O Padrasto 1 romance Capítulo 16

O que seria de nós, meros mortais,

se não fosse o cuidado dos anjos

que damos o nome de amigos.

Deane Ramos

— Oi, amor. — Saio do meu devaneio ao ouvir a voz de Felipe, que me recebe com o seu costumeiro carinho. Ele se aproxima e entrelaça as mãos em volta da minha cintura, puxando o meu corpo para perto do seu, como se fôssemos um só e, em seguida, rouba um selinho estalado.

— Oi, Fê — Com os olhos semicerrados por conta da claridade do sol, eu volto a minha atenção para ele, mas mantenho a minha mente atrás da porta, onde a minha vida está sendo discutida sem a minha presença, onde eu deveria estar me defendendo.

Mas o que estou pensando? Eu já decidi o que fazer da minha vida e nada mais pode ser feito para evitar isso.

Quanto drama, Julha, deixe de ser covarde e lute pelo que você quer. Revira os olhos o meu demônio interior.

Bufo, exasperada, porque sei que ele tem razão. Eu deveria lutar pelos meus objetivos, mas nada é tão simples quanto parece.

— Julha, está tudo bem, meu amor? Parece que ouvi gritos vindos de lá. — Ele faz sinal com o polegar em direção à porta enquanto pergunta ao afastar seu corpo do meu.

— Sim, está. É só... só.. tire-me daqui — peço com a voz embargada, como uma criança indefesa. É assim que eu me sinto neste momento.

— Calma, meu amor, vai ficar tudo bem. — Ele me abraça novamente, então faço o mesmo. — Vamos sair daqui.

Seguimos em direção à sua Mercedes estacionada em frente à casa.

— Senhorita Julha — cumprimenta-me o motorista que nos aguarda fora do carro, mantendo a porta aberta.

Assinto com a cabeça em resposta ao seu cumprimento.

— Para o shopping — Felipe diz ao seu motorista enquanto deslizo o meu corpo pelo estofado em couro preto e macio.

O motorista fecha a porta, dá a volta no carro e toma o seu lugar ao volante. Em poucos minutos, o carro percorre a avenida movimentada de Nova Iorque. Os meus pensamentos vagueiam para o local que estive poucos minutos atrás. Eu quero estar lá nesse momento, quero me explicar para a Ada e dizer que não foi nada planejado, que eu jamais iria me envolver com Christopher se eu não estivesse apaixonada. Mas sei que de nada adiantaria, Ada está decepcionada e tudo que eu tentar dizer vai se voltar contra a mim. Exausta com tudo o que está acontecendo, eu respiro fundo.

O melhor a fazer é continuar com o que planejei. Sei que não será fácil viver sem Christopher, sem as suas investidas, seu toque, seus beijos. Ele já fazia parte de mim, o seu perfume está impregnado em meu corpo. Eu ainda sinto o sabor dos seus lábios, ainda consigo ouvir os seus sussurros ao pé do meu ouvido enquanto me tem em seus braços. Sentirei saudades de tudo o que nós vivemos, mas as coisas nem sempre terminam como imaginamos ou queremos. Uma lágrima solitária cai dos meus olhos ao me lembrar de cada momento que passamos juntos.

— Princesa, está tudo bem? — pergunta Felipe, parecendo preocupado.

Puxo ar para os meus pulmões e seco a lágrima solitária com um lenço de papel que Felipe me oferece.

— Obrigada — agradeço, assentindo com a cabeça. — Sim, estou bem — digo com um sorriso amarelo.

— Como você pode me dizer que está tudo bem?

Eu o fito com a pulsação acelerada e, por um breve momento, o desespero de que Felipe tenha descoberto tudo me invade.

— Não me olhe assim, meu amor. Você está chorando e ainda me diz que está tudo bem? Você sabe que pode confiar em mim, não sabe?

— Sim, eu sei. — Levo a mão ao seu rosto e o acaricio.

— Por que não me conta o que está acontecendo? — ele insiste.

— Não quero te importunar com os me assuntos, Felipe. — Volto a minha atenção para a estrada.

— Nada que venha de você me importuna, meu amor. Nunca mais repita isso. — Ele leva a sua mão ao meu queixo, ergue a minha cabeça e deposita um selinho estalado em meus lábios.

— Está bem. Prometo não repetir mais essas sandices. — Meu sorriso sai em uma linha fina.

— Ótimo. E eu — ele rouba outro selinho estalado — prometo que não vou mais perguntar nada, deixarei que você me conte quando quiser.

— Combinado. — Dou um sorriso satisfeito, pois não sei qual mentira mais teria que inventar caso Felipe insistisse no assunto.

Deito a cabeça em seu peito buscando refúgio e me mantenho quieta, então seguimos assim todo o trajeto para o shopping. Por mais que eu queira manter os meus pensamentos longe de Christopher, é impossível. Quando dou por mim, estou pensando nele.

Chegamos ao shopping e o motorista estaciona na entrada principal. Antes mesmo que ele consiga abrir a sua porta, eu saio do carro com Felipe logo atrás. O pobre motorista fica tentando justificar o motivo de não ter conseguido executar o seu serviço com excelência, mas Felipe não dá muita atenção.

— Está tudo bem, não se preocupe, Juan.

— Quer que eu venha buscá-los que horas?

— Eu ligo para avisar — diz Felipe.

— Está bem. Divirtam-se.

Nós nos despedimos do homem, que sai sem nada compreender, e seguimos ao encontro de Bruno e Ane na praça de alimentação, como havíamos combinado. E não teria lugar mais apropriado para encontrar a minha amiga, que acena com animação ao nos localizar.

— Nossa! Como vocês demoraram — Ane diz com a boca cheia de batatas fritas enquanto me envolve em um abraço forte.

— E aí, cara — Bruno cumprimenta Felipe com o seu habitual toque de mãos seguido de um breve abraço.

— Começaram sem a gente? — pergunto, ao me referir ao lanche que estão comendo, afinal, marcamos de almoçar juntos.

— Você conhece a dona encrenca, sabe como ela pode se transformar em um demônio quando está com fome — diz Bruno, nos fazendo rir.

— Diferente da sua namorada, que não precisa sentir fome para se tornar um — provoca Ane enquanto cumprimenta Felipe com um abraço.

— Ei, me deixe fora disso. — Aponto o dedo indicador em sua direção enquanto recebo um abraço e um beijo carinhoso do meu amigo.

— O que você está comendo? — Inclino o meu corpo sobre a mesa e roubo uma batata frita da sua bandeja, mas acabo recebendo um tapinha na mão atrevida. — Chata. — Mostro a língua para ela, que revira os olhos.

Felipe arrasta duas cadeiras, uma para mim e outra para ele.

— O que vai comer?

— Hambúrguer, fritas e um refrigerante cola.

— Ada? — brinca Ane, fingindo ligar para Ada, que tanto me cobra para ter uma alimentação saudável.

Dou um sorriso tímido, que agora não tem mais a mesma graça, não hoje. Ane estranha a minha atitude e me encara um pouco desconfiada.

— Querem alguma coisa? — pergunta Bruno para Ane ao se levantar.

— Eu quero outro refrigerante cola, o meu acabou — diz Ane, ao levantar o copo vazio.

— Vamos lá.

Os dois amigos saem conversando animadamente, enquanto Ane se vira em minha direção.

— O que está acontecendo?

— Como assim, o que está acontecendo?

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