O som agudo e insistente dos pintinhos ecoa pelo galpão recém construído como música para os ouvidos da família. O primeiro lote de sessenta mil pintos de um dia chegou naquela manhã envolto por cuidados extremos. Caminhões climatizados, veterinários atentos e um protocolo rigoroso de biossegurança. Tudo parecia novo, desafiador… e emocionante.
Marta acompanha cada passo com os olhos brilhando. Ao lado de Miguel, ela caminha devagar pelo galpão principal, sentindo o cheiro de serragem fresca e observando a movimentação dos animais. A estrutura impecável impressiona até os técnicos mais experientes.
— Eles estão bem acomodados, temperatura perfeita, umidade estável. Esse início é essencial para boa conversão alimentar — comenta o veterinário de jaleco azul.
— E conversão alimentar é o quanto eles conseguem transformar ração em carne, certo? — pergunta Miguel, anotando tudo com a atenção de um aluno dedicado.
— Exatamente. Cada grama importa — responde a voz feminina ao lado deles.
É a Dra. Estela, a veterinária responsável por acompanhar de perto o projeto, desde organização e treinamento de toda a mão de obra do projeto. Jovem, enérgica, com olhos atentos e uma risada leve, ela rapidamente conquistou a família. Ainda no primeiro dia, Dona Maria fez questão de barrar a ideia de que a doutora dormisse no alojamento.
— Aqui, profissional ou não, é gente. E gente a gente acolhe na mesa da cozinha e no quarto de casa.
Desde então, Estela está instalada em um dos quartos da casa principal, onde é mimada o tempo todo com café da manhã na varanda, almoço com pão caseiro e suco fresco, e jantares que mais parecem festas de família.
Ela e Marta criaram uma conexão imediata. Durante as tardes, quando os galpões são higienizados e os pintinhos estão alimentados e aquecidos, as duas se sentam na sombra da mangueira e discutem tudo desde tipos de ração até alternativas sustentáveis para o futuro da fazenda.
— Você já pensou em usar fermentação natural como parte da alimentação alternativa? Dá pra reduzir custo e melhorar o sistema digestivo deles — sugere Estela, empolgada.
— Estava lendo exatamente sobre isso. E pensei em conversar com o técnico da empresa parceira sobre a liberação de testes controlados — responde Marta, com os olhos acesos de ideias.
A afinidade é tanta que parece que já se conheciam há anos. Estela não é apenas uma profissional, virou uma espécie de braço direito técnico e amiga íntima da casa.
Dona Maria até brinca:
— Se Marta não se cuida, perde o comando da fazenda pra doutora — diz rindo, enquanto serve bolo de fubá com café forte.
Com tudo avançando de forma tão positiva, a família começa a sentir esperança real. A fazenda já não é mais um simples sítio. Está virando uma empresa familiar bem estruturada, e Marta é a mente por trás do crescimento rápido e eficiente.
Mas naquela noite, enquanto todos jantam e celebram a chegada do primeiro lote, Marta se permite um instante de silêncio, olhando para o celular em cima da mesa. O nome dele ainda está ali. Intocado.
Jonathan Schneider.
Ela sorri para si mesma, discreta, e volta a comer, então observa uma notificação do banco, o salário foi debitado da conta. Jonathan.
Na cidade, Jonathan está diante da enorme tela de seu computador, assistindo uma apresentação de expansão para o setor agrícola. Um dos gráficos mostra regiões estratégicas de investimento, uma delas, curiosamente, próxima ao interior onde Marta está.
Ele pausa. O ponteiro do mouse sobre o nome da cidade.
— Coincidência? Ou é o destino tentando me provocar? — murmura, sem tirar os olhos da tela.
Ele respira fundo, fecha o arquivo, e se recosta na cadeira. O café esfria sobre a mesa. E a dúvida volta a martelar.
Ela está bem? Ela pensa em mim? E... será que um dia eu vou merecer uma segunda chance?
O sol ainda aparece tímido próximo aos galpões enquanto a família se reúne ao redor da Dra. Estela, atentos como alunos em uma sala de aula viva. O cheiro de ração e serragem mistura-se ao ar leve do amanhecer. O primeiro lote de pintinhos se adapta perfeitamente, e a veterinária aproveita a oportunidade para intensificar o treinamento com todos.
— A sanidade das aves é prioridade. Temperatura, umidade, qualidade da água... tudo interfere. Mas há algo que não pode falhar nunca, o manejo durante a apanha. O estresse pode comprometer todo o lote — explica Estela com voz firme, mas didática.
— E não se esqueçam das vacinações. São feitas em fases. Algumas já iniciam agora, com nebulização. Outras são injetáveis, e vamos orientar certinho.
— E se um ou outro pinto morrer? Isso é normal? — pergunta Dona Maria, com as mãos ainda levemente unidas.
— Até três por cento de mortalidade nos primeiros dias é considerado dentro do aceitável, mas claro, quanto menor esse número, melhor o desempenho geral. O importante é sempre observar e relatar qualquer comportamento estranho — responde Estela, anotando numa prancheta.
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