A noite avançava preguiçosa, espalhando sua calma sobre a casa dos Carter. O jantar terminou há pouco, deixando para trás uma trilha de louça suja, panquecas vazias e risos ecoando nos cantos das paredes. Ainda havia vozes dentro da casa, David reclamando de Tiago, Zoe e Tânia rindo alto de alguma piada infame, e Helen murmurando um “não acredito que vocês contaram aquilo” pela terceira vez.
April escapou de fininho.
Descalça, com o vestido floral ainda levemente perfumado da tarde, ela empurrou a porta de vidro que dava para o jardim. A grama estava fria sob seus pés. A noite estava fresca, a lua cheia pendurada no céu como uma promessa silenciosa. O cheiro de jasmim se misturava ao da madeira molhada da pérgola, iluminada por pequenas luzes amarelas que serpenteavam pelo caramanchão.
Ela respirou fundo. Precisava de um instante de silêncio.
— Também fugindo do interrogatório geral? — perguntou uma voz atrás dela.
April se virou devagar, e encontrou Tomás parado ali, enfiando as mãos nos bolsos da calça jeans, os cabelos bagunçados e o mesmo sorriso tímido de antes. Ele parecia hesitar, como se não soubesse se podia ou não dar mais um passo.
Ela sorriu de lado.
— Achei que depois daquele jantar você nunca mais sairia correndo daqui.
— Estou considerando entrar para a terapia — respondeu ele, caminhando até ela. — Mas… valeu a pena.
April desviou o olhar, tentando conter o rubor que subia por sua pele.
— Por causa das panquecas?
— Por causa do beijo. — A voz dele saiu mais baixa, e por um segundo o ar ficou diferente entre eles.
Ela o encarou.
Os olhos castanhos dele refletiam as luzes do jardim. Ele parecia nervoso, mas firme. Como se estivesse enfrentando um daqueles desafios invisíveis que só quem está sentindo demais consegue encarar.
— Você beija bem, sabia? — April disse antes de pensar. E então tampou a boca. — Quer dizer… não que eu tenha experiência. Mas… foi bom. Muito bom. Enfim. Esquece.
Tomás riu, aliviando o clima. E então se aproximou mais um pouco.
— Que bom… porque eu pensei em repetir.
O coração de April deu um pulo. Ela recuou um passo… e depois parou, sorrindo. O mundo parecia distante. A casa, as vozes, os pais rindo lá dentro, a vergonha de mais cedo… tudo desaparecia naquele instante.
Ele estendeu a mão.
— Vem. Quero te mostrar uma coisa.
Ela hesitou, depois colocou os dedos nos dele. As mãos se encaixaram com naturalidade. Quentes. Nervosas. Mas certas.
Ele a guiou até um canto do jardim onde havia um pequeno banco de madeira sob uma árvore. Ali, o som do vento era mais suave, e o mundo parecia menor.
Sentaram-se lado a lado. Perto demais para serem só amigos. Longe o bastante para ainda haver hesitação.
— Sabe… — começou ele, encarando o chão. — Desde que te conheci, eu… meio que soube que você era diferente. Mas hoje… depois de tudo que aconteceu lá dentro, eu percebi que gosto de tudo em você. Até das suas vergonhas.
April riu, encostando o ombro no dele.
— Eu ainda tô processando o fato de que minha mãe foi pega no flagra na sala de cópias. Acho que isso muda quem a gente é.
— Acho que só confirma que ela é apaixonada de verdade — respondeu ele, virando o rosto para ela. — E eu acho isso bonito.
Os olhos de April buscaram os dele. Não havia mais vergonha. Só verdade. Só a batida do coração acelerando com a urgência de tudo o que ainda não tinha sido dito.
Tomás levantou a mão e tocou uma mecha do cabelo dela que havia escapado da presilha.
— Você é linda, April. E não é só por fora. É tudo… você é leve, intensa, generosa… e mesmo que você ache que não percebe, quando sorri, ilumina tudo.
Ela sentiu as palavras como um abraço quente. Como um vento morno em plena madrugada.
E então, ele se inclinou.
O beijo começou devagar. Os lábios se tocaram como se tivessem medo de quebrar algo. Um toque leve, doce, como uma pergunta silenciosa.
April respondeu com a boca e com as mãos, segurando o rosto dele com delicadeza. O segundo beijo foi mais firme. Mais presente. Os lábios se encontraram com mais urgência, como se o tempo fosse pouco e o sentimento, muito.
Os dedos dele desceram pela nuca dela, o toque suave, o calor se espalhando entre os dois. O mundo silenciou. Nada mais existia além da dança de respirações, dos corações acelerados, do desejo tímido e real que crescia.
Ela gemeu baixinho contra os lábios dele. Ele a puxou mais para perto. Estavam encostados agora, peito contra peito, coração contra coração.
E então…
Ethan o observou por mais dois segundos que pareceram uma eternidade, depois suspirou, virou-se para a filha e disse:
— E você… mocinha. Sua mãe e eu vamos ter uma conversa MUITO séria sobre esse negócio de genética hormonal que a gente passou pra você.
— PAI, PELO AMOR DE DEUS!
Ele riu, finalmente, e deu um tapinha no ombro de Tomás.
— Relaxa, garoto. Mas continua com essa cara de pânico. Me agrada.
Com isso, voltou para dentro da casa.
April olhou para Tomás.
— Me desculpa.
Ele riu, mais aliviado agora.
— Eu tô acostumado com o seu pai. Só não estava preparado pra isso… agora.
— Ele adora intimidar.
— Funcionou.
Ela segurou a mão dele de novo, apertando de leve.
— Mas obrigada… por não fugir.
— Por você, April? Eu enfrentava até seu pai… com um taco de beisebol na mão.
Ela riu, emocionada. E então o puxou de volta para o banco.
— Só mais um beijo. E dessa vez… sem plateia.
Eles se beijaram novamente, e o jardim inteiro pareceu suspirar com eles.

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