A noite não espera. Ela arrebenta como um trovão abafado no peito, uma urgência de respirar outro ar, de ser vista, de existir além do ranço do passado. O chuveiro despeja água quente sobre os ombros de Darlene enquanto ela esfrega a pele com vontade, como se pudesse arrancar da memória os toques que não quer mais lembrar. Ao sair, ela não hesita, escolhe o vestido vermelho justo, decote certo, fenda provocante. Cabelos soltos, maquiagem impecável, batom como marca de guerra. No espelho, ela sorri com a segurança de quem escolhe recomeçar. Tira uma selfie poderosa e posta com a legenda:
Sextou! A noite é uma criança, e eu tô de babá dela. 🎉🔥
Em segundos, os likes explodem. Comentários elogiosos, piadas ousadas, emojis de fogo. Darlene não responde ninguém. Pega a chave da caminhonete, confere o perfume, encara o reflexo com firmeza e diz em voz baixa:
— Hoje, eu vivo!
Dirige com o rádio alto e o coração acelerado. Ao estacionar em frente à boate da cidade, uma onda de lembrança a atinge. Foi ali que beijou Eduardo pela primeira vez, onde riram como se o mundo não tivesse sombra. Mas ela sacode a cabeça e sussurra:
— Já passou.
No celular, a enxurrada de curtidas continua. E lá está: Eduardo visualizou, mas não curtiu, não comentou. Darlene solta uma risada amarga. Que veja. Que engula.
Ela entra na boate decidida, o salto firme cortando a calçada como navalha.
Enquanto isso, Eduardo descobre que o ciúme tem cheiro. Um cheiro ácido, quente, que sobe pelas narinas e arde nos olhos como fumaça. Eduardo ainda está deitado no sofá, o corpo cansado, mas a mente inquieta, tentando encontrar algo que anestesie a saudade, ou ao menos o orgulho ferido. Quando destrava o celular, o golpe vem seco: a imagem de Darlene explode na tela, linda, poderosa, com a legenda provocante.
“Sextou! A noite é uma criança, e eu tô de babá dela.”
Os comentários são ainda piores e erigosos, emojis, cantadas, elogios escancarados de homens que nem disfarçam o interesse. Ele sente o sangue subir, o estômago revirar.
— Mas que droga... — resmunga, jogando o celular longe.
Ele se levanta num pulo, como se a foto tivesse cravado fogo em sua pele. Vai até o banheiro, lava o rosto e tenta se acalmar. Em vão. A notificação vibra de novo. Outra foto. Darlene, suada, dançando, com os olhos fechados e um sorriso livre no rosto. Ele reconhece o lugar imediatamente. A boate. A mesma onde dançaram, riram, e se beijaram pela primeira vez, quando a busca por Jeff ainda os unia como cúmplices.
— É sério isso? — ele fala sozinho, a raiva atravessando o peito como uma lança.
Sem pensar, pega a mochila, j**a duas roupas dentro, enfia a chave no bolso e entra no carro com uma urgência que nem ele entende. A estrada é um borrão. A raiva é o combustível. A decepção, o volante. Ele atravessa a madrugada com o coração em guerra, os pensamentos embaralhados. Ela não podia. Não assim. Não ali. Será que está com alguém?
Na pista de dança, a música vibra no chão e no peito. Darlene se solta, gira, canta, dança. Sente o corpo leve, sente a alma em festa. Depois de alguns drinks, uma voz conhecida surge às costas.
— Darlene? Você por aqui?
É Bruna, amiga da época da escola. O reencontro é um abraço apertado e uma sequência de memórias. Em minutos, outros rostos conhecidos surgem, mais dois ex colegas, uma professora aposentada que virou DJ local. E então, como se o destino resolvesse jogar lenha na fogueira, Caio aparece. Bonito, mais maduro, o mesmo sorriso que um dia fez o coração de Darlene tropeçar.
— Até que enfim te encontro de novo, Darlene — diz ele, e o jeito como a cumprimenta tem um toque a mais do que o habitual.
Entre risadas e drinks, eles dançam. E quando a música suaviza, Caio se inclina, os olhos atentos:
— Se você não fosse comprometida, juro que eu ia investir em você agora.
Darlene sorri com dor e verdade.
— Eu te amei a vida toda, Caio. Mas você só via a Marta. E agora que minha cabeça tá em outro lugar, você fala assim comigo? Isso é covardia.
Caio empalidece. O peso das palavras o atinge com honestidade. Ele respira fundo.
— Eu não fazia ideia... Me perdoa?
— Tá tudo bem — responde Darlene, com um abraço que sela a confissão.
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