THIAGO
Quando despertei, ainda levei um tempo para perceber o que estava acontecendo. Foi só quando vi os rostos dos meus amigos, provavelmente tão detonados quanto o meu, que me recordei da briga, e do motivo da briga.
- Por que mentiu para mim? – Perguntei. Minha voz soava tão acabada quanto eu me sentia.
- Do que está falando, Thiago? Nunca menti para você.
- Estou falando sobre tudo! Disse que trabalharia administrando a boate para Jean, mas não era o que estava acontecendo! Ninguém consegue administrar subida no balcão do jeito como você estava!
- Foi só hoje, eu juro! Isso nunca aconteceu antes! Eu só fui porque Jean me disse que precisava...
- Não quero saber o que Jean precisava! Eu sei muito bem o que aqueles caras babando em cima de você precisavam! – Exclamei.
- Shhh!
- Shh o caralho, porra! – Minha voz estava alterada.
- Nossos filhos estão dormindo, Thiago! Fala mais baixo.
- Agora você está pensando neles? Enquanto rebolava naquele balcão como uma mulher fácil você não parecia estar se importando com eles! – Explodi. Eu odiei me referir a ela naqueles termos novamente, e quando vi a mágoa estampada em seu rosto, quis voltar atrás e pedir desculpas. Mas já era tarde demais. Eu já havia cagado, de novo. E, ao mesmo tempo, não queria dar o braço a torcer, meu orgulho não me permitiria ficar em casa todos os dias esperando a minha mulher acabar de rebolar em cima de um balcão enquanto outros homens passavam a mão nela!
Uma lágrima solitária escorreu de seus olhos, antes que ela secasse rapidamente com a mão e dissesse:
- É meu trabalho, Thiago. É o que eu faço para viver e foi o único lugar onde consegui emprego sem ter experiência. Não posso fazer nada se você não gosta do que eu faço. Eu preciso trabalhar. Agora não sou só eu, tenho que pensar em meus filhos acima de tudo. E se eu tivesse que me prostituir para poder sustentá-los, eu me prostituiria.
- Eu jamais estaria casado com uma prostituta. E jamais deixaria meus próprios filhos para serem criados por uma!
- Eu não sou uma prostituta! – Ela exclamou – E você não pode tirar meus filhos de mim! Eles precisam da mãe!
- Não precisam de uma mãe que passa as noites rebolando em cima de um balcão. E se eu precisar entrar na justiça para provar que você não serve para criar os meus filhos, eu vou! – Ameacei.
Vi em seus olhos o quão decepcionada ela estava por minhas palavras, mas tentei não pensar nisso. Não podia me permitir fraquejar.
- É fácil para você dizer. – Ela disse, as forças abandonando seu corpo, parecia que carregava o peso do mundo sobre seus ombros – Você tem uma formação. Uma carreira de sucesso. O que eu tenho? É difícil ser criada por um homem que acha que ainda vive no século XVIII. Sabe o que é seu próprio pai não deixar você fazer uma faculdade só porque é mulher? Eu sei que não aparenta, mas meu pai tem ideias arcaicas. Não sei nem que bomba atingiu ele quando me deixou comandar sua empresa, embora eu tivesse uma babá. – Ela fez uma pausa, fungando – Quando eu era menor, Richard achava que eu deveria me dedicar única e exclusivamente para a família. Foi por isso que não fiz uma faculdade. Ele dizia que seria obrigação do meu marido me sustentar.
- Talvez você devesse escutá-lo. Ganha uma merreca de salário que não dá para nada! Ficar em casa e cuidar da família vai ser bem mais produtivo do que rebolar em cima de um balcão noite após noite! – Quando eu pensasse naquelas palavras mais tarde, sentiria nojo de mim mesmo por estar dando razão a um homem cujo acordo destruiu toda a minha vida.
- Eu não vou largar o emprego só porque você quer! – Ela exclamou – Se não está satisfeito com quem eu sou, ótimo. Pode ir embora. Não pedi para que viesse atrás de mim. Se tem vergonha da sua própria esposa, e do que ela faz para sobreviver, talvez não devêssemos mais estar casados.
- Tem razão. – Concordei. – Vou pedir ao meu advogado para entrar com os papéis do divórcio.
- Ótimo. – Ela retrucou.
- E não se preocupe. Eu sou um homem de palavra. A casa foi mesmo um presente. Não vou pedir para que você saia dela. Eu vou sair.
Então dei meia volta e parti.
Antes de passar pela porta do escritório, já havia me arrependido de metade das coisas que havia dito a ela aquela noite. E depois que peguei minhas coisas em casa, fui morar na casa de Jonathan e conversei com os caras, eu já havia me arrependido da outra metade do que disse.
Eu estava na merda de novo.
ELENA
Quando Thiago saiu, sabia que não o veria em casa quando chegasse. Talvez até voltasse para a Inglaterra.
Meu coração estava apertado e eu não acreditava que tivéssemos brigado por algo tão bobo. Para mim era algo bobo, mas eu sabia que para ele não era. E eu jamais poderia ficar ao lado de um homem que não entendia que eu estava trabalhando. Que eu precisava trabalhar, para não virar uma inútil como meu pai queria.
Era importante para mim fazer alguma coisa, e ele não entendia. No fundo, tinha a mesma mentalidade machista de Richard.
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