“Camila Fernandes”
Eu estava cansada, nunca pensei que a vida num convento fosse tão agitada. Pra começar que essas freiras quase não dormem, até vão cedo para a cama, mas acordam com as galinhas, e depois tem tantas tarefas, e ainda tem as orações obrigatórias.
- Noviça Maria Santa! Maria Santa! – Eu estava sendo sacudida pela Irmã Rosa.
A Irmã Rosa havia sido designada para ser minha “irmã formadora”, como disse a Madre, que ainda explicou que a Irmã Rosa auxiliaria na minha adaptação e formação, afinal, todas ali achavam que eu realmente era a Noviça Maria Santa. Maria Santa... que nome era esse que a Madre me deu? Ah, mas nem me importava, as freiras eram boas, mas a Irmã Rosa era tão agitada e era ela quem me acordava todos os dias as quatro da manhã, isso não era vida.
- Por favor, Irmã Rosa, se você me sacudir mais um pouco eu vou ter uma concussão cerebral. – Eu gemi.
- Você é tão engraçada! Acorda, Maria Santa! Já são quatro e dez! – Ela continuava pulando em minha frente. Essa freira era agitada demais para uma freira.
- Pelo amor de deus, ainda é de madrugada. – Eu reclamei.
- É por amor a deus mesmo, Maria Santa! Anda, se levanta, nós temos que ajudar a preparar o café.
A Irmã Rosa, uma mulher com seus quase quarenta anos, baixinha e magrinha, era sempre agitada, otimista, feliz demais as quatro e dez da manhã. Quem poderia ser feliz tendo acordado as quatro e dez da manhã? Eu só queria virar para o canto e dormir, mas aquela praga que eles chamavam de Irmã arrancou os meus cobertores e começou a cantar.
- Vamos, Maria Santa, canta comigo, “segura na mão de deus, seguraaaa na mão de deus, que ela, ela te levantará”... – Ela riu, um risinho contente e de quem se divertia muito. – Você viu, Maria Santa, adaptei a música para você, segura na mão de deus e levanta, menina!
- Irmã Rosa, é melhor pedir pra deus me segurar, porque se ele me levantar eu esgano você! – Eu me sentei na cama, esfregando os olhos e querendo chorar.
O que custava pra essa Madre Superiora me deixar quieta no meu canto? Ela nem notaria que eu estava aqui. Era só deixar as refeições pra mim na porta da cela e eu ficaria trancadinha aqui na minha cela. Aliás, vê bem, cela, eu achava que cela era coisa de cadeia, mas aí vim parar aqui e elas chamam o quarto de cela. Achei estranho, mas quem sou eu pra discutir.
- Maria Santa, se anima vai. Hoje é um dia muito especial! – A Irmã Rosa juntou as mãos sobre o coração.
- Irmã, porque você é tão expansiva assim? – Eu perguntei mais para distrair a irmão Rosa, para que ela parasse um pouco com a cantoria.
- Expansiva? – Ela riu. – Já me disseram que eu sou muita coisa, até exagerada, mas expansiva é a primeira vez. Maria Santa, sabe o que Deus quer de nós? – Ela perguntou e eu fiz que não. – Deus quer a nossa alegria, ele quer que seus filhos vivam com alegria! É por isso que eu tenho tanta alegria em estar aqui, servindo ao Pai.
Eu achei curiosa a resposta que ela me deu, eu sempre achei as freiras tão sérias. E sempre pensei na vida religiosa como uma espécie de penitência. Encontrar uma freira como ela foi uma grande surpresa.
Nós entramos na cozinha e eu ajudei a preparar o café, isso não era estranho para mim, eu preparava o café das meninas no bordel, a Letícia e eu. Meu coração se apertou ao me lembrar dela e eu, que nunca acreditei muito nessa coisa de fé, me peguei pedindo a esse Deus maravilhoso que a Irmã Rosa falava, que cuidasse da Letícia e que ela estivesse bem.
Depois do café da manhã nós fomos para a capela. A Irmã explicou que haveria uma missa. Eu nunca havia assistido nenhuma cerimônia religiosa, de nenhuma religião, eu nem sabia fazer as orações, a Madre tinha me dado um livrinho para que eu aprendesse e as outras irmãs não desconfiassem do meu disfarce, mas a Irmã Rosa tinha percebido que eu não sabia e usava sempre o livrinho. Ela me dizia que o importante era falar com Deus, como se eu falasse com um amigo, com o coração aberto e sincero. A Irmã Rosa estava me ensinando muitas coisas.
No fim do dia a Madre me chamou e me disso que o Sr. Nikos havia ligado e dito que estavam investigando de acordo com as informações que eu dei e que logo ele viria me visitar com notícias. Ele também mandou me dizer que a minha amiga tinha conseguido fugir e que ela foi sem o marido, mas que ela estava bem, eu fiquei muito feliz com essa notícia, ele tinha prometido para mim que procuraria notícias da Letícia e ele cumpriu. Eu percebi que eu estava me sentindo feliz, surpreendentemente. E muito mais leve. E que aquele dia realmente tinha sido especial. Talvez essa temporada no convento fosse me fazer muito bem.
Comentários
Os comentários dos leitores sobre o romance: Contrato para o caos: amor à primeira briga
Quero ler capítulos 320...