O silêncio entre Marta e Jonathan não é comum. Não aquele tipo de silêncio. É denso, como névoa que entra pelas frestas, mesmo com as janelas fechadas. É um silêncio que se insinua pela pele, que atravessa o ar com um peso invisível. E Marta sente. Não com os ouvidos. Com o coração. Algo está fora do lugar. Algo muito maior do que todos estão dispostos a admitir.
Eles estão no quarto, afastados do restante da casa. Lua, a filha, dorme no colo de Cátia, sob os olhos atentos de Afonso. E mesmo com a tranquilidade do ambiente, Marta não consegue ignorar a inquietação que a percorre desde o café da manhã. Desde os olhares trocados entre Hernan e Don David. Desde o jeito como Lizandra desviou o olhar ao cumprimentá-la.
— Tá todo mundo... estranho, ela diz, quebrando o silêncio, com os braços cruzados sobre o peito, encostada na moldura da janela.
— Você reparou?
Jonathan, sentado na beirada da cama, ergue os olhos do celular e a encara.
— Como assim, estranho?
— Como se estivessem agindo com muito cuidado... demais até. Todos. Hernan, Lizandra, até o Don. Ninguém fala abertamente sobre o que está acontecendo. E tem alguma coisa, Jonathan. Eu sinto.
Ele respira fundo, se levanta devagar, aproxima-se.
— Marta... você sabe como são as coisas nesse mundo. Eles não falam até ter certeza. É assim que o Don trabalha.
— É. Eu sei. Mas tá diferente. Ela vira-se para ele, os olhos brilhando com algo entre frustração e esperança.
— Eu olho para Lizandra... e penso em perguntar. Juro que penso. Mas ela tem aquela postura de... guerreira silenciosa. Como se fosse treinada por ele pra guardar tudo. Como se não adiantasse nem tentar.
Jonathan solta um meio sorriso, como se reconhecesse a verdade ali. Ele toca o braço dela com delicadeza.
— Talvez ela saiba mesmo. Mas se sabe... é porque o Don permitiu. Ou ordenou.
Marta encosta a cabeça no ombro dele, respirando o cheiro conhecido, buscando alguma segurança naquele contato.
— Sabe o que é pior? Ela pergunta.
— É esse sentimento de que tá tudo prestes a acontecer. Como se o mundo tivesse prendendo a respiração. Como se... o Jeff estivesse perto. Muito perto.
— Marta... Jonathan começa, hesitando.
— Eu sei. Pode ser coisa da minha cabeça. Desejo de mãe, sei lá. Mas eu sinto. Aqui dentro, ela leva a mão ao peito.
— Tem dias que eu acordo no susto, achando que ouvi ele chorar. Como se ele estivesse aqui, no quarto do lado.
Jonathan aperta os olhos, tentando conter a emoção que chega sem pedir licença. Eles não falam muito disso. Do filho perdido. Do vazio que ficou. Mas quando falam... dói como se fosse ontem.
— Eu penso nisso o tempo todo, ele confessa, com a voz embargada.
— No rosto dele. No que ele pode ter herdado de você, de mim. Se ele tem os olhos escuros como os meus... ou claros como os da minha mãe.
— Será que ele sabe que tem uma irmã? Marta pergunta, baixinho, como quem teme a resposta.
— Não sei. Talvez tenha sido criado achando que era filho único. Ou... pior. Que foi deixado de lado. Que nunca foi amado.
— Não fala isso, ela pede, num sussurro dolorido.
Jonathan se aproxima mais, segura o rosto dela entre as mãos.
— Você sabe que, quando a gente encontrar ele... tudo vai mudar, não é?
— Vai. Ela assente.
— Mas não vai ser fácil. Ele vai estar apegado a outra família. Talvez... não nos aceite logo de cara.
— E a Lua? Jonathan pergunta, um sorriso melancólico escapando. — Como ela vai reagir? Aos dez meses... ela já sente tudo. Imagina quando perceber que o outro berço não tá mais vazio?
— Vai ser mágico. E assustador, Marta responde, encostando a testa na dele.
— Eu sonho com isso. Com os dois deitados juntos, os olhos se procurando... e se reconhecendo. Porque eles vão se reconhecer, Jonathan. Eles são gêmeos. Mesmo separados... tem algo que une. Sempre teve.
— Você acredita mesmo nisso?
— Acredito. Com tudo o que sou.
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