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O CEO e o filho perdido: A segunda chance do destino romance Capítulo 303

Rui encara o próprio reflexo no espelho do banheiro do bar e por um segundo mal se reconhece. Os olhos fundos, vermelhos, o maxilar travado. Não é por cansaço, nem por excesso de trabalho é dor. Uma dor que corrói, queima, arde mais do que qualquer processo perdido. Ele, o advogado frio, calculista, o homem que domina tribunais, que dita cláusulas com a precisão de um bisturi… agora não consegue segurar nem a própria alma nos eixos. Porque ela, Islanne, ainda mora ali. E porque ele viu. Viu tudo. Viu demais.

Volta ao balcão como quem não tem mais pressa de ir embora de si mesmo. Pede outra dose.

— Dobre o gelo, dobre o estrago — murmura, a voz rouca, o peito entupido de lembranças.

O uísque desce queimando, mas não mais do que o nome dela entalado na garganta. Islanne. A mulher que ele amava em silêncio gritante. Aquela por quem fez planos, gestos, jantares, bilhetes. Aquela a quem se entregou sem jamais tê-la de fato. Porque, no fim, ela nunca foi dele. Ela era dele. De Ravi. Seu amigo. Seu irmão de copo e putaria. Agora, seu carrasco.

Ele aperta o copo na mão. Vê o vulto do passado se desenhar como vulto de névoa atrás dos olhos.

Ela gemia. Baixinho. Depois alto. Depois… gritava. O nome dele. Dele. Ravi.

— Que porrah você tem que eu não tenho, irmão? — sussurra, tentando sorrir, mas a dor não deixa.

No fundo do bar, o som muda. A primeira batida é lenta, o piano suave. Rui já sabe o que vem. A voz. A voz que vai matá-lo de vez. Marília Mendonça começa a cantar. E o coração dele, que já estava partido, agora se esfarela em câmera lenta.

Ele ri. Baixo. Ríspido. Desgraçado.

— Tá de sacanagem, não é, universo?

Fecha os olhos, mas só vê a cena de novo. A porta abrindo. As flores caindo. Os gemidos. O olhar dela. Aquela entrega que ele nunca teve. A súplica por mais. A respiração entrecortada. O corpo dela, nu, vibrando por outro. E não por ele.

— Eu sou um idiota — sussurra. — Um maldito romântico num mundo onde ninguém avisa que não é filme.

Outro gole. Mais um.

Rui vê o gelo derretendo no copo como o respeito próprio escorrendo por entre os dedos. Lembra das vezes em que entrou na sala de Islanne, trancou a porta e a tomou contra a parede. Lembra do perfume dela grudado na gravata. Lembra dos olhos dela brilhando… mas agora sabe que nunca foram por ele. Ela fingia? Ou apenas… se deixava levar?

Talvez fosse ele quem fingia. Que ela era sua. Que ela um dia seria.

— Eu fui só intervalo entre os desejos dela por ele. Fui pausa. Nunca trilha sonora.

O garçom se aproxima, cauteloso.

— Mais uma?

Rui assente com um aceno. O copo é reposto. A alma não.

Na mesa ao lado, um casal ri. Se toca. Sorri. Rui desvia o olhar. Como é que as pessoas ainda têm coragem de amar? Como é que alguém levanta no dia seguinte depois de ser esmagado?

Ele pensa em Ravi. No amigo que dividiu copos, segredos e agora... a mulher. O que dói não é só a imagem. É o silêncio que veio depois. A falta de arrependimento. O jeito como Islanne segurava Ravi, nua, sem culpa. Como se Rui nunca tivesse existido.

— Eu devia ter entendido antes. O jeito como ela o olhava quando achava que eu não via…

Sente um nó na garganta. Seca com mais um gole. Mas o nó é mais teimoso que o álcool.

Ele fecha os olhos. Mas não encontra descanso.

É como se um projetor maldito estivesse colado à sua retina. O rosto dela aparece. Os cabelos colados à testa pelo suor. Os dedos cravados nos ombros de Ravi. O corpo se arqueando com prazer. A boca entreaberta suplicando:

— Mais forte… não para… meu amor.

Rui abre os olhos, o estômago revirado. Está zonzo, mas lúcido demais. E o pior: a maldita cantora do bar nem pensa em parar.

Na mesa ao lado, o casal, sorridente, embriagado e alheio à tragédia silenciosa que se desenrola a poucos metros — pede animadamente:

— Canta mais Marília pra gente! Aquela do "Infiel", por favor!

A voz animada da mulher na mesa ao lado ecoa como um deboche cruel no ouvido de Rui. O bar inteiro vibra em aprovação, brindes se erguem, sorrisos se espalham. A cantora ajeita o microfone, sorri inocente do caos que está prestes a causar e anuncia:

— Pra sofrer mais um pouquinho com a rainha, vai "Infiel"!

O primeiro acorde b**e como um soco. Rui fecha os olhos. Sente o gelo do uísque derreter devagar no copo... e dentro do peito.

"Você me tem na mão / Feito refém..."

A imagem de Islanne surge nítida. A forma como ela sorria quando ele aparecia de surpresa em sua sala. O jeito que ela mexia no cabelo antes de fingir que não sentia nada. O olhar que Rui jurava ser desejo. Amor.

"Sou teu passado, presente e futuro / E ainda tem coragem de dizer que não..."

Ele engole seco. Como pôde ser tão cego? Ela nunca prometeu nada. Mas também nunca disse que o coração dela já tinha dono. Que, nas sombras dos corredores, era Ravi quem a fazia perder a razão — e o fôlego.

Ele ergue a mão com esforço, chama o garçom.

— A conta, por favor — diz, com a voz rouca, baixa, quase um pedido de socorro.

Levanta-se com dificuldade, o corpo anestesiado pelo álcool, mas a alma em carne viva. J**a algumas notas na bandeja, não espera troco. Cruza o salão tentando manter a postura, enquanto lá atrás, a voz da cantora ecoa mais uma vez:

"Todo mundo vê as pingas que eu tomo, mas ninguém vê os tombos que eu levo..."

Rui para por um segundo, os olhos marejados, o peito implodindo. Ele sabe. Mais uma música e não vai suportar.

Então vai embora. Sem olhar pra trás.

Porque sabe que, se ficar, não será só o coração que vai se despedaçar. Será ele inteiro.

Liga o carro, mas não dirige. Liga o som, mas desliga em seguida. Quer silêncio. Mas a cabeça grita. E no meio do grito, uma pergunta ecoa com força:

Se ela nunca foi minha… por que dói como se tivessem arrancado algo de dentro de mim?

Encosta a cabeça no volante. Os olhos ardem. O coração sangra.

E o pior de tudo… é saber que amanhã vai trabalhar de novo. Vai pôr o terno, sorrir para os clientes, fingir que é o mesmo. Vai cruzar corredores onde ela esteve. Talvez sentir seu perfume. E lembrar que nunca a teve de verdade.

Mas ela dizia o nome dele. Gemia. Implorava.

Por que, karalho, isso não sai da minha cabeça?

Talvez amanhã ele comece a esquecer. Ou talvez… comece a enlouquecer.

Porque quem ama sozinho… sempre enlouquece um pouco.

E quem vê o amor da própria vida ser devorado por outro… não esquece nunca.

Ou será que esquece?

Talvez seja essa a maior dor, não saber se um dia vai parar de doer.

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