Anjo Protetor romance Capítulo 5

─ Droga! ─ Esmurro a parede a minha frente assim que saio da sala de emergência.

Não aguento mais perder vidas para as malditas drogas. Este paciente que acaba de falecer foi o terceiro esta semana que morreu em minhas mãos por overdose, e eu não pude fazer praticamente nada, pois ele chegou já em estágio terminal.

Ando pelo corredor até chegar à saída querendo respirar um pouco. Quando alcanço o lado de fora, solto todo o ar guardado dentro dos pulmões e passo as mãos freneticamente pelos cabelos soltos. Olho para frente e me deparo com um par de olhos amarelados assustados que me olha de volta e, nesse momento, o mundo para, uma brisa forte balança meus cabelos, mas não ouso me mover, porque um sentimento forte toma conta de mim, não sei que tipo de sentimento é, mas não ouso me mover.

Não faço ideia de quanto tempo ficamos nos encarando, em nossa bolha, mas, de repente, uma sensação de reconhecimento cai sobre mim, pois estes mesmos olhos que vejo diante de mim são os mesmos daquela garotinha que deixei em um convento há nove anos, neste mesmo vilarejo.

Nosso contato é quebrado no momento em que um garotinho, ao qual não tinha percebido estar ao seu lado, a faz desviar a atenção de mim, pois vira-se para ele na intenção de lhe responder algo. Nessa hora, aproveito o momento e entro no Centro Médico, porque olhar para aquela menina me fez reviver uns dos dias mais tristes da minha vida, pois perdi o doutor Evans e tive que decidir a vida de outra pessoa, sendo eu um jovem médico que mal conseguia decidir algo sobre minha vida e, de repente, tendo que decidir a vida de uma pessoa, e com o Centro Médico sob minha responsabilidade.

Lembro-me perfeitamente daquele dia, como se fosse hoje.

Caminho pelos corredores de paredes brancas até chegar em minha sala, entro e me sento na minha mesa relembrando do fatídico dia.

As lembranças vêm imediatamente em minha mente, como um filme. Relembro o momento em que Guadalupe me chamou aos prantos informando que o Dr. Evans tinha sido atingido por tiros. Naquele dia tudo estava um caos no pequeno vilarejo, pois a polícia estava dando uma batida nas plantações as quais eram usadas por traficantes para plantar suas drogas. Mas como os homens do Cartel de Sinaloa não se deixam intimidar, responderam à altura os policiais e, daí por diante, tudo se tornou um verdadeiro inferno. Pessoas baleadas, mortas, crianças chorando por sobre os corpos dos seus pais e pais chorando sobre os corpos de seus filhos.

Mas, apesar de estar diante do caos no Centro Médico, saí correndo assim que tive a notícia sobre meu mentor e amigo, porém, nada havia me preparado para a cena que vi assim que pisei meus pés do lado de fora e encontrei meu amigo no chão sobre uma poça de sangue, olhos vidrados e sem brilho, com o corpo inerte. O que me deixou totalmente abalado foi ver sua filhinha, Melanie, sobre ele chamando-o desesperadamente, aos prantos e com o corpo banhado em sangue.

Confesso que ver aquilo me deixou desnorteado, eu era muito novo, havia começado minha residência ao lado do Dr. Evans, que tinha sido meu grande mentor na faculdade de Oxford, o que me fez querer segui-lo até El Camino, um vilarejo de Sinaloa localizado na região oeste do México, para trabalhar ao lado dele, a fim de aprender com o melhor. E vê-lo caído cheio de sangue bem diante dos meus olhos me deixou sem chão, não consegui raciocinar direito mas, ao me aproximar do corpo e constatar o óbvio, que meu grande amigo realmente estava morto, me deixou arrasado, somado à pressão da minha família, que queria que eu fizesse minha residência no St. George´s Hospital e não em um vilarejo pobre em Sinaloa no México. Além disso, tinha também a Karen, naquela época estava completamente apaixonado por ela, então resolvi adiantar meus planos com relação a nós dois e decidir voltar para Inglaterra.

─ Como eu iria cuidar de uma criança? Eu não conseguia cuidar nem de mim mesmo. ─ Constato, tentando aliviar a culpa que carrego há nove anos em meu peito.

Aqueles olhos amarelos e chorosos me implorando para não deixá-la naquele convento acompanharam-me ao longo dos anos e creio que, por isso, por me sentir culpado e em dívida com meu grande amigo, Dr. Evans, eu me candidatei à vaga que surgiu para o Centro Médico, anos depois, sem pensar duas vezes, além do fato de querer fugir de Londres, pois meu mundo tinha acabado de desabar sobre minha cabeça na época e quis fazer uma última homenagem àquele que foi um grande amigo para mim..

Há três meses aqui, tentei várias vezes visitar aquela menininha que deixei no convento, sem sucesso, mesmo pagando todos os custos da estada dela no convento, às vezes até bem mais do que foi acordado com a madre superiora, não deixei que lhe faltasse nada. Suspiro audivelmente recostando a cabeça sobre o encosto da cadeira.

─ Droga! Mesmo não tendo conseguido vê-la, o destino se encarregou de fazer com que ela viesse até mim.

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