O barulho é rápido, mas ecoa como um trovão no vazio do estacionamento. O clarão acima apaga de vez, mergulhando tudo em uma penumbra sufocante.
E naquele instante…
O tempo para.
Islanne sente um calor súbito subir pelo peito, seguido de um frio que paralisa. O corpo dela enrijece. Cada músculo, cada respiração, cada pensamento… suspensos. A sensação é a de cair de uma altura infinita, sem movimento, sem chão.
É quando flashes começam a surgir.
Imagens da infância, da mãe penteando os seus cabelos. O som da gargalhada de Afonso a colocando nos ombros. A mão de Jonathan, ainda criança, puxando a sua com medo do escuro. O primeiro dia na presidência. O primeiro dia com Lua no colo. Tudo. Tudo passa diante dos olhos como um mosaico partido de lembranças.
Ela sente o peso da arma contra a cintura, como uma âncora. A mão instintivamente desliza até lá.
Mas antes que consiga sacar, uma mão firme toca seu ombro.
— Calma — diz Gabriel, a voz controlada, sem emoção.
— Foi apenas um curto circuito. Nada mais.
Ele aponta discretamente para o celular em sua mão. A tela ainda acesa.
Sem dizer uma palavra, ele estende a mão.
Ela hesita… e entrega.
Ele desliga o aparelho com um gesto simples.
Depois, a encara.
— Não podemos ser rastreados aqui.
Ainda envolta em tensão, Islanne observa cada movimento dele, mas não reage quando Gabriel a conduz até um carro estacionado na penumbra. O veículo é discreto, de vidros escurecidos. Ele abre a porta para ela, como se aquilo fosse um protocolo. Ou uma concessão de confiança.
Minutos depois, enquanto o carro se afasta do hospital desativado, um silêncio denso paira entre os dois. Nada é dito. Ainda.
Nos arredores, Ravi e Dante observam com atenção o mapa na tela do tablet.
— O sinal sumiu. — Ravi sussurra. — Celular dela foi desligado manualmente.
— Isso não é bom — diz Dante, já se mexendo. — Vamos.
Eles partem imediatamente, atravessando a cidade como dois caçadores sem sono. O estacionamento subterrâneo surge à frente como um espectro cinzento.
Descem com cautela, armas prontas. Ecos, sombras, nenhum sinal de vida.
E então, o choque:
o carro que Islanne usou ainda está lá. Intacto. Abandonado.
Dante gira em círculos, em alerta.
— Ela não levou o carro. Alguém a tirou daqui. A pé, ou em outro veículo.
— E desligaram o celular dela para gente não rastrear — completa Ravi, já teclando freneticamente em outro sistema.
— Merrda, estamos às cegas.
Os dois se encaram. A tensão entre eles explode no silêncio.
— Se fizeram algo com ela… — diz Dante, cerrando os punhos.
— Eu vou descobrir quem foi — promete Ravi, sombrio.
Enquanto isso, em um local neutro, afastado da cidade e ainda mais das câmeras, Gabriel estaciona o carro embaixo de uma cobertura metálica. É um galpão abandonado nos arredores de um posto de gasolina antigo, silencioso, limpo e reservado.
Islanne desce, mas permanece em alerta. A arma continua com ela. Ele percebe.
— Você não está em perigo, Islanne. Pelo menos… não agora — diz ele, com o cansaço de quem carrega mais verdades do que pode soltar.
Ela não responde, mas o observa, esperando.
Gabriel apoia-se no capô do carro, cruzando os braços.
— Eu precisava falar com você fora dos protocolos. Fora das câmeras. E dos olhares errados.
Ela se aproxima, os olhos afiados.
— Quem é você agora, Gabriel?
Ele inspira fundo.
— Sou o delegado responsável pelo caso Jeff Maia Schneider. Oficialmente, a partir de ontem. O Estado quer uma solução. A pressão é enorme. O nome do seu sobrinho está estampado em pastas que cruzam fronteiras e gabinetes de Brasília.
Islanne parece recuar por dentro, mas por fora permanece intacta.
— Então por que me chamar assim? Por que esconder?
— Porque se me virem falando com você… ou com Jonathan… fora da delegacia, fora da formalidade, fora dos registros… — ele pausa — isso pode parecer colaboração indevida. Contaminação do caso. E eu não posso permitir isso. Não se eu quiser ir até o fim.
— E você quer?
Ele a encara. Sério. Profundo.
— Quero. Mas vou fazer do meu jeito. E isso inclui manter as aparências. Quando você ou Jonathan forem à delegacia… vamos agir como estranhos. Nada de familiaridade. Nada de passado.
Ela cruza os braços, os olhos agora mais atentos do que nunca.
— E agora?
— Agora… eu preciso de alguns dias. Tenho muita coisa nas mãos. Documentos, depoimentos, imagens. Quero cruzar as versões. Quero isolar mentiras. Encontrar fissuras.
— Então não há nada concreto?
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