“Letícia Oliveira”
Eu não era uma das pessoas mais brilhantes do mundo e muitas vezes eu me fazia de boba pra viver, mas uma coisa na qual eu era boa era em observar e aprender. E eu passei tempo demais naquele bordel, tempo o suficiente para observar os leões agindo e aprender a sobreviver no meio deles. Foi assim que eu tive a idéia do esconderijo subterrâneo e foi assim que eu bolei o meu plano de fuga, porque eu sabia que só fugindo eu me livraria daqueles animais.
A verdade é que eu poderia até não ser brilhante, mas eu tinha os dois pés bem cravados no chão, tanto que eu fui parar naquele lugar por minha escolha, eu sabia que estava indo me prostituir, mas eu fui seduzida pela promessa de vida fácil, sabia que seria prostituta, mas não pensei que me tornaria uma escrava. E quando me tornei uma prisioneira daqueles animais eu soube que só sairia dali viva se conseguisse fugir.
Coitada da Camila, ela ainda se iludiu que a Rainha realmente nos deixaria ir depois que conseguisse o que queria. Mas era mais fácil ela nos colocar numa cova rasa do que nos libertar. Eu sempre soube como essa história terminaria, talvez por isso eu não tenha me esforçado para conquistar o Martim e também por que eu sabia que ele não era o tipo de homem que perdoaria a mentira quando a descobrisse, como a Camila tinha certeza de que o Emiliano faria.Mas eu mantive o papel.
Então, assim que surgiu a oportunidade eu só tive que manejar as coisas até que a minha fuga estivesse pronta. E eu não podia contar para a Camila, porque a Camila estava iludida que fazendo tudo direitinho conseguiria a liberdade. Tomara que ela realmente tenha conseguido fugir, eu gostava dela.
Durante esse último ano eu combinei tudo com os meus pais e usei todo o dinheiro que eu consegui juntar no bordel, tudo, cada migalha que eu ganhei naquele lugar depois que eu “me tornei confiável” eu depositava numa conta para o meu pai e ele foi juntando tudo.
Quando eu voltei, o dinheiro que a Rainha mandava todo mês eu também usava para construir a minha fuga. Meu pai conseguiu construir o esconderijo, nós instalamos o sistema de câmeras e até a casa já tinha sido vendida, meu pai apenas a alugava. Nós compramos documentos falsos e meu pai tinha usado o dinheiro da casa também para comprar um imóvel num país de fronteira e era lá que nos refugiaríamos.
E se o gatinho achava que sabia alguma coisa da vida, eu tinha muita pena dele, porque ele seria massacrado.
- Gatinha, será que eu não posso dar uma voltinha não? Nós já estamos há muito tempo aqui nesse buraco e eu quero sair um pouco. – Ele estava me rondando para sair desde o dia anterior.
- Eu não posso sair, gatinho, não posso dar bobeira por aí! – Eu repeti outra vez.
Depois eu desliguei todas as câmeras, não deixaria nenhum rastro para aquele rato traidor do meu maridinho, e saí do esconderijo com cuidado, fui até o fundo do quintal e subi no patamar que nós construímos escondido atrás de outra moita, para facilitar para mim. Eu subi e pulei o muro, caindo no lote vago do outro lado e saindo dali com cuidado.
Eu caminhei dois quarteirões até a avenida e logo veio um taxi, eu dei sinal e o endereço para onde ele me levaria, uma rua muito movimentada na cidade, onde eu entraria num ônibus, para descer longe do lugar e pegar outro taxi que me deixaria na cidade vizinha, de onde eu pegaria um barco clandestino que me levaria até outro ponto, onde eu pegaria um avião numa pista de pouso clandestina e este sim, me levaria para a minha nova vida.
Eu não ia chorar por aquele traste do Enrico. Eu conhecia os homens sem caráter como ele e soube que ele ia me trair no momento em que estava recolhendo as coisas no apartamento, porque eu notei que ele disfarçadamente pegou o celular da Camila, aquele onde tinha o número da Rainha. E não foi só isso, eu o mandei vender aquela parafernália eletrônica do apartamento, só porque eu precisava combinar com os meus pais como fugiríamos e dizer que eles não poderiam dizer nem meia palavra ao Enrico. Aí, ele vendeu tudo e não me deu nem um centavo, o que sedimentou em minha cabeça que eu seria traída.
Mas o que eu esperava? Ele abandonou a própria mãe! Só que teve mais, depois, quando ele me bateu, eu tive ainda mais certeza do animal que ele era, e de que eu precisava apenas fingir que estava tudo bem e esperar o momento certo. Eu poderia apostar que neste exato momento ele estava ligando para a Rainha para oferecer a minha cabeça a troco de uma quantia em dinheiro. Imbecil, não tinha idéia dos demônios que estava invocando.
Comentários
Os comentários dos leitores sobre o romance: Contrato para o caos: amor à primeira briga
Quero ler capítulos 320...