A esperança não chega com estardalhaço. Não se anuncia com fanfarras, nem exige atenção. Ela se infiltra pelos espaços onde o medo já se cansou de reinar, onde o desespero perdeu a força, onde a dor começa, enfim, a se calar. E ali, naquele chão acarpetado do quarto dos gêmeos, entre brinquedos espalhados, uma manta amassada e a luz suave do abajur filtrada pelas cortinas, Marta sente, pela primeira vez desde o parto, que consegue respirar. De verdade. Sem peso no peito, sem dor nos olhos. Apenas ar.
Lua gargalha, abraçada ao colo da mãe, como se pudesse pressentir aquele momento sagrado. E o som da risada da bebê preenche o quarto com uma leveza tão pura que até os fantasmas do passado hesitam em permanecer ali.
Jonathan a observa em silêncio. Não só a filha, mas também Marta. Ele a vê sorrir de novo. Sorri com o corpo inteiro, com o olhar, com a pele. É uma Marta que ele achava que jamais voltaria a ver. E ver essa mulher viva, respirando, lutando... é o maior presente que a vida poderia lhe devolver.
Marta afaga os cabelos finos da filha, e com os olhos ainda fixos nela, murmura:
— Eu sei que pode parecer loucura o que eu vou dizer…
— Com você, amor, eu aprendi que as loucuras sempre têm uma lógica, Jonathan brinca, pegando a mão livre dela e beijando seus dedos com carinho.
Ela sorri.
— Mas eu confio naquele homem. No Don. Por mais que ele seja assustador, frio, que pareça um campo minado pronto pra explodir a qualquer passo em falso… eu senti algo nele. Uma brecha. Uma rachadura.
— Ele é intenso, Jonathan concorda, se aproximando mais e ajeitando Lua melhor entre eles.
— Parece feito de aço… mas com rachaduras que vazam fogo. Um vulcão congelado.
Marta encosta a cabeça no ombro dele, os dois observando Lua balbuciar sons aleatórios, brincando com os dedos dos pais como se pudesse reger aquele instante com o toque minúsculo das suas mãos.
— Você viu como ele olhou pra Lizandra? Marta continua.
— Ou como ficou parado, em silêncio, observando a Lua dormindo? Tinha algo ali… tão humano. Tão verdadeiro. Como se ele se protegesse do mundo inteiro, mas não soubesse se defender de uma criança.
Jonathan solta um riso baixo.
— É… e você viu quando ele perguntou por ela e descobriu que estava com a gente aqui no quarto? Acho que nunca vi um homem ficar tão vermelho de ciúmes. Ele me supera. E olha que eu sou praticamente um doente possessivo com você.
— Você é mesmo. Marta ri. — Mas pelo menos não rosna quando alguém fala comigo.
— Não? E aquela vez com o pediatra bonitão? — Jonathan ergue a sobrancelha.
— Aquilo foi diferente! Ela ri, empurrando levemente o ombro dele. — Ele chamava a Lua de "princesinha" e você já queria dar um murro nele.
— A minha filha não precisa de príncipe. Ela tem o rei dela.
Eles riem juntos, e Lua, sentindo a vibração da felicidade, b**e as mãozinhas no ar, soltando gritinhos animados.
Jonathan acaricia a bochecha da filha, depois se volta para Marta com mais seriedade e doçura.
— Ver você sorrindo assim... eu juro, Marta... é como voltar a respirar depois de passar dias debaixo d’água. Eu não sabia o quanto estava me afogando até te ver assim agora.
Ela segura o rosto dele entre as mãos, os olhos marejados, mas não de dor. Dessa vez, é emoção boa. Verdadeira. Ela se aproxima e o beija. Não com urgência. Mas com profundidade. Como quem sela um pacto silencioso. Como quem agradece.
Lua, impaciente com a pausa na atenção exclusiva, puxa o cabelo da mãe e os dois se separam rindo, entregando-se a um novo momento de carinho com a bebê. Beijam sua barriguinha, fazem cócegas, se deitam no tapete e constroem ali, em minutos, um lar completo.
— Administração. Minha irmã é contadora. Tomamos conta da parte financeira e executiva do grupo Schneider.
David se aproxima, cruzando os braços.
— Também sou administrador. Darlan, o meu irmão, é advogado.
O tom muda. A tensão do Don dá lugar a um interesse genuíno. Os dois começam a falar sobre empresas, mercado internacional, estruturas de poder e os desafios de manter grandes grupos familiares em crescimento. A conversa flui com naturalidade, e pela primeira vez, Jonathan vê o David sem a aura de ameaça.
— Volte a trabalhar, diz David, direto.
— Com força total. Enquanto procuro o seu filho, ocupe a mente. Se se entregar à ansiedade, vai afundar. Trabalho é disciplina, e disciplina salva.
— Faz sentido, responde Jonathan, sincero.
— E quando Jeff voltar… ele hesita por uma fração de segundo, tire dias só para sua família. Completos. Inteiros. Sem planilhas, sem reuniões. Eles vão precisar de você… inteiro também.
Jonathan assente, tocado pela sabedoria prática do Don.
A conversa se encerra em silêncio respeitoso. David vira as costas, deixando o ambiente com a mesma intensidade sutil com que entrou. Mas Jonathan ainda observa o vazio por um tempo, sentindo a força daquele encontro.
E do lado de fora da casa, onde o vento sopra entre as árvores e a noite parece sussurrar segredos antigos, a investigação continua.
Mas será que todos os segredos estão do lado de fora?

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