Helen despertou devagar. Ainda havia sombras da noite nos cantos do quarto, mas a luz suave que filtrava pelas cortinas anunciava que o dia estava chegando. Os olhos estavam pesados pelo cansaço e, ainda assim, o corpo parecia leve. Leve de um jeito estranho. Como se tivesse sonhado algo bonito demais para esquecer, ou vivido algo que, mesmo simples, deixará marcas.
Ela estava sozinha na cama.
Os lençóis, levemente bagunçados, ainda carregavam o cheiro dele. Um perfume amadeirado, discreto, misturado ao calor do toque dele que parecia continuar ali.
Ethan…
Seu nome invadiu os pensamentos como um sussurro familiar e perigoso.
Helen fechou os olhos novamente, apertando o lençol contra o peito, e se permitiu recordar.
Eles estavam no sofá, a lareira acesa, o silêncio confortável entre os dois. Ela sentada com as pernas dobradas, os pés sob as coxas, ele reclinado, com o braço estendido ao longo do encosto. Tão perto… que conseguia sentir a respiração dele roçar sua pele.
E então ele riu.
Não uma risada educada. Mas um riso verdadeiro, espontâneo, o tipo de som que nasce do fundo da alma. O filme rolava e Helen nem mais prestava atenção, estava encantada com a maneira que Ethan agia ao seu lado, tão espontâneo, como ela sempre sonhou. Não recordava em que momento se encolheu próximo dele e adormeceu. Se fechasse os olhos, podia recordar o calor do corpo dele, o seu perfume amadeirado, o som de sua respiração… por Deus, como ela o amava.
Helen sentiu o coração aquecer com a lembrança. Era raro ver aquele sorriso, mais raro ainda era ser o motivo dele.
— Por Deus… o que está mudando? — murmurou para si mesma, de olhos fechados, os dedos apertando mais forte o lençol. — Será que estou conseguindo tocá-lo?
Não era a primeira vez que se perguntava isso. Mas cada vez parecia mais difícil responder. Ethan era gentil, atencioso e havia momentos em que seus olhos a buscavam com uma ternura que quase a fazia acreditar.
Quase…
Mas e se fosse só afeto? Só gratidão? A proximidade de quem divide a rotina, de quem vive sob o mesmo teto, tentando construir algo com base em um acordo? Mais e aquele dia? O dia em que ele disse que a amava... será que era verdade?
Helen conhecia esse risco. Sabia que, ao se deixar envolver, poderia estar confundindo pequenos gestos com grandes promessas. E no entanto… Por que, então, quando ele a olhou ontem à noite, ela teve certeza de que ele queria beijá-la?
Ela mordeu os lábios, abafando o suspiro. Era torturante viver nesse meio-termo, essa dúvida constante dentro do peito, o medo de esperar demais, a esperança disfarçada de paciência, o amor sussurrado que nunca era permitido se transformar em palavras.
Virou-se de lado e enterrou o rosto no travesseiro onde o cheiro dele ainda permanecia. Queria guardar aquilo para sempre. Queria mais daquilo… e sabia que não devia, mas já era tarde.
Ela estava cada vez mais apaixonada e no final, sabia que isso não deveria acontecer, porque Ethan era um sonho distante… um amor impossível.
Levantou-se devagar, os pés tocando o chão frio do quarto. Envolveu-se no robe e seguiu até a porta, guiada pelo som de vozes animadas e risos abafados.
A cozinha estava viva.
Amélia.
Helen sorriu antes mesmo de chegar à porta. Reconheceria a voz da sogra em qualquer lugar. Sim, sogra, porque seu coração ainda se permitia sonhar com isso.
— E outra coisa! — dizia Amélia com teatralidade. — Se você for mesmo pra Rússia, Ethan, pelo amor de tudo que é sagrado, traga aquele chocolate da embalagem dourada com um urso na frente! Aquele lá da loja do aeroporto. E não me venha com genérico barato!
— Mãe… — Ethan respondeu, rindo. — Você quer que eu atravesse o planeta pra comprar chocolate?
— Exato! E mais: quero aquele chá preto da lojinha ao lado do hotel que você ficou da outra vez. E também um cachecol vermelho com dourado. E uma matrioska. Grande, tá?
— Tá virando feira livre isso? Vai querer um samovar também?
— Não se faça de engraçadinho, Ethan Carter, ou corto o seu bem mais precioso com a minha tesoura de costura!
Ethan sentou-se de frente para Helen, com os olhos nela por tempo demais.
— Dormiu bem? — perguntou, com a voz baixa.
— Sim… — ela respondeu.
— Eu também.
Ela prendeu o ar. Ele também?
O olhar dele percorreu o rosto dela devagar. Quase reverente, quase uma confissão.
— Sobre ontem à noite…
Helen apertou os dedos um no outro sob a mesa ansiosa, o que será que ele iria dizer? Mas de repente o telefone dele tocou quebrando todo o clima. Helen suspirou fundo e Ethan olhou o visor do aparelho e sua fisionomia mudou. Ele desviou o olhar, levantou-se com um gesto contido e disse:
— Preciso sair por algumas horas. Quando voltar… a gente conversa.
Helen assentiu, forçando um sorriso.
— Tudo bem.
Mas dentro dela… tudo já começava a doer. Quem será que tinha lhe telefonado? Será que foi ela? Será que ele iria dizer que ela não confundisse as coisas que a mulher que ele amava era a Miranda?
Por Deus, quanto mais Helen pensava, mas ela temia, Mas ela não podia culpá-lo, ninguém manda no coração, e o de Ethan sempre pertenceu a outra mulher, quer ela queira ou não.

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