O Cafajeste já tem Dona romance Capítulo 18

As ruas eram sujas e mendigos vagavam em todos os cantos. Havia muitos comércios minúsculos e pessoas de reputação duvidosa vagando pela rua. E por “reputação duvidosa” quero dizer prostitutas em plena luz do dia tentando arranjar fregueses e homens agindo de formas suspeitas, provavelmente vendendo drogas ou planejando algum roubo ou coisa parecida.

O lugar fedia. Não só por causa dos mendigos, mas também fedia a mijo, dentre outras coisas que eu não queria nem pensar.

Vi um prédio, caindo aos pedaços que provavelmente não era habitável e deveria estar abandonado. Rezei para que não fosse naquele prédio onde minha esposa é meu filho estivessem morando. Eu jamais me perdoaria se tivesse permitido que vivessem ali durante mais de cinco meses. Graças a Deus o GPS indicou um outro prédio, mais à frente, e que parecia até bem conservado em comparação com o resto da rua.

Era um prédio de cinco andares sem elevador. Olhei o papel para não cometer erros. Melanie havia escrito “quarto andar”.

Não tinha portaria, o que significava que qualquer um poderia entrar ali e ninguém estaria seguro. Imaginei como Elena estaria se virando com uma barriga imensa de grávida, tendo que subir e descer quatro andares de escada todos os dias.

Olhei para a porta do seu apartamento, tomando coragem para bater. Eu tremia, sem saber qual seria sua reação. Não seria boa, eu tinha consciência disso. Sabendo que o melhor seria bater logo e acabar com aquela angústia, bati na porta. Supus que, de qualquer forma, Melanie já deveria ter falado para Elena que eu estava a caminho, então ou ela estava me esperando ou já havia fugido novamente.

Demorou alguns segundos antes que abrissem a porta. E lá estava ela. Tão linda quanto a primeira vez que a vi. Na verdade, parecia ainda mais linda e estava... Imensa. Imensamente grávida. De um tamanho nunca visto. Eu tinha certeza que um homem na lua, olhando para a Terra, conseguiria identificá-la. Nunca vi uma mulher com aquele tamanho, e nem tão linda. Essa era a verdade.

Fui engolfado pela saudade. Cinco meses apenas existindo, sem me sentir parte de lugar nenhum. Mas ali, ao lado dela, em um país estranho, eu entendi o significado da palavra “lar”. Naquele momento percebi que lar não era um lugar, como sempre imaginei. Lar era uma pessoa. Senti como se minha vida nunca tivesse feito tanto sentido como naquele momento. Como se toda a minha vida girasse em torno desse momento, para esse reencontro. Era o reencontro de duas almas que foram destinadas a estarem juntas.

Percebi que ela estava muda, surpresa, mais que isso, sem reação. Era como se não me esperasse. E, independente de tudo aquilo que estava sentindo, cometi o pior erro que poderia cometer naquele momento. Ao invés de começar a me desculpar, eu a beijei.

A beijei com saudade e com ânsia mas, acima de tudo, com aquele amor que reprimi por todos aqueles meses.

Não foi um beijo suave e delicado.

Minha língua não teve permissão para entrar em sua boca, mas forçou passagem mesmo assim. Eu era consciente de que ela tentava resistir ao meu ataque, mas penso que não era tão forte assim. Deus sabia que eu pelo menos não era. Ela se derreteu em meus braços, se entregando, como tantas vezes já aconteceu. Como na primeira vez que nos beijamos, no nosso casamento.

O tempo parou, como naquele dia. Todos deixaram de existir e só havíamos nós naquele momento.

Éramos um e, ao mesmo tempo, duas almas que se reencontraram, cheias de saudades. Então toquei em sua barriga inchada com o meu filho dentro, querendo que ele também fizesse parte daquele momento, daquele reencontro.

Ela me empurrou para longe. Com medo de fazer algum mal ao nosso filho, a deixei escapar. E ela fugiu para longe do meu alcance.

ELENA

O que ele estava fazendo em Paris?! Na minha casa ainda por cima!

Poderia ao menos avisar que estava vindo, então eu teria chance de desaparecer novamente.

Sabia exatamente quem havia dedurado a minha localização. Só havia uma pessoa na Inglaterra que conhecia meu atual endereço.

Melanie.

Tinha mantido contato com ela durante todos aqueles meses, contado as novidades. Se eu soubesse que logo ela seria a minha ruína, teria mantido distância de tudo o que fosse inglês, além do meu filho é claro. Depois eu daria um jeito naquela fofoqueira. Agora tinha problemas maiores para resolver. Como o pai do meu filho batendo na minha porta, e aquele beijo dos infernos que me fazia pegar fogo e querer implorar por mais!

Me afastei e, com todo o impulso que uma mulher grávida pode dar sem cair, desferi um soco que atingiu em cheio em seu rosto. Não que tivesse causado algum dano. Longe disso. Mas fiquei satisfeita só em vê-lo cambalear para trás, com as mãos cobrindo o nariz. Xingando horrores.

Quando ele saiu do marco da porta, aproveitei e fechei, trancando-a. Gostaria muito que uma porta resolvesse todos os meus problemas, e que fosse fácil manter os problemas longe somente fechando uma porta. Obviamente aquele era só um engano. Eu só estava adiando o inevitável. Ouvi sua voz gritar do outro lado da porta:

- Essa porta não vai me impedir de conversar com você! Pode não ser hoje e nem amanhã, mas um dia terá que sair e me enfrentar. Tenho direito a participar da vida do meu filho, sabe disso tão bem quanto eu.

Do jeito como as paredes daquele prédio eram finas, tinha certeza de que todos os moradores haviam escutado sua declaração. Não poderia deixá-lo no corredor gritando todos os nossos problemas para quem quisesse ouvir.

Dei meia volta e abri a porta. Sua testa estava encostada na porta e ele se desequilibrou quando a porta abriu, mas mais do que isso, parecia surpreso que a porta tivesse aberto novamente.

- Deixo você entrar se prometer parar de contar aos meus vizinhos todos os nossos problemas, pode ser? – Falei.

Ele assentiu, mudo, e entrou.

Observando tudo ao redor. O lugar era pequeno e muito pobre, os móveis não eram de qualidade, comprados de segunda mão já que eu não podia me dar ao luxo de gastar muito. Tinha que economizar para a chegada do bebê. Eu tinha feito o melhor que podia com os recursos que dispunha. Mas, naquele momento, por um mísero instante, senti vergonha da minha casa ao vê-lo observar com olhos críticos. Não pude deixar que esse sentimento me dominasse.

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