O sol ainda nem aquece direito a terra quando Ravi, com os olhos entreabertos e os cabelos desordenados, emerge do seu quarto no sítio como quem atravessa uma tempestade de preguiça. Cambaleando até a sala, ele se j**a no sofá com a precisão de um zumbi e encosta a cabeça no colo de Dona Maria, que, como sempre, está sentada ali como uma entidade sagrada da paz e do café quente. Sem dizer nada, ela começa a fazer cafuné no menino loiro que, apesar da fama de durão e cérebro do grupo, ali se comporta como um filho carente de colo. Ele fecha os olhos e suspira, se rendendo ao conforto como se o mundo lá fora não tivesse problemas a serem resolvidos.
— Tá tão quietinho hoje… — murmura Dona Maria, sorrindo e passando os dedos nos cabelos dele.
— Esse menino só precisa de carinho mesmo.
Ravi não responde. Só solta um ronronar preguiçoso, quase felino, e parece prestes a cochilar de novo.
Mas a paz, claro, tem prazo de validade.
A porta se escancara com um rangido dramático e, como uma dupla de faroeste caipira, Eduardo e Darlene entram, seguidos logo depois por Miguel, que vem do galpão, ainda com a camisa manchada de óleo e um sorriso suspeito no rosto.
— Ah, não... — murmura Eduardo, já sacando o celular. — Eu não tô vendo isso.
— Vai me dizer que esse é o temido Ravi Smith? O terror da TI? — Miguel gargalha.
— Deitado no colo da Dona Maria, ganhando cafuné feito um menino mimado?
— Deixem o meu menino, faz favor — retruca Dona Maria, sem perder a compostura. — Ele pode ser um monstro na frente do computador, mas aqui é só o meu Ravi.
Ravi apenas revira os olhos, sem se mexer. Mas a tensão nos ombros já denuncia que ele sabe o que vem a seguir.
— Ah, isso vai para o grupo do W******p com legenda — provoca Eduardo, levantando o celular. — “Ravi Smith em modo bebê chorão, versão raiz do sítio.”
— Vai postar isso, Eduardo, e eu juro que invado o teu notebook e coloco vídeos teus cantando Evidências no karaokê da empresa! — rosna Ravi, sem levantar, mas claramente já sem cafuné de paz.
— Que isso, Ravi… — Darlene se encosta na porta, rindo alto. — Assim você derrete minha imagem de hacker imbatível. Daqui a pouco tá pedindo leite com toddy.
— Pode deixar que eu pego o toddy — acrescenta Miguel, abrindo a geladeira de propósito.
O caos está armado.
Como cereja do bolo, Seu Heitor chega, chapéu na cabeça e sorriso já no rosto ao ouvir o alvoroço.
— Mas o que tá acontecendo aqui? — pergunta, e congela ao ver a cena.
Um silêncio de segundos se instala. Ravi ainda está no colo da Dona Maria. Os três outros parados, rindo, celulares em punho.
— Ahhh... agora sim eu já vi de tudo! — ri Seu Heitor. — O Ravi, o mesmo que deu bronca até no delegado por atraso na resposta do sistema... tá aqui igual um bezerrinho no colo da mãe.
— Chega, vocês três! — Ravi se levanta de uma vez, cabelo desgrenhado, olhar assassino. — Um de vocês vaza isso, e eu acabo com a reputação digital de cada um!
— Ameaça anotada. — Eduardo levanta as mãos. — Mas a imagem já tá salva na nuvem.
— Na minha também — diz Miguel, mostrando a tela.
Darlene quase se engasga de tanto rir. Heitor, rindo com gosto, já senta à mesa.
Dona Maria, imperturbável, apenas se levanta e vai à cozinha.
— Eu vou preparar um café forte para esse meu menino acordar de verdade. Do jeito que ele tá sendo zoado, vai precisar.
O cheiro de café fresco invade o ar, enquanto Ravi afunda na poltrona como quem aceita a derrota momentânea. A risada rola solta, as provocações continuam.
Mais tarde, durante o almoço, a trégua acontece, mais ou menos. Entre garfadas de arroz, piadas sobre Ravi, olhares cúmplices e outros desconfiados, a mesa vira palco de uma quase paz rural, onde a confiança mútua parece firmar as suas raízes entre gozações e pedaços de carne assada.
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