Foi na madrugada de ontem que a verdade veio em forma de sonho, eu lembrei exatamente de tudo que aconteceu naquela noite desde o momento que sai de casa até a hora de ser preso. E, Puta que pariu. Eu tô furioso! Não consigo parar de reprisar as cenas na minha cabeça, cada vez que revivo o episódio uma raiva desmedida cresce dentro de mim.
— O que foi, alguém morreu? — Guilhermino chega assustado, olhando para todos os lados do escritório.
— Ainda não. Pegue a caminhonete, vamos sair. — Digo, virando o copo de uísque que eu mesmo tinha me servido minutos atrás.
Ele me olha desconfiado, perdido sobre minhas reações. O compreendo, eu estava quieto no café da manhã, mas eu estava pensando no que fazer e em como agir.
— Isso chegou pra você. — Me entrega um envelope marrom fechado.
— Quem deixou? — Pego o envelope e o inspeciono, percebendo que não existe nada além do meu primeiro nome escrito nele.
Junto as minhas sobrancelhas, achando tudo muito estranho e o encaro, esperando por uma resposta. Ele dá de ombros e vai direto para a parte onde guardo as bebidas.
— Minha vida se tornou uma novela mexicana desde que você saiu da cadeia, sério mesmo. Não exista um dia que não aconteça algo estranho nessa fazenda.
Escuto o que ele diz, mas não digo nada.
— Você não vai abrir? — Volta a falar, percebendo que ainda encaro o envelope concentrado.
— Tenho é medo dessas coisas. — Deixo escapar, soando como uma brincadeira, mas o negócio é sério.
Tenho medo.
Ele bufa, virando sua bebida de uma vez e toma o envelope da minha mão, rasgando o papel sem nenhuma dúvida.
— Eu que ia abrir essa porra! — Esbravejo, puxando o papel de volta para as minhas mãos.
— Você estava fazendo drama, nem sei o motivo. Você é mal humorado e ranzinza, gosta de praticidade.
Dou de ombros, sabendo com clareza o motivo de preferir brincar do que encarar a realidade.
— Eu lembrei da noite que fui preso. — Confesso, depositando o envelope sobre a mesa.
— Sério? — Afirmo com a cabeça.
Ele solta um suspiro longo, retirando o chapéu e coçando a cabeça.
— Vem chumbo grosso por aí, não vem? — Questiona, organizando o chapéu de volta em sua cabeça e mais uma afirmo sem usar palavras. — Conte—me tudo. — Diz, sentando na cadeira próxima a mim e adotando uma posição confortável no assento.
— Cara, eu me odeio por ter esquecido essa noite...— Balanço com a cabeça, cobrindo meu rosto com as mãos. — Me sinto tão idiota. — Deixo escapar e ele vem até mim, apertando meu ombro com sua mão.
— Você não é um idiota, Henrico. É forte e honrado assim como seus pais eram, não se preocupe com nada que vai me contar, nunca irei julgar você.
— Aurora não me ligou naquela noite, quero dizer, ela ligou, mas desligou sem falar nenhuma e conclui que o encontro com o pai dela não tivesse saído como planejado, então fui atrás. Eu não tinha a localização exata, mas não ia ficar esperando sentado.
— Eu não sabia disso. — Comenta, voltando a se sentar e o copio, sentando na cadeira a a sua frente.
— Então, eu saí naquela noite com um aperto no peito e achei que tinha ligação com Aurora, mas quando estava chegando na estrada principal encontrei com Augusto e ele estava precisando de ajuda, achei estranho Aurora não está junto dele, porém resolvi ajudar primeiro e fazer as perguntas depois.
— Você o ajudou a tirar o carro da lama. — Aponta e digo que sim com a cabeça.
— Nós conseguimos e eu voltei ao meu carro, meu intuito era continuar seguindo rumo a estrada, mas ele falou que Aurora o tinha deixado para voltar sozinha para a fazenda.
— Mas pela sua cara você não acreditou na história. — Diz, me olhando de forma atenta.
Sorrio sem humor, esfregando meu rosto com minhas mãos.
