O céu amanhece com um tom cinzento que parece refletir exatamente o que Eduardo sente por dentro. Um peso antigo, profundo, que não dá trégua. Ele acorda mais cedo do que o habitual, como se algo o puxasse para fora da cama. Não há música, não há pressa, só o som abafado dos próprios passos pela casa silenciosa, agora vazia. Mariana já não está ali. E Eduardo sabe que o dia de hoje é necessário. Inadiável.
Ele caminha até a cozinha como se estivesse em transe. Liga a cafeteira e observa o líquido escuro descer lentamente, enquanto sua mente é invadida por lembranças. Lembra da última vez em que ele e Mariana tomaram café juntos ali. Ela falava sem parar, da fazenda, do cheiro da terra molhada, imaginando como seria o lugar. E eles riam, assistiam filme, viveram. Agora, tudo mudou. Ela está prestes a viver a própria vida, a se entregar, a amar de verdade.
Eduardo fecha os olhos e respira fundo. Toma um gole do café, deixa o gosto amargo descer pela garganta como se fosse um remédio. Pega as chaves e sai, já com o nó se formando na garganta. O trânsito da cidade pulsa indiferente, enquanto ele dirige pelas avenidas como quem foge de algo, mas também corre em direção a outra coisa, a única pessoa com quem ele pode ser plenamente sincero, mesmo que essa pessoa já não esteja mais viva.
Quando chega ao portão do cemitério, o ar parece mais denso. O silêncio ganha corpo. Ele conhece aquele caminho. Cada passo entre as alamedas de pedra parece trazer uma lembrança. A infância, os domingos na praça, os conselhos firmes do pai, a mão grande segurando a sua com força.
A lápide está ali. Simples. Honesta. Como o homem que está enterrado ali.
Eduardo se aproxima devagar, os olhos já marejados antes mesmo das palavras surgirem. Ele se ajoelha e passa os dedos sobre o nome gravado na pedra. E então, tudo desaba.
— Pai... — sua voz falha, rouca.
— Eu sinto tanto a sua falta.
Ele leva as mãos ao rosto e chora. Chora como uma criança. Chora como quem carrega peso demais por tempo demais.
— Eu tentei, pai... tentei ser forte, tentei ser tudo o que o senhor me ensinou. Mas tem hora que... que dói demais. Eu... eu fiz o que pude para proteger a Mariana. Ela cresceu, pai. Cresceu tanto. Virou uma mulher linda. Geniosa, teimosa, do jeito que a vovó também era… Mas ela é minha menina, entende? A mesma que eu carreguei no colo, que eu protegi como pude desde que o senhor se foi...
Ele respira fundo, tentando conter o soluço.
— Eu não consegui te substituir, mas... fiz o que dava. Dormi tantas vezes com ela no mesmo quarto, no mesmo colchão, só para garantir que ninguém se aproximasse. Só pra ter certeza de que nada de ruim ia acontecer. O senhor sabe do que eu tô falando. Do que a gente passou. Daquilo que a mãe nunca enxergou.
Um silêncio toma conta do ambiente. Um vento frio sopra, balançando levemente as folhas secas ao redor da lápide. Eduardo encara a inscrição com os olhos marejados.
— Ela me contou, pai. Disse que foi dopada pelo homem que colocou dentro da nossa casa. Que não sabia. Que não teve culpa. Mas como, pai? Como é que se deixa dois filhos pequenos com um estranho? Como é que se esquece da gente?
Ele abaixa a cabeça, a voz embargada.
— Eu não consigo perdoar. Me sinto um filho da putta por isso... mas não consigo. Não consigo olhar para ela sem ver tudo o que aconteceu. Tudo o que poderia ter acontecido com a Mariana, se eu não tivesse agido. Eu era só um menino... e precisei virar homem de uma hora para outra, eu sentia que aquele filho da putta queria esttuprar a minha irmã.
As lágrimas voltam com mais força, agora pesadas, intensas.
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