Centro de Lyon, França
Janeiro de 2015
As primeiras chuvas frias do inverno caíram sobre a cidade. Na janela do penúltimo andar do hospital Saint-Mary, Alexander fitou o céu encoberto por nuvens cinzas, ajeitou os óculos e desviou o olhar para a tela do celular enquanto escutava as batidas suaves das gotas contra o vidro.
― O que você quer, Josephiné? ― O tom na voz rouca soou fria assim que atendeu a ligação. ― Estou muito ocupado!
― É só isso que você tem a dizer, mon coeur? Tem cinco dias que você não aparece em casa.
― Ficarei por uns dias no hotel aqui perto.
― Você ainda está zangado por que eu sugeri um ménage?
Alexander suspirou pesado e sentou na cadeira da sala onde lia as informações do paciente antes da cirurgia. Os olhos pareciam fendas cortantes como facas, por mais que ele fugisse e desviasse do assunto, era impossível agir como se nada tivesse acontecido nos últimos dias.
― Chega, Josephiné! ― Levantou os óculos e coçou os olhos com os dedos longos. ― Essa conversa acabou!
Ele passou a mão na mandíbula quadrada e em seguida fechou os arquivos com as informações do paciente no computador.
― Quer saber a verdade, eu acreditava que você era gay. ― A voz de Josephiné se ergueu até ficar rouca. ― Depois que achei as fotos no seu livro, eu tive a certeza que era por causa daquela idiota.
― A Nicky ficou no passado. ― Alterou a voz.
― Não! Ela não ficou ― retrucou Josephiné, em voz alta. ― Você gosta de sofrer pela mulher que te abandonou.
― Au revoir, Josephiné!
Alexander verificou a hora no relógio e desistiu de discutir. Encerrou a ligação, passou os dedos longos na testa e respirou fundo.
Ele costumava deixar os problemas em casa e manter o foco no trabalho; contudo, os últimos dias se tornaram mais difíceis depois que Josephiné encontrou algumas fotos e uma passagem para o Rio de Janeiro.
O movimento no ambulatório e na emergência do hospital era constante. A maioria dos médicos residentes sofriam com o trabalho braçal e iam de um lado a outro sem descanso. Suturas, triagens, baterias de exames, diagnósticos precisos faziam parte dos exaustivos plantões.
Na sala de cirurgia, Dr Bittencourt ressecou e removeu o cordoma, tumor que se espalhava no osso da base do crânio do paciente. Elevou a cabeça para uma das enfermeiras que enxugou-lhe o suor na testa e prosseguiu com a sutura.
Logo depois de passar cinco horas na cirurgia, Alexander retirou as luvas, o avental e a touca azul, lavou as mãos e seguiu ao encontro da família do paciente que aguardava por notícias.
― Excusez-moi, madame Françoise!
― Como está meu esposo, Doutor Bittencourt?
― A cirurgia foi um sucesso!
Mesmo que estivesse acostumado com a rotina e as extensas horas extras, naquele dia, ele parecia mais cansado. Por cinco anos deu o melhor de si, obteve avaliações positivas e construiu uma carreira. Naquela quinta-feira fria e chuvosa, Alexander concluiu o seu último dia de residência no hospital.
No término do plantão, Alexander relaxou por alguns minutos no banho quente e em seguida envolveu a toalha nos músculos que se formavam abaixo da cintura estreita.
Parecia um soldado confiante com seus 1,85 cm de altura. O porte físico forte e destemido intimidava e chamava atenção de qualquer um que se aproximava. Colocou a calça preta de linho, ajeitou o cinto e fingiu não ver a sombra que o espiava. Sentou no banco, colocou as meias pretas e pegou os mocassins.
― O que você quer, Isabella? ― Levantou após calçar os sapatos.
― Calma, só estava apreciando a visão.
Isabella caminhou com brio no jaleco branco que sobrepunha a camisa de cetim lilás e a saia preta na altura dos joelhos. Os cabelos dela flamejavam como uma fogueira ardente quando jogou para trás dos ombros.
― Você não perde tempo, não é!
O músculo do braço e do abdômen ondulavam na manga longa enquanto ele vestia o casaco acinturado cinza e ajeitava sobre os ombros largos. Colocou a jaqueta acolchoada e pegou a mochila.
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