Rui entra na sala da presidência do Grupo Schneider com o tipo de calma que só o desespero bem camuflado conhece. Terno alinhado, olhar firme, mãos nos bolsos como se carregassem chumbo, e não a ruína de tudo que acreditava sentir e ser. Jonathan levanta os olhos do tablet ao notar sua presença, mas algo na atmosfera muda antes mesmo da primeira palavra. Há algo errado. Muito errado.
— Rui? — Jonathan ergue as sobrancelhas, a expressão amistosa, mas atenta.
— Você agendou esse horário ontem à noite. Pensei que fosse sobre o caso Valente.
— Não é — responde o advogado, a voz seca como um galho prestes a se partir.
— Eu vim pedir férias. Duas. Uma vencida, outra que vence mês que vem. Preciso me afastar, Jonathan. Urgente.
O presidente fecha o tablet devagar, como quem sente o cheiro de pólvora antes do estouro.
— Férias? Agora? Justo agora? Você é o diretor jurídico. Tem processos em andamento, fusões prestes a serem revistas. E você me aparece aqui pedindo... licença?
Rui encara o amigo. Um silêncio denso se instala. Jonathan percebe que o que quer que esteja por trás do pedido é mais do que burocracia.
— O que houve, Rui? — pergunta, mais baixo, com um leve endurecimento no tom.
— Você está doente? É algo pessoal?
Rui desvia o olhar. A primeira rachadura aparece. E, por fim, ele solta:
— Eu vi a Islanne… com o Ravi.
Jonathan pisca devagar. Poderia se assustar, gritar, se indignar. Mas não o faz. Ao invés disso, seus olhos se estreitam, buscando detalhes no rosto do amigo.
— Você… estava com ela?
— Estava, sim. Há algum tempo. Mas era sigiloso. Uma história mal resolvida. Eu achava que tinha virado algo real. — Rui dá uma risada amarga.
— Até entrar naquele quarto. Até ver com os próprios olhos.
Jonathan se recosta na cadeira, o rosto impassível como uma parede bem treinada. Nenhuma surpresa. Nenhuma indignação.
— Islanne é minha irmã, Rui.
— Eu sei. — Ele engole em seco.
— Por isso mesmo estou aqui. Não quero causar nenhum tumulto dentro do grupo. Nem entre vocês. Eu… só preciso sumir por um tempo.
— E Ravi também é meu amigo. Assim como você.
Rui abaixa a cabeça. A humilhação ainda pulsa sob a pele, latejante.
— Eu entendo se quiser negar. Mas preciso de um tempo. Sair de perto, não por rancor, mas por sanidade.
Jonathan suspira, tamborila os dedos sobre a mesa, depois fixa os olhos no homem à sua frente.
— Duas férias. Uma vencida, outra antecipada. Contra a minha vontade e a lógica administrativa… mas vou aprovar.
Rui fecha os olhos brevemente. Um agradecimento silencioso atravessa sua expressão.
— Obrigado, Jonathan. Não sei quanto tempo vou ficar fora. Talvez os dois meses. Talvez mais. Preciso me reencontrar.
Rui respira fundo. Seus ombros cedem, os olhos evitam os de Jonathan, mas a voz, embora baixa, carrega um peso antigo:
— Eu amava a Islanne. Achei que tinha superado, que era só orgulho ferido, ego... mas não era. Eu realmente amava. E ver o que vi... me destruiu.
Jonathan não se mexe. Apenas o observa com atenção, os braços cruzados, o semblante sério, mas não julgador. Ele conhece Rui há anos. Sabe distinguir dor genuína de drama. E o que vê ali é um homem quebrado, tentando juntar o que restou de si.
— Rui — ele diz, em tom calmo, ao contornar a mesa e se sentar à frente do amigo.
— Senta. Vamos conversar com calma.
Rui se j**a na cadeira como se o corpo, enfim, cedesse ao peso que vinha carregando. Esconde o rosto nas mãos por alguns segundos antes de encará-lo outra vez.
— Eu sei que não era oficial. Sei que não tínhamos nada definido. Mas, cara… foi difícil demais. E foi pior porque era com ele. Com o Ravi. Nosso amigo.
Jonathan solta um suspiro contido, passando a mão pela barba.
— Eu entendo. Mais do que você imagina. Mas também conheço minha irmã. E conheço o Ravi. Isso não diminui o que você sentiu, mas... eles se amam, Rui.
— Eu sei. — A voz dele é um sussurro.
— Hoje eu vejo. Não é só desejo, não é só rebeldia. Eles se pertencem. E isso dói mais. Dói porque eu nunca tive nem metade disso com ela. Nunca tive esse olhar, essa entrega. Eu me enganei. Me iludi. E agora... não consigo mais ficar perto. Só de ouvir o nome dela já dói. Só de pensar nele, sinto o gosto amargo da traição. Mas não guardo raiva. Só... preciso respirar.
Jonathan o encara por um instante, depois se inclina levemente para frente.
— Então vá. Respira, some, se reencontra. Te conheço. Você vai se levantar. Vai voltar inteiro. E quando voltar, eu estarei aqui. A gente segura as pontas.
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