, ela sorriu sarcasticamente.
"Vou tentar", respondi com um sorriso semelhante.
"Foi isso que você falou pro espelho?", Nadia perguntou, chamando a atenção da Lahaina para ela.
"Você não pode falar na minha casa, garota do café", Lahaina disse para Nadia, depois me deu uma olhada e disse: "foi ela quem comprou esse vestido pra você? Porque isso explicaria muita coisa."
Era um vestido turquesa lindo que abraçava meu corpo até a cintura e, depois, caía até o chão em uma onda elegante. O espartilho e as mangas, ambos de renda, davam um ar etéreo. Eu me apaixonei por esse vestido no instante em que a Nadia o mostrou para mim.
"Explicar exatamente o quê?", perguntou Nadia. Se eu não a conhecesse bem, pensaria que era uma pergunta séria para a qual ela queria uma resposta. "Que você não tem amigas pra te emprestar roupas bonitas? Ou só que você não tem amigas mesmo?"
Lahaina olhou para ela com uma raiva gigantesca. Em vez de falar olhando para a Nadia, ela se virou para mim: “você não deveria se relacionar com pessoas de classe baixa como ela. São má influência."
Ao contrário do que a Lahaina acreditava, nunca conheci uma pessoa de classe alta que não fosse um pirralho ou uma pirralha mimada. O dinheiro influencia as pessoas da pior maneira possível e, às vezes, não importa o quanto se tente, uma vez que as pessoas adquirem riqueza, elas passam a ignorar o sofrimento dos outros, assim como meu próprio pai. Ele nunca foi um pai ideal para mim, mas foi a ganância por dinheiro que fez dele a pessoa que é hoje.
Eu não ia responder a Lahaina, mas a Nadia — sempre querendo dar a última palavra — tinha um plano diferente. “Eu diria o mesmo de você, Lahaina, mas, infelizmente, ela é sua parente, então se livrar de você é meio difícil. Embora eu consiga arranjar um jeito”, Nadia sorriu para si mesma quando disse a última parte, e isso me fez imaginar o que ela quis dizer.
Lahaina estava furiosa e minha adorável amiga não deu a mínima atenção para isso. Em vez disso, ela se virou para mim e me deu um abraço. “Divirta-se”, ela disse com um sorriso e, “não encha o saco dela”, alertou para minha meia-irmã.
Eu segui a Nadia para fora de casa, onde um carro estava esperando para levar a Lahaina e eu até o local da reunião. Ao entrar, tive que esperar quase dez minutos para a Lahaina se juntar a mim. A viagem foi silenciosa, mas o clima dentro do carro estava tenso, devido ao mau humor da Lahaina depois da interação dela com a minha amiga.
Olhei para as ruas movimentadas, inundadas com luzes coloridas, perdida em meus próprios pensamentos. Como vou sobreviver à essa noite? Não tinha ninguém que eu conhecesse lá. Minha família pensava completamente diferente, mas só a ideia de passar horas entre os altos executivos e empresários excessivamente bem-sucedidos, sentada sozinha e tomando uma bebida me dava vontade de pular do carro.
Quando chegamos no destino, eu me repreendi por não ter realmente pulado. O local estava cercado de repórteres e jornalistas, alinhados do lado de fora da entrada. Respirei fundo e desci do carro, logo atrás da Lahaina.
O evento noturno ainda não tinha começado e eu já queria que acabasse.

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