O cheiro da terra molhada invade o ar como uma promessa. Há algo novo no vento, um sopro de mudança, um anúncio silencioso de que, a partir de hoje, nada será como antes.
Darlene caminha pelos corredores da sede com o coração batendo mais firme. Seus dedos apertam contra o peito o caderno onde Marta anotou ideias, metas, sugestões e pequenos esboços de futuro. Mas para Darlene, aquele caderno é mais do que papel e tinta. É como se ela carregasse nas mãos um mapa do tesouro, um compêndio de possibilidades que a resgata da escuridão.
— Marta... Eu não sei nem como te agradecer — diz ela, com a voz embargada pela emoção.
— Eu tô me sentindo viva de novo. Você sabe que depois que ele morreu, eu tava me perdendo. Mas agora... agora eu tô enxergando futuro.
Marta se aproxima, tocando com leveza o ombro da amiga.
— O que você tem nas mãos, Darlene, é ouro. Só precisa polir. E a gente vai fazer isso juntas.
O dia transcorre como um renascimento. Entre café coado, páginas viradas e papéis riscados, as duas mulheres criam planos, dividem sonhos e trocam risos que parecem lavar antigas dores. Durante o almoço, já falam em reformar a sede, construir um escritório administrativo, contratar um agrônomo de confiança e até desenhar a identidade visual de uma nova marca, uma marca que represente não só a produção da fazenda, mas o novo momento de Darlene.
O luto, que antes era um manto escuro envolvendo cada canto da casa, começa a se desfazer como névoa ao sol. Darlene volta a sorrir com o corpo inteiro, como não fazia desde os tempos de menina.
Mais tarde, sob o céu cravejado de estrelas, ela observa em silêncio os campos que se estendem até onde a vista alcança. Marta já se despede, prometendo voltar cedo no dia seguinte. Darlene continua ali, sentada na cadeira de balanço da varanda, sentindo o vento fresco e escutando o som distante dos grilos e o mugido espaçado de algum boi inquieto. Seus olhos, porém, não se perdem no horizonte, mas se fixam num ponto escuro ao longe — o paiol antigo.
Quantas histórias aquela terra guarda? E quantas delas jamais foram contadas?
Na manhã seguinte, Darlene acorda cedo, com uma energia que não sentia havia muito tempo. O sol ainda desponta, mas ela já está de pé, arrumada, decidida. Prepara café na cozinha e observa pela janela os vaqueiros começando a rotina no curral. O cheiro forte de esterco se mistura ao perfume do café fresco. Pela primeira vez em dias, ela se sente dona da fazenda, e principalmente, dona de si.
Liga para o contador. Agenda uma reunião com o agrônomo que Marta indicou. Começa a revirar arquivos antigos, vasculha contratos, recibos, anotações feitas à mão pelo pai. A papelada é um caos, e é ali, naquele amontoado de folhas amareladas, que ela percebe a urgência de modernizar tudo. Já passou da hora de informatizar os processos e pôr ordem naquilo que por muito tempo viveu na desorganização e no improviso.
À tarde, Marta volta à fazenda, trazendo mais ideias e um sorriso que acalma. As duas se sentam na sala, agora arejada e com o ar condicionado funcionando, e discutem as próximas etapas. Falam sobre pintura nova, identidade visual, certificação ambiental e até um projeto piloto de irrigação por gotejamento para os pomares de laranja.
Em determinado momento, Darlene pausa a conversa, seus olhos marejando.
— Marta... eu preciso te falar uma coisa — diz, segurando a mão da amiga com firmeza.
— Eu quero muito isso tudo. Expandir. Melhorar. Dar um novo nome pra essa fazenda. Fazer valer o que meu pai deixou. Mas... eu tenho medo.
Marta não hesita. Seus olhos se enchem de ternura.
— Medo é normal, Darlene. Mas você não está sozinha. Eu tô aqui, e o Miguel também. Você tem com quem contar. Nós vamos fazer isso juntos, passo a passo. E se um dia tropeçar, a gente levanta de novo. Juntas.
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