INDECENTE DESEJO romance Capítulo 41

Dallas, Texas.

Leio o destino da passagem novamente, olhando de soslaio para a mulher que me trouxe ao mundo, ela está sonolenta, possui um olhar perdido e está silenciosa desde que saímos de casa. Não houve discussão quando papai informou que nós duas estaríamos viajando ainda hoje para outro país, tudo que houve foi uma longa troca de olhares entre eles. Nenhum protesto ou batalha, apenas aceitação. Ela parece devastada, na verdade, quebrada no sentido poético da palavra. Perdida em seus próprios pensamentos, incapaz de opinar sobre nossa viagem ou qualquer coisa minimamente relevante. Isso tá me deixando puta da vida.

— Aqui, muito obrigado. — Viro o rosto na direção de Pedro, pegando de volta meu celular. Ele pegou emprestado quando percebeu que o seu estava descarregado e meio que acabou forçando um diálogo.

— Está tudo bem? — Puxo assunto, tentando amenizar o clima denso que se formou entre nós e desviar minha atenção de mamãe. Ele sorrir e se senta ao meu lado, parecendo com o cara que conheci ainda menina e quase me sinto relaxada. Quase.

Ele suspira e passa as mãos pelos fios agitados, deixando—os ainda mais revoltos. Sua fisionomia mudou durante esse curto período que passamos afastados, seu cabelo possui um comprimento maior e a barba não está feita.

— Sim. Aurora, ainda está na sua casa e vai me esperar para que a busque na volta. — Diz, parecendo desconfortável em seu assento. Assinto com a cabeça, voltando meu olhar para a única pessoa que me importa no momento.

— Como ela está? — Pergunta e suspiro.

— Não sei. Viva, talvez? — Arrisco, não sabendo ao certo o que farei sozinha em outro país se ela continuar desse jeito.

— O melhor pra ela agora é se afastar de toda essa confusão, respirar ar puro. Vai ficar tudo bem, Amélia. — Sua mão descansa sobre a minha e ele dá um leve aperto, sorrio desajeitada, me livrando de sua mão de forma discreta.

Não é como se eu tivesse esquecido o que ele fez ou falou, na verdade, eu nem mesmo queria que ele estivesse aqui, mas meu pai o intimou e não quis criar uma cena para ter que explicar depois.

— É o que espero. — Digo e finjo que estou mexendo no celular.

— Desculpe. Eu realmente não sei o que anda acontecendo comigo, acho que minha preocupação com o estado de Aurora me fez focar em você de alguma maneira. — Fala, me despertando preocupação.

O estado de Aurora?

—  Ela e meu sobrinho estão bem?

Ele me olha nos olhos e se mantém em silêncio por alguns segundos, erguendo sua mão e afastando uma mexa de cabelo que estava perto dos meus olhos.

— Pedro... — Sussurro e ele se afasta, olhando para a frente.

— Sim e não. — Diz, incompleto e espero para que conclua. Sua expressão adquirindo um tom sério e sombrio com o passar dos segundos. — A gravidez se tornou de risco desde que ela foi parar  naquele hospital, devemos evitar qualquer aborrecimento, eventos ou discussões que possam deixá—la mais nervosa do que o normal.

Meu peito aperta, lembrando de como foi nossa despedida. Não houve abraço ou beijos, nenhum até logo, apenas um olhar carregado de memórias e ressentimentos. Culpa me invade, não só pela falta de despedida, mas pelo beijo que Pedro me deu. Céus, se ela tivesse visto?

Ele não pensou nisso quando me beijou? Olho para ele, raiva inflando meu peito, mas sua expressão de derrota abala minha postura.

— Eles vão ficar bem. — Tento tranquiliza-lo, acariciando seu ombro no automático em um gesto íntimo, porém inocente. Ele aproveita que abaixei a guarda e segura minha mão, a levando para os lábios e a beijando.

— Vou sentir sua falta. — Diz, usando um tom sedutor, prendendo meus olhos aos seus, mexendo com meu psicológico.

Um praguejo nos faz se afastar.

— Nosso voo está saindo, filha. — Uma Dona Anna Maria rabugenta nos encara, parecendo completamente da mulher de alguns minutos atrás.

Balanço com a cabeça, atordoada pela sua mudança brusca de postura.

— Vocês lembram de quem procurar, certo? — Pedro fala, olhando entre ela e eu.

— Não vamos para Missouri hoje, não depois de viajar por horas dentro dessa ave de metal. — Mamãe soa ríspida, torcendo o nariz quando olha para a grande janela de vidro e avista uma das aeronaves já na pista.

— Certo, vou avisar ao motorista para passar amanhã, precisam que eu faça reserva em algum hotel? — Pergunta solícito.

— Não se preocupe, Pedro. Podemos tomar conta de nós mesmas, somos adultas e eu sou a mãe dela, vou cuidar de nossas reservas e enviar eu mesma uma mensagem para o tal homem.

Meu cunhado abre a boca, sem fala. Ligeiramente sem jeito pelo tratamento seco de mamãe.

— Certo, me avise quando chegar. — Ele fala, mas se direcionando apenas a mim. Ouço mamãe bufar baixo, mas aceno com a cabeça de forma positiva para Pedro.

— Bem, obrigada por nos trazer. Tome conta da minha irmã e se cuide. — Digo, segurando a minha mala com força.

— Vou cuidar. — É tudo o que ele responde.

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