Marta caminha devagar pelo corredor da casa, uma das mãos apoiada no quadril e a outra acariciando a barriga enorme, como se acariciasse o próprio tempo. O silêncio da manhã é quebrado apenas pelo leve farfalhar do vento entrando pelas janelas abertas e os passarinhos lá fora celebrando o dia. Ela se detém diante do quarto dos bebês, respira fundo e sorri com orgulho contido.
— Está tudo pronto, meus amores — murmura.
O quarto, ampliado durante a reforma, agora tem duas janelas que deixam o sol entrar suave, aquecendo as paredes em tons pastéis. Dois bercinhos brancos ocupam o centro do espaço, cada um com o enxoval cuidadosamente dobrado. As roupinhas lavadas, passadas, organizadas por tamanho e tipo. Fraldas, pomadas, mamadeiras, cueiros, termômetro digital, mantas — tudo no lugar. Cada detalhe escolhido com calma, com amor, com o cuidado de quem sabe que esses dois pequenos vão chegar em breve.
Ela se aproxima da cômoda e abre uma das gavetas. Ali está a bolsa de maternidade: duas mudas de roupa para cada bebê, documentos, seus exames médicos, chinelos, uma camisola confortável, escova de dentes. Ela revisa item por item, mesmo sabendo que já conferiu três vezes na semana anterior. Fecha a gaveta e respira com alívio.
— Tudo pronto — diz para si mesma, como um mantra, tentando controlar a ansiedade que começa a crescer no peito.
A viagem a São Paulo será em dois dias. Marta não quer correr riscos nem físicos, nem emocionais. Vai com calma, em carro confortável, parando se necessário. Sabe que o especialista é renomado, e que sua gestação precisa ser acompanhada com rigor agora, especialmente com a pressão ainda instável. Pretende dormir uma noite na cidade, se estiver muito cansada. Já reservou o hotel, organizou os exames, separou os contatos médicos.
— Preciso estar preparada para qualquer coisa — diz, enquanto toma seu café da manhã com aveia, frutas e chá de erva doce.
Ela não tem tempo para romantizar o fim da gravidez. Ainda que seja mágico, é também exaustivo. E Marta tem uma empresa rural para manter de pé. Termina o café, apoia as mãos na cadeira e se levanta com cuidado, sentindo os músculos das costas reclamarem.
Ao entrar no escritório, o cenário muda: é a empresária que toma o lugar da mãe.
Planilhas abertas. Projeções de receita e despesa do próximo trimestre. Extratos bancários. Notas fiscais eletrônicas. Marta confere tudo, uma a uma. A entrada da última venda de frangos já foi registrada. As contas fixas, alimentação do plantel, folha de pagamento, estão todas pagas até o fim do mês. O saldo em caixa é sólido, suficiente para cobrir emergências. Ela fez questão de montar uma reserva para imprevistos, não apenas pela empresa, mas também por ela e os filhos.
— Se acontecer qualquer coisa, eles vão ter tudo o que precisam. Mesmo se eu não puder trabalhar por um tempo.
A frase vem num sussurro, e logo ela balança a cabeça, espantando os pensamentos sombrios. Volta à tela.
Passa boa parte da manhã revisando o planejamento para os próximos dois ciclos de produção. Miguel está pronto para assumir as decisões operacionais enquanto ela estiver fora. O protocolo sanitário dos galpões está rodando com excelência, e Marta faz questão de manter tudo documentado. Desde a reforma da empresa rural, o sítio se tornou um exemplo de sanidade e produtividade. O que antes era produção familiar, agora é agroempresa com gestão estratégica.
Dona Maria entra no escritório por volta das onze, trazendo um copo com suco de melancia e gengibre.
— Hora da pausa. Tá se esforçando demais.
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