Quando desço as escadas do casarão, Theodoro já está no primeiro piso, me esperando.
Estou usando o vestido Bela Tremesso e tenho consciência do quanto pareço atraente nele. Francesco tinha razão. A peça emoldura o meu corpo, se prendendo a cada uma das minhas curvas, sobretudo seios e bunda que ele não poupa.
Enquanto abotoa os punhos da camisa branca impecável, Theo ergue os olhos para encontrar os meus.
— Vamos? — pergunta, seco.
Miserável cretino.
Eu nem me dou ao trabalho de responder. Continuo caminhando em direção a porta, mas quando passo por ele, o cappo segura o meu pulso. Nossos olhares se encontram e minha respiração para. Deus, ele é tão lindo! O cabelo está arrumado para trás. O smoking e a gravata borboleta preta dão a ele um tipo de beleza esmagadora que me levam ao chão de quatro na mesma hora.
A quem eu quero enganar? Desejo que ele me beije outra vez. Preciso disso, como preciso de ar para viver. Quero sentir a sua boca se movendo contra a minha naquela urgência desesperada que experimentei dias atrás. Mas eu não posso arriscar. Não posso acabar transformada na submissa de Don Tremesso. A esposa sem dignidade e sem orgulho que ele quer que eu seja.
Theo quer me punir.
Meu desafio é não deixar e, quem sabe, puni-lo primeiro.
Naquele segundo em que nossos olhares duelam, a meio metro da porta de entrada, fico achando que o cappo vai me castigar por aquela pequena insolência. E eu quase desejo que faça isso. Posso pensar em pelo menos meia dúzia de castigos bastante agradáveis. Mas Theo apenas entrelaça o braço no meu, me conduzindo em silêncio até o carro.
A noite está fria, um céu nublado e sem estrelas. Theodoro escolheu um Porsche branco essa noite. Ele aponta o chaveiro e o carro destranca com um som macio. É um modelo magnífico, com rodas cromadas e painel automático totalmente interativo. Ele mantém a porta da frente aberta e eu sinto um frio na barriga ao escorregar para o banco de couro bege.
Theo dispensou o motorista. Ele vai dirigir essa noite. Gira a chave na ignição, suavemente, e o motor do Porsche ronrona antes do carro acelerar sob o comando habilidoso do homem por trás do volante. Não deixo de notar um Rolls Royce preto vindo a uma distância confortável, porém, segura. Será Vincenzo ou Vitório? Não faço a menor ideia.
Sigo tensa e calada, consciente da sua presença magnética ao meu lado. Sua respiração calma e ritmada tranquiliza as batidas do meu coração. Aos poucos, deixamos a calmaria do bairro residencial de luxo e entramos no centro badalado da Sicília. Há uma infinidade de prédios iluminados, muitos restaurantes e construções de pedra em um estilo peculiar que é de cair o queixo. Do outro lado, fica o cais de San Vito lo Capo, uma das praias mais bonitas da cidade, em plena área urbana.
Como senti falta da Itália! Tudo aqui me lembra poesia, do cheiro até a paisagem que, é ao mesmo tempo, rústica e requintada.
Quando passamos pelo clube onde estivemos no último final de semana, os dedos de Theo agarram o volante com força. Eu aperto os lábios e desvio os olhos para a janela, acompanhando o movimento lá fora. Fico aguardando que ele dispare suas ordens e instruções no pior estilo do cappo, mas aquilo não acontece e seguimos em silêncio até a festa.
A mansão de Isabela Tremesso, na Sicília, impressiona pelo luxo e opulência. Theo estaciona em frente. Ele desce do veículo, contornando-o pela frente, e abre minha porta com um clique suave. Sua expressão permanece imperturbável, quando estende a mão na minha direção. Aceito sua oferta, porque, de jeito nenhum, vou confiar nesse salto agulha brilhante que Francesco me obrigou a usar. Ainda que pareça o sapato que a Cinderela usou no baile.
De braços dados, Theodoro e eu caminhamos na direção da casa de sua irmã.
Tento ignorar o frisson na boca do estômago, quando processo o fato de que, pela primeira vez em muito tempo, estamos próximos um do outro de maneira não sexual, mas sem provocações, brigas ou discussões.
Finalmente, em paz.
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