O cheiro de café fresco invade a cozinha elegante da mansão Schneider, misturado ao leve perfume das torradas dourando na chapa. À mesa, Catia serve suco para Afonso, enquanto Marta arruma as frutas com um carinho que quase esconde a tensão no ar. Jonathan passa manteiga no pão, calado. Mas antes que qualquer conversa comece, passos firmes cortam o corredor. Eduardo entra.
— Bom dia — diz ele, seco, frio, sem desviar os olhos da porta.
Ninguém responde de imediato. O som de talheres contra porcelana preenche o vazio que se instala. Ele já atravessa a sala, indo direto para a ala dos empregados. Como se naquela casa já não se sentisse bem. Como se estivessem todos apenas convivendo com a ausência silenciosa de um sentimento que não morreu.
— Vamos? — diz Jonathan, quebrando o desconforto. Ele se levanta e, em seguida, Catia e Afonso também. O trio se despede de Marta e de Lua com beijos rápidos e palavras apressadas. O dia de trabalho no Grupo Schneider os espera. O trânsito está caótico, e no carro, as conversas giram em torno de números, metas e decisões administrativas, mas nenhum deles consegue ignorar a sombra que ficou para trás.
Enquanto isso, a mansão respira em outro ritmo. Mais lento. Mais íntimo. Marta entrega Lua nos braços de Cici, que com ternura e prática a embala no colo. Com a bebê entretida, Marta vai para o banho. Ela fecha a porta do banheiro e, por alguns segundos, deixa a água escorrer pelo rosto como se pudesse lavar a confusão que sente por dentro.
Na cozinha, Cici corta legumes e canta baixinho. O aroma de alho refogado sobe no ar. A porta dos fundos range. Eduardo entra, sem dizer nada. Vê Cici de costas, preparando o almoço, mas não a cumprimenta. Seus olhos vão direto para Lua. Ele a pega nos braços com cuidado, e por alguns minutos, é só com a pequena que ele fala, sorri e vive.
O almoço fica pronto. A mesa posta. Mas Eduardo não aparece. Marta olha para o relógio, caminha até a porta, hesita. E então o vê no portão. Um entregador lhe entrega uma sacola. Comida de aplicativo. Marta sente o estômago se revirar.
Cici não comenta nada. Marta, sim.
— Ele recusou o almoço. Pediu comida de fora — diz, tentando parecer neutra, mas sua voz denuncia o incômodo.
— Ele ainda tá muito magoado — responde Cici, baixinho. — Talvez com razão.
Marta não responde. Vai até a cozinha, prepara um suco de laranja e, em silêncio, leva até ele. Eduardo está no quartinho dos fundos, sentado, abrindo a embalagem. Ao vê-la, se surpreende.
— Suco... obrigado — diz ele, sem saber como reagir.
Ela sorri, tensa.
— Sei que você não quis o almoço... mas achei que talvez isso ajudasse.Está bem geladinho, do jeito que você gosta.
Ele toma um gole, e o silêncio se estende, desconfortável, denso como neblina.
— Eduardo… — ela começa, encarando-o. — Por favor, não vá embora.
Ele a encara. Engole seco. As palavras travam. O peso do que sente por ela e Lua, a amizade antiga por Jonathan… o paralisa.
— Marta... — sua voz falha. — Não sei o que fazer.
Nesse momento, Cici surge. Os olhos encontram os dele. Ela ensaia um sorriso.
— Posso falar com você?
— Não — responde Eduardo, ríspido, levantando-se.
Ela insiste, se aproximando, com a voz mais suave:
— Eduardo, me escuta. Por favor. Eu só quero...
— Você quer o quê, Cici? — ele corta, a voz baixa, mas carregada de tensão.
— Quer fingir que não destruiu tudo? Quer que a gente tenha uma conversa civilizada enquanto você age como se nada tivesse acontecido?
Tenta respirar fundo, mas o ar parece pesado demais. Levanta, dá alguns passos curtos pelo quarto estreito.
Talvez eu devesse ir embora. Pedir demissão. Mas como fazer isso sem parecer fraco, sem causar mais tensão nessa casa? Jonathan e Marta não merecem esse fardo.
A lembrança de Marta b**e como uma onda mais calma. O jeito como ela o olhou mais cedo, o cuidado silencioso no gesto do suco, o pedido para ele não ir embora. Isso o quebra por dentro.
Se eu sair… deixo ela. E eu não sei se quero. Não agora. Mas também não sei se consigo seguir aqui… respirando o mesmo ar da mulher que me destruiu.
Ele para, encara a parede como se pudesse encontrar uma resposta ali.
Será que consigo me manter firme? Impor distância? Fingir que ela não é nada pra mim… mesmo sabendo que o sangue dela corre nas minhas veias?
A raiva continua ali, mas agora misturada a um cansaço profundo.
"Será que dá para esquecer? Ou essa dor vai sempre me lembrar do que ela fez?"
O silêncio do quarto parece gritar mais alto que qualquer discussão. Eduardo ainda não tem respostas. Só uma certeza de que não pode continuar fingindo que a presença de Cici é só mais uma coincidência.
Porque não é.
É uma ferida antiga. E está sangrando de novo.
E se ele decidir partir de vez?

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