— Não, eu acreditei nele. Só que recentemente Aurora me confessou que tinha ido se encontrar com Pedro e não com Augusto.
— Puta merda. — Guilhermino deixa escapar, se levantando para se servir de outro copo de uísque.
— Também quero. — Falo e ele me serve.
— Essa história está ficando fodida, porque se ela estava com o tal Pedro, então as ações de Augusto foram premeditadas. Você acredita nela?
— Não sei, acho que sim. Ela me pareceu verdadeira quando confessou pra mim.
— Você acha que ela estava junto com o pai nessa armação?
— Não, Augusto Leal usa as filhas como se fossem um de seus bens. Aurora não é uma pessoa ruim.
— Recaída?
— Nem pensar. Estou puto com aquele velho.
— O que aconteceu depois? Você estava voltando pra casa?
— Sim, mas uma cobra apareceu no meio da estrada e tive que frear, acabei batendo em uma árvore e fiquei inconsciente.
— Dessa parte eu sei, você já havia me contado.
— Só que eu lembrei de algumas coisas que minha memória havia apagado, como a presença de três homens. Eu estava inconsciente, mas lembro de quando eles mexeram nos bancos do meu carro e colocaram alguma coisa lá.
— As drogas. — Ela Exclama, saltando da cadeira como se tivesse acabado de descobrir a cura para Aids.
— Sim. Augusto estava com eles, rindo e dando instruções. Tenho certeza que foi ele que me ligou do celular da Aurora e me atraiu até ali.
— Mas você mesmo disse que ela estava com Pedro, como Augusto teria acesso ao celular dela? — Questiona e eu paro pra pensar, ele está certo.
— Pedro... — Penso em voz alta.
— O quê?
— O atual da minha ex. Ele pode ser aliado de Augusto e ter armado pra mim. Afinal, ele casou com Aurora.
— Eu não entendo em que momento eles colocaram droga no meio dos nossos produtos, os policiais foram bem em cima. — Concordo com a cabeça, lembrando de que quando os policiais me acharam na estrada eu estava sozinho, meio atordoado e fui algemado, sem muita explicação. Os policiais me trouxeram direto para a fazenda e fizeram uma varredura, dizendo que tinham recebido uma denuncia e acharam uma quantidade excessiva de maconha, crack e outras drogas entre os produtos de plantação.
— Eles provavelmente tiveram ajuda de alguém daqui. — Falo, me sentindo traído.
Porra!
Algum dos meus me traiu?
— Você acha? Mas quem poderia ter se aliado à eles? — Guilhermino pergunta pensativo, fazendo uma careta estranha.
— Alguém aqui tem uma tatuagem de aranha no ombro? — Ele me olha confusa no mesmo instante.
— É o quê? Tatuagem de aranha, mas que porra é essa?
Sou de ombros, virando mais dose de uísque.
— Lembro de um dos homens está sem camisa e ter essa tatuagem, talvez seja alguém daqui. — Esclareço, me servindo mais da bebida âmbar.
— Não sei, não fico reparando em homem. Mas vamos descobrir! — Se exalta, batendo com o punho na mesa e derrubando o envelope que me trouxe no chão.
— Desculpa. — Apanha o envelope, deixando cair todo o conteúdo no chão.
— Porra! — Exclamo, derrubando o copo de vidro no chão.
— Esse é o...
—Sim. — Falo, antes que ele conclua e apanho todas as fotos do chão. — Temos que ir.
— Você vai até a casa deles?
— Óbvio, você não está vendo isso. — Levanto a foto bem rente aos seus olhos e seguro por alguns segundos. — Minha mulher está correndo perigo convivendo com aquele psicopata, aliás, todos estão. Tenho que tirá-la de lá. Vamos!
Pego as chaves da caminhonete que estava sobre a mesa e não o espero, saio correndo escritório a fora e só paro quando chego no carro.
— Que novela mexicana que nada. Isso está mais pra um filme de terror, o cara é assassino, Henrico. Ele matou o tal médico. — Fala, batendo a porta do passageiro.
Sim, eu sei.
Eu sempre soube que ele era uma ameaça.
Ligo o carro e acelero sem pensar em nada além dela.
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