A casa adormecia, embalada por ecos de risos e o aroma distante das panquecas doces que ainda pairava no ar. Mas no segundo andar, dentro de um quarto iluminado apenas por um abajur de luz âmbar, o coração de uma jovem batia forte demais para descansar.
April subiu as escadas como quem flutua, com os lábios ainda sensíveis, as bochechas coradas e o corpo leve. O beijo com Tomás ainda pulsava em sua memória como se tivesse acontecido segundos antes. Seu coração parecia conversar em outra língua, e suas pernas, embora firmes, mal tocavam o chão.
Ao empurrar a porta devagar, encontrou uma surpresa.
— Mãe? — exclamou, piscando como se estivesse sonhando.
Helen estava sentada com tranquilidade na beirada da cama, espalhando creme nas mãos com um ar casual, casual demais para ser natural.
— Boa noite, meu bem — disse ela com a voz doce e um sorriso sutil nos lábios. — Tô passando hidratante e… esperando a donzela de volta da sua escapada noturna ao jardim.
April fechou a porta num estalo, o rubor subindo até as orelhas.
— Mãe! Você não precisa ficar me vigiando!
— Claro que preciso. É instinto materno. E parte também é puro entretenimento.
Helen sorriu como quem esconde um ás na manga.
— Então… o jardim ainda está inteiro ou vocês incendiaram alguma trepadeira por lá?
April sufocou um grito de vergonha.
— Mãe! Meu Deus! A gente só… conversou.
— Ah, claro — respondeu Helen, com sarcasmo afiado. — Conversa moderna, com a língua.
— SOCORRO!
Helen gargalhou.
— Calma, filha. Eu tô brincando. Mais ou menos. Seu pai, por outro lado… ainda tá se recuperando do choque.
April caminhou até a penteadeira, sem ousar olhar o próprio reflexo no espelho.
— Ele pareceu um agente da SWAT descendo a escada.
— E você pareceu uma personagem de comédia romântica que não sabe onde se enfiar — respondeu Helen, rindo. — Mas posso te contar um segredo?
April virou-se, curiosa.
— Eu já fui você. Bem mais do que imagina.
A filha se sentou na beira da cama, com os olhos atentos.
— Tá querendo me dar um sermão agora?
— Não. Tô querendo dividir um pedaço do meu coração. — Helen fez uma pausa. — Porque hoje, quando vi você com aquele brilho nos olhos, lembrei da garota que eu fui… apaixonada por um rapaz que não fazia ideia de que eu existia.
— Pera… o papai?
Helen assentiu, sorrindo.
— Desde o colégio. Ethan era… impossível. Inteligente, bonito, charmoso e completamente cego pra mim. Ele nunca foi namorador, graças a Deus, mas ele gostava de uma outra garota na época, mesmo que ela nunca tivesse dado bola para ele.
— O papai?
— Pois é, seu pai.Ele sempre foi lindo, atraente e chamava a atenção, mas era exatamente por não ser um galinha que eu era apaixonada por ele. Eu era só a garota que sentava duas fileiras atrás.
— Mãe… sério?
— Sério. — Helen riu com ternura. — Ele nunca olhou pra mim como algo além de uma conhecida. E mesmo assim, eu amava aquele idiota em silêncio. Passei anos guardando isso.
April se ajeitou, agora completamente envolvida.
— E como vocês… ficaram juntos?
— Então ouve bem isso, minha flor: não desista fácil. Se você enxergar amor, de verdade, se o seu coração disser que vale a pena… então lute até o fim. Não por carência. Mas por coragem. Porque amar exige bravura.
April soltou uma lágrima e sorriu.
— E se eu me machucar?
— A gente junta os pedaços. Cola com sorvete, série ruim e conversa até tarde. Mas a gente segue. Sempre.
April se jogou no colo da mãe, rindo entre lágrimas.
— Eu te amo tanto.
— E eu amo você mais do que tudo, pequena.
As duas se abraçaram ali, no meio do quarto, envoltas por um silêncio que só existe entre mães e filhas.
Helen se levantou, beijou a testa da filha e caminhou até a porta.
— Agora dorme. Sonha com ele. E guarda esse beijo no coração. O primeiro de muitos.
— Mãe?
Helen se virou.
— Fala, amor.
— Obrigada por ter lutado por ele. Se não fosse por isso… eu não teria esse exemplo de amor pra acreditar.
Helen piscou, emocionada, e saiu com um sorrisinho no rosto.
Do outro lado da porta, ela sussurrou só para si:
— Obrigada por ter nascido, April. Você e o David, são a melhor parte da minha história de amor.

